Em nota técnica, Asmego defende legalidade da licença-prêmio e rebate críticas da OAB

Em nota técnica divulgada na tarde desta quinta-feira (26), a Associação dos Magistrados de Goiás (Asmego) defende a legalidade da licença-prêmio, a simetria constitucional entre a magistratura e o Ministério Público, e rebate as críticas feitas pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO) ao novo benefício à classe.

Projeto de lei criando a licença-prêmio para magistrados chegou a ser aprovado pela Corte Especial do Tribunal de Justiça de Goiás mas não chegou a ser encaminhado para apreciação do Legislativo, que foi convocado para sessão extraordinária na quarta-feira (25). Como não foi remetido pelo TJGO, os deputados estão analisando apenas o PL que trata da criação de 33 varas na estrutura do Poder Judiciário, em Goiânia e no interior, e ainda seis cargos de desembargador, além de cerca de 200 cargos de assistentes e assessores para os novos magistrados.

Veja a íntegra da nota técnica

TODOS OS SERVIDORES PÚBLICOS DO ESTADO TÊM DIREITO À LICENÇA-PRÊMIO, MENOS A MAGISTRATURA.

No Estado de Estado de Goiás, todos os servidores públicos fazem jus à licença-prêmio, inclusive membros do Ministério Público, da Defensoria Pública, da Procuradoria do Estado e Delegados de Polícia:

a) A Lei Complementar n. 25/98, Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Goiás, prevê o direito à licença-prêmio em favor de Promotores e Procuradores de Justiça nos arts. 108 a 110;

b) A Lei Complementar n. 130, aprovada ano passado, em 11 de julho de 2017 (sem qualquer passeata, comício ou caminhada da OAB) prevê o direito à licença-prêmio no art. 138 em favor de Defensores Públicos do Estado de Goiás, carreira recém-estruturada;

c) os Procuradores de Estado, Procuradores da Assembleia Legislativa, Delegados de Polícia e servidores públicos em geral do Estado de Goiás, inclusive, os servidores do Tribunal de Justiça, os quais são associados ao SINDIJUSTIÇA, também fazem jus à licença-prêmio, nos termos do art. 243 da Lei Estadual n. 10.460/88.
Não é de hoje que a Magistratura deixou de ser a carreira mais atrativa, pois, além de ser um dos concursos mais difíceis dentre as carreiras jurídicas, possui o maior grau de cobrança, a maior carga e complexidade de trabalho e a maior responsabilidade, porém, não detém a maior remuneração. De fato, este panorama legislativo configura claro desrespeito aos membros da Magistratura Goiana, discriminados em relação a outras carreiras jurídicas estatais, diante dos inúmeros direitos e vantagens a estes concedidos sem igual correspondência, apesar de o Judiciário ser, em tese, o parâmetro constitucional remuneratório (art. 37, XI, art. 39, §1º, I, II e III e art. 129, §4º, CF).

Qual a razão para a OAB adotar uma conduta claramente discriminatória, na medida em que o seu discurso seletivo de moralidade não serviu para fazer protestos contra o recebimento de licença-prêmio por Promotores e Procuradores de Justiça, Procuradores de Estado, Defensores Públicos e Delegados de Polícia? Por que somente a Magistratura não deve receber se, juridicamente, além ser referência para efeito do teto remuneratório, a Constituição Federal, por força do art. 39,§1º, incisos I, II e III, exige que a política remuneratória dos servidores e agentes públicos em geral observe: (a) a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira; (b) os requisitos para a investidura; e (c) as peculiaridades dos cargos?

LICENÇA-PRÊMIO E SIMETRIA CONSTITUCIONAL

Com o advento da EC 45, criou-se uma simetria entre as carreiras do Ministério Público e da Magistratura, a partir da nova redação conferida ao §4º do art. 129 da Constituição. Com isso, o CNJ editou a Resolução n. 133, de 21 de junho de 2011 para regulamentar a simetria de alguns benefícios. Apesar do reconhecimento pelo CNJ, a Resolução n. 133/2011 foi tímida e não resolveu a grande disparidade existente entre os benefícios pagos aos membros do Ministério Público e da Magistratura do Estado de Goiás. E nem é preciso ser um gênio para se perceber que simetria exige paridade.

O art. 129, §4º, da Constituição, sobretudo, permitiu verificar que a Magistratura vem sendo sistematicamente desprestigiada, ao ponto de, em lugar de buscar ser o parâmetro remuneratório máximo (art. 37, XI, c/c art. 39, §1º, I, II e III, da CF), na prática, acabou por se limitar a pedir equiparação de benefícios com o Ministério Público, que há longos anos possui muitos mais benefícios e melhor remuneração. Não obstante isso, a magistratura sofreu injusto, infundado e discriminatório constrangimento por parte da OAB que, em tese, deveria lutar pelo cumprimento da Constituição.

Em Goiás todos os servidores públicos, com exceção dos magistrados, fazem jus ao benefício da licença-prêmio. Se avaliada apenas a carreira do Ministério Público, com análise da Lei Complementar n. 25/98, fica muito evidente a disparidade existente entre os benefícios que o legislador conferiu aos Promotores de Justiça, sem igual correspondência aos Juízes. Este desprestígio da Magistratura revela, sobretudo, que o patamar remuneratório fixado pelo legislador em leis paralelas descumpre a Constituição em relação aos parâmetros objetivos para fixação da política remuneratória, devendo esta discriminação ser corrigida pelo próprio legislador, na medida em que os juízes deveriam, no mínimo, receber igual tratamento. É justo um promotor de justiça ganhar mais do que um juiz?

LICENÇA-PRÊMIO, HONORÁRIOS DOS PROCURADORES DO ESTADO E A “MORALIDADE” DA OAB-GO.

Os Procuradores do Estado de Goiás, além do direito à licença-prêmio, de gratificações pelo exercício de funções e da remuneração mensal paga pelos cofres do Estado, recebem um benefício remuneratório denominado de “honorários de sucumbência” de duvidosa constitucionalidade, como se advogados privados fossem, benefício hoje corroborado pelo §19 do art. 85 do CPC, também de duvidosa constitucionalidade.

Não por acaso, alguns juízes federais já reconheceram a inconstitucionalidade, na forma do que determina o art. 39, §1º, §4º e §8º, pois “Os Advogados Públicos, tal como todos os outros servidores estatais organizados em carreira, devem ser remunerados exclusivamente através de subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer outra verba de caráter remuneratório”. Além disso, “Apesar de serem públicos todos os recursos materiais e humanos utilizados no desempenho da atividade desenvolvida pelos membros da AGU – atividade essa também de natureza pública -, a verba honorária é apropriada pelo Procurador que, como visto, nada despendeu, mas apenas prestou sua força de trabalho, a qual, todavia, já é remunerada pelo subsídio do cargo​. Ora, está-se diante de um evidente enriquecimento sem causa​, fenômeno não admitido por nossa ordem jurídica (art. 884, CC)” (Cf. Decisão proferida pela 15ª da Justiça Federal – Seção Judiciária do Ceará – Autos n. PROCESSO Nº: 000483-10.2014.4.05.8101). São servidores efetivos do Estado que que ingressam na carreira por concurso público, com subsídio mensal fixo, cuja remuneração deve observar parâmetros constitucionais claros, sujeitos a um regime jurídico estatutário e não a um contrato de honorários.

Apesar da duvidosa constitucionalidade, os Procuradores do Estado de Goiás continuam a receber a verba extra, muito acima do teto do funcionalismo público, que, no âmbito do Poder Executivo Estadual, conforme art. 37, XI, da CF, é o subsídio do Governador. Basta consultar a folha de pagamento da PGE para se notar claramente que a verba extra eleva e muito a remuneração dos Procuradores do Estado, em violação da Constituição. Curiosamente, contudo, isto não é divulgado na imprensa, muito menos se vê a OAB fazer protestos pela rua. A “moralidade” da OAB-GO é seletiva e conforme os seus interesses. É uma moralidade para alguns, e não para todos. Em verdade, busca-se, sob qualquer pretexto, enfraquecer a magistratura, tenha esta razão ou não. Os ataques são direcionados exclusivamente contra a magistratura. É possível que estas ações não sejam movidas pelo interesse público, mas sim com escopo associativo, político-partidário ou privado.

LICENÇA-PRÊMIO E A “MORAL SELETIVA” DA OAB-GO

Causa estranheza a seletividade da OAB em atacar a extensão por lei de benefício recebido há anos por todos servidores públicos efetivos do Estado de Goiás, inclusive, membros do Ministério Público, Defensoria Pública, Procuradoria do Estado e Delegados de Polícia. Apenas os magistrados não recebem, mesmo tendo o Poder Constituinte escolhido o Poder Judiciário como parâmetro remuneratório máximo (art. 37, XI, c/c art. 39, §1º, I, II e III, da CF). Causa mais estranheza ainda os argumentos utilizados pela OAB que, a princípio, embora exijam um debate mais profundo, poderiam assim ser avaliados:

a) o argumento referente à crise financeira não resiste ao fato de que todos os servidores públicos do Estado de Goiás há muito tempo recebem o benefício, com exceção da magistratura. Primeiro, a indenização é excepcional e somente será paga por extrema necessidade do serviço público. Segundo, se há dinheiro para pagar Promotor e Procurador de Justiça, Procurador de Estado, Defensor Público e Delegado, por qual razão não há para pagar Juiz? E por qual razão somente agora, com a extensão à magistratura, a OAB contesta este direito e, pior, de forma seletiva? Por que razão a OAB não se insurgiu contra a Lei Complementar n. 130 da Defensoria Pública, publicada ano passado, na data de 11 de julho de 2017, que disciplinou o mesmo direito? Em contra a Lei Complementar n. 25 do Ministério Público? E a Lei Estadual n. 10.460? Será que a não extensão ou a não suspensão de um benefício discriminatório não incrementaria ainda mais este quadro geral de legislação arbitrária e incompatível com a Constituição? A interpretação econômica tem papel exclusivo na eficácia dos direitos? Enfim, o que a OAB propõe é algo semelhante a sugerir a duas pessoas em igual situação, “A” e “B”, que, em razão de crise financeira, “A” não terá direito um benefício que seu colega “B” usufrui há anos, mas que este continuará a receber normalmente, pois já vinha recebendo.

b) a seletividade crítica da OAB impressiona. Demonstra, sobretudo, a possibilidade de que os ataques contra a magistratura não tenham relação com o interesse público, mas com possíveis interesses associativos ou particulares, na medida em que nunca se contestou, protestou ou se fez enquete sobre este benefício há muito tempo recebido por outros servidores públicos, muito menos se fez o mesmo quando a Defensoria Pública aprovou sua lei recentemente. Em verdade, busca-se, sob qualquer pretexto, enfraquecer a magistratura, tenha esta razão ou não.

c) a moralidade tão defendida pela OAB deveria ser cumprida, em primeiro lugar, pela própria instituição, com a sujeição ao regime jurídico de direito público, como todas as demais “Autarquias Profissionais”. Como Autarquia Federal, que exerce poder de polícia, fiscaliza o exercício da Advocacia e cobra taxa (tributo) sob forma de anuidade, deveria sujeitar-se, no mínimo: i) ao regime jurídico de direito administrativo, a exemplo de concurso público e licitação; ii) ao princípio republicano, a exemplo de prestação de contas perante o Tribunal de Contas da União; iii) ao regime jurídico tributário e financeiro, a exemplo da elaboração do orçamento, com previsão de receitas e despesas e execução orçamentária nos moldes da Constituição, da Lei n. 4.320 e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Os argumentos de que se trata de uma entidade essencial para o regime democrático, para o Estado de Direito e para a Administração da Justiça constituem mais um fator para se sujeitar ao regime jurídico de direito público do que se intitular como entidade “sui generis”, imune de qualquer controle social e dos órgãos oficiais. Esta sujeição em nada prejudicaria a autonomia e a atuação da entidade, mas, por outro lado, evitaria o uso político-partidário da entidade que detém, de fato, uma grande importância para toda a sociedade civil e para o Estado Democrático de Direito. No entanto, não se vê este discurso de moralidade quando se trata de aplicação própria. E, no campo da moralidade, não basta alegar o que consta no Estatuto da OAB, pois “não basta ser legal, tem que ser moral”. Ademais, trata-se de uma exigência republicana e Constitucional.

Diretoria da Asmego.