Ao julgar ação de indenização contra ex-pastor acusado de assédio, desembargadores tentam desacreditar vítima; um deles a chama de “sonsa”

O ex-pastor Davi Passamani foi condenado pela 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) a pagar indenização no valor de R$ 50 mil por assédios sexual e moral contra uma jovem, que denunciou o caso ao Ministério Público em em 2020. A peça acusatória foi arquivada por falta de provas pelo MPGO. Com isso, no mesmo ano, a defesa  da jovem entrou com uma ação civil pedindo reparação por danos morais. Foi este caso que foi julgado pelo TJGO.

A sessão de julgamento, que foi iniciada no dia 19 de março e concluída nesta terça-feira (26), foi marcada por comentários pejorativos contra a vítima e autora da ação, que denunciou o caso à Justiça. O desembargador Silvânio Alveranga, por exemplo, disse no último dia 19 de março, que a jovem denunciante era “sonsa” e expressou descontentamento com o que chamou de “caça aos homens”.

O magistrado também sugeriu aos demais integrantes da corte que pudessem analisar o caso a partir da Bíblia já que, segundo o depoimento do ex-pastor, após o assédio sexual, houve uma reunião e um pedido de perdão à vítima e ao namorado dela, que teria sido aceito. Em outro momento, o julgador considerou que, pelo fato de o namorado da vítima cursar Direito, eles poderiam ter planejado a ação penal contra o ex-pastor, que renunciou ao cargo de liderança da Igreja Casa, em Goiânia, após ser acusado de importunação sexual.

Quem também chamou a atenção durante o julgamento do caso foi o desembargador Jeová Sardinha de Moraes. Ele afirmou que denúncias de assédio sexual e racismo se tornaram modismos nos tempos atuais. E que estão sendo usados e exploradas com frequência.

Nota dos desembargadores

Apesar dos comentários feitos durante o julgamento, o desembargador Silvânio Alvarenga, em nota, afirmou que “fiz questionamentos na busca do amadurecimento e da compreensão integral do caso em questão. Minha abordagem, ao levantar hipóteses e situações hipotéticas, tem como objetivo explorar a verdade real do processo, garantindo que nenhum aspecto seja negligenciado de ambos os lados”.

Já Jeová Sardinha, também em nota, ponderou “que antes de tudo quero falar que reconheço a seriedade e a prevalência do machismo e do racismo em nossa sociedade. Minha intenção, naquele contexto, ao abordar temas delicados como assédio e racismo, foi enfatizar a importância de uma análise cuidadosa e contextual de cada caso, para evitar julgamentos precipitados e erros. Entendo que a escolha de minhas palavras ditas no calor de voto verbal, até com erros de vernáculo, não dizem respeito ao caso concreto”.

Erro corrigido

A defesa da vítima afirmou que os casos que envolvem a dignidade sexual precisam ser julgados a partir dos fatos e provas que fazem parte do processo e não com julgamentos morais, como, segundo a advogada Taísa Steter, ocorreu. Apesar disso, informa que na sessão desta terça-feira (26) o erro foi corrigido.

A presidente da Comissão a Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO), Fabíola Ariadne, também asseverou, em nota, que muitas mulheres deixam de procurar a Justiça justamente por medo de serem revitimizadas. Além disso, citou que para casos de assédio há protocolos para evitar preconceitos e esteriótipos.