MP questiona norma que permite condicionar religação de água à quitação de todos os débitos do mesmo CPF

A concessão de medida liminar antecipatória para anular a resolução aprovada pela Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização dos Serviços Públicos (AGR) que permitiu o condicionamento da religação dos serviços de água e esgoto de um imóvel ao pagamento dos débitos antigos registrados sob o mesmo CPF. Esse é um dos principais pedidos contidos em ação civil pública protocolada nesta sexta-feira (26/1) pelo Ministério Público de Goiás e distribuída para a 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual (Protocolo 5032051.67). A demanda é assinada pela promotora de Justiça Marísia Sobral Costa Massieux, em substituição na 12ª Promotoria de Goiânia.

A ação questiona a Resolução Normativa nº 88/2017, da AGR, aprovada em abril do ano passado, e que autorizou a Saneago e qualquer outra fornecedora de água e esgoto no Estado de Goiás a valer-se do não restabelecimento do fornecimento a determinado consumidor exclusivamente por falta de pagamento de débitos vencidos sob o mesmo CPF/CNPJ sem que esses necessariamente correspondam ao mesmo endereço desse consumidor ou sejam atuais.

Além de anular a resolução, o pedido de liminar do MP contempla ainda a determinação à AGR para que exclua e deixe de aplicar o conteúdo do artigo 7º da resolução normativa e à Saneago para que não aplique a norma, não condicionando o restabelecimento de água e esgoto de cada imóvel ao pagamento de débitos antigos registrados sob o mesmo CPF. Também faz parte do pedido a determinação para que Saneago restrinja o corte de serviços apenas a dívidas atuais dos consumidores, do último mês e específicas do imóvel em questão. Visando assegurar o cumprimento da liminar, é requerida a fixação de multa diária no valor de R$ 50 mil, a ser revertida ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor.

Na ação, a promotora aponta que a resolução editada pela AGR vai na contramão do ordenamento jurídico brasileiro, de maior proteção do sujeito e dos direitos fundamentais, como os do consumidor. “A ideia do crédito acima da dignidade humana vem sendo extinta do ordenamento brasileiro há tempos … É esta a linha de raciocínio que deve ser utilizada por agentes reguladores”, argumenta Marísia Massieux.

A ação reforça que a jurisprudência dos tribunais superiores é consolidada a respeito da impossibilidade de corte no fornecimento de serviços essenciais em razão de débitos antigos, especificando que as dívidas pretéritas devem ser cobradas por meio de ação de cobrança, proposta pela concessionária. “Autorizar, por meio de resolução, prática constitucionalmente veda e contra a jurisprudência dos tribunais superiores causa transtornos à população e instabilidade na ordem jurídica”, pondera a promotora. Ela lembra ainda que os julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) são reiterados no sentido de vedar o corte de fornecimento por dívida de outro sujeito, como é o caso em questão.

A demanda do MP relaciona casos de alguns consumidores que foram afetados pela autorização dada pela resolução da AGR de condicionamento de religação de serviços à quitação de dívidas sob o mesmo CPF. Um dos casos mencionados diz respeito, inclusive, a uma outra ação proposta pelo MP, no caso, pelo promotor Sandro Henrique Silva Halfeld Barros, em Acreúna, apontando transtornos causados à população pela nova diretriz adotada pela Saneago.

Liminar em Acreúna
Na ação proposta em Acreúna, o promotor relata que a conduta adotada pela Saneago afetou, inclusive, a delegacia de polícia do município, que teve o fornecimento de água cortado. Com base na argumentação de violação ao direito do consumidor, a promotoria da comarca obteve tutela de urgência do Judiciário para determinar que a Saneago se abstenha de suspender o serviço de água e esgoto em imóveis que estão com as contas pagas e sem nenhum débito, sob pena de multa de R$ 500 mil por descumprimento.

A estatal também deverá restabelecer os serviços em todos os imóveis sem débito e, em especial, na delegacia do município, no prazo de 12 horas, sob pena de multa de R$ 6 mil. Terá ainda que afixar, no prazo de 24 horas, em seu escritório de atendimento ao público cartaz na metragem 1mx1m, em local visível, com a seguinte informação ao consumidor: “É proibida a suspensão de água por débitos de outros imóveis, dívidas pretéritas ou dívida do antigo usuário”. A multa, neste caso, é de R$ 1 mil por dia. Para alertar a população, a decisão deverá ser divulgada nas rádios de Acreúna.