A validade das cobranças de contribuições sindicais urbanas anteriores a novembro de 2017

A colega Gracyele Rodrigues de Medeiros escreve hoje sobre a validade das cobranças de contribuições sindicais urbanas anteriores a novembro de 2017. Ela é advogada graduada em Direito pela Universidade Federal de Goiás e pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Leia a íntegra do texto:

Gracyele Rodrigues de Medeiros

A Reforma Trabalhista, trazida pela Lei nº 13.467/2017, alterou a redação de diversos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho, dentre eles, aqueles que estão inseridos no capítulo que trata sobre a contribuição sindical.

A principal mudança trazida pela nova legislação foi tornar facultativo o pagamento da contribuição sindical, ou seja, no caso dos empregados, por exemplo, somente terão o valor descontado em contracheque se autorizarem o desconto.

Em oposição ao princípio da liberdade sindical previsto no inciso V do artigo 8º da Constituição Federal, o fato é que a CLT retirava o poder e a própria liberdade de decisão dos profissionais quanto a financiarem ou não os sindicatos representantes de sua categoria.

Aliás, o antigo artigo 583 da CLT obrigava não só empregados a pagarem contribuição sindical, mas também trabalhadores avulsos (autônomos), agentes ou profissionais liberais.

Pois bem, diante tal cenário, até 10.11.2017 a contribuição sindical era obrigatória, devendo os profissionais quitá-las anualmente.

Não é demais lembrar que enquanto as contribuições sindicais eram obrigatórias e fielmente descontadas nos contracheques dos empregados, o tema relacionado à cobrança de tais contribuições era raramente debatido, mormente porque os sindicatos gozavam de boa saúde financeira.

O cenário muda completamente, contudo, com o advento da Reforma Trabalhista e a falta de repasse aos entes sindicais, já que a desobrigação do pagamento fez com que grande parte dos profissionais não mais contribuíssem. Neste momento, portanto, criou-se um grande impasse entre sindicatos, profissionais e empresas, sendo que os efeitos ficaram ainda mais visíveis nos últimos tempos.

Isto porque, diante o prejuízo financeiro gerado pela não mais obrigatoriedade das contribuições, os sindicatos, então, começaram a cobrar aquelas anteriores a 11.11.2017, sendo que diversas ações foram ajuizadas para tal cobrança e, dentre elas, destaca-se as ajuizadas em face dos médicos.

Especificamente em relação à contribuição sindical urbana, já que para a rual adota-se entendimento diverso, a principal controvérsia quanto à validade de tal cobrança cinge-se, precipuamente, quanto à forma de constituição do débito, já que, por possuir a contribuição sindical explícita natureza tributária, exigia-se seu regular lançamento.

Neste ponto, necessário pontuar o que, quanto ao lançamento, prevê o Código Tributário Nacional – CTN em seu artigo 145, de forma expressa, que deve ser “regularmente notificado ao sujeito passivo”.

Por outro lado, a CLT prevê que “As entidades sindicais são obrigadas a promover a publicação de editais concernentes ao recolhimento do imposto sindical, durante 3 (três) dias, nos jornais de maior circulação local e até 10 (dez) dias da data fixada para depósito bancário”.

O principal questionamento, portanto, é se aplicável somente o que prevê a CLT quanto à forma de constituição do crédito tributário, ou se necessária, também, a aplicação do que prevê o CTN, exigindo-se tanto a notificação pessoal quanto à publicação em jornais para se considerar válida da cobrança da contribuição pelo sindicato.

A controvérsia gerou tantos debates que foi tema de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas no Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, o qual gerou a seguinte tese:

Tema 0010  IRDR 0010446-75.2019.5.18.0000

A cobrança judicial da contribuição sindical urbana prescinde do encaminhamento prévio de comunicação direta ao sujeito passivo, tendo como pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular a publicação de editais na forma do art. 605 da CLT, não se exigindo neles a indicação do nome do devedor e do valor do débito. DEJT-29/06/2020

Assim, para o TRT-18, aplica-se somente a análise do cumprimento do requisito exigido pelo art. 605 da CLT. Em que pese a alegação da desnecessidade de notificação pessoal, contudo, necessário será a análise se as publicações em Jornais de grande circulação obedeceram os moldes legais, ou seja, editais legíveis e que proporcionem ao contribuinte ao menos a possibilidade de tomar ciência da obrigação de efetuar o recolhimento da contribuição sindical.

Apesar da jurisprudência no Tribunal Superior do Trabalho ainda não ser pacífica quanto ao tema referente à cobrança de contribuição sindical urbana, há uma tendência maior a considerar válida somente a publicação de jornais e não aplicar o CTN, haja vista a previsão específica da CLT. De todo modo, há também julgados considerando a necessidade de notificação pessoal do devedor:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA FESMEPAR REGIDO PELA LEI 13.467/2017. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL URBANA. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO SUJEITO PASSIVO. EDITAIS GENÉRICOS. INVALIDADE. A contribuição sindical constitui uma espécie de tributo, razão pela qual a sua cobrança depende da regular constituição do crédito tributário, por meio de lançamento, sendo imprescindível a notificação pessoal do devedor, além da publicação de editais em jornais de grande circulação, como determina o artigo 605 da CLT. Agravo de instrumento não provido” (AIRR-1038-27.2019.5.09.0092, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 27/08/2021).

O que se verifica, portanto, é que o tema ainda merece maior debate e aprimoramento perante os Tribunal Superiores, não se podendo concluir que a ausência de notificação pessoal do devedor validará a cobrança de tais contribuições.