Juiz reconhece advocacia predatória e extingue processos propostos pelo mesmo advogado contra instituição financeira

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O juiz Georges Leonardis Gonçalves dos Santos, da 1ª Vara Cível de São Miguel do Araguaia, em Goiás, reconheceu cooptação irregular de clientes e advocacia predatória e julgou extinto dois processos movidos contra uma instituição financeira – especialista em crédito consignado a aposentados e pensionistas. No caso, foram identificados pela Berna, ferramenta de inteligência artificial (IA) do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), mais de 200 ações com 80% ou mais de similaridade propostas no Estado pelo mesmo advogado.

Em âmbito nacional, segundo apontou a defesa do banco, feita pelo escritório Rennó e Machado Advogados Associados, são 500 demandas ajuizadas pelo referido advogado contra instituições financeiras – conforme pesquisa realizada junto a Tribunais de Justiça em todo o Brasil. As ações questionam descontos de crédito consignado em benefícios previdenciários.

Os advogados André Rennó Lima Guimarães de Andrade e Breiner Ricardo Diniz Resende Machado apontam na contestação de uma das ações que a petição inicial é praticamente idêntica a diversas outras, as quais, provavelmente, foram ajuizadas “em lote”. Em todos os casos, a parte autora alega a necessidade de revisão contratual ou a suposta nulidade dos pactos, tendo em vista que está recebendo descontos sem tê-los firmado, sendo que, praticamente, apenas o nome das partes e o número dos contratos são alterados.

“Fato é que o Poder Judiciário não pode ficar alheio a este tipo de conduta, no qual o ajuizamento de demandas, muitas vezes, é feito sem que a efetiva contratação do advogado para o patrocínio da causa tenha ocorrido pela parte, o que à toda evidência macula a procuração “outorgada” e a capacidade postulatória supostamente atribuída ao causídico, em patente capitação indevida de clientela e fraude processual, enquadráveis como atos atentatórios à dignidade da justiça”, apontam os advogados.

Ao analisar as demandas, o magistrado esclareceu que o Centro de Inteligência do TJGO, por meio da Nota Técnica n. 5/2023, sugeriu rotinas aos magistrados para a identificação do ajuizamento de demandas predatórias. Além de uniformização de procedimentos administrativos e jurisdicionais com objetivo de reprimir referidas lides.

Advocacia predatória

O juiz disse que, nesse contexto, e atento ao crescente número de demandas idênticas ajuizadas pelo mesmo advogado, constata-se a existência de provas cabais de cooptação irregular de clientes e advocacia predatória. Além de relatos de ameaças perpetradas pelo causídico com vistas a impedir que as vítimas prestassem declaração de desconhecimento da demanda.

Citou que, em pelo menos outros quatro processos ajuizados pelo mesmo advogado, as partes alegaram que não tinham conhecimento das ações e que não conhecem o causídico. Além disso, em um deles, a parte relata que passou a receber ameaças do referido advogado e que deu ciência à OAB local e ao órgão ministerial.

Ofício da OAB

O magistrado ressaltou que chegou ao juízo ofício direcionado pela própria Subseção da OAB local, requerendo providências em desfavor do causídico. Isso em razão de uma cliente, supostamente representada por ele, “tratar-se de pessoa idosa, que assinou procuração sem o necessário discernimento e sequer tem conhecimento da respectiva ação”.

“Entendo, pois, que o Poder Judiciário não pode ficar alheio ao crescente número de demandas idênticas, no contexto de abuso do direito ao acesso à Justiça e de simulação de lides, nem desconsiderar que sua admissão causa prejuízos à coletividade, na medida em que o ajuizamento de ações massivas demandam tempo e gastos que deveriam ser direcionados àqueles que de fato necessitam da tutela jurisdicional”, completou o magistrado.