84% das pessoas atendidas pelo Justiça Terapêutica não reincidem no crime

O Programa Justiça Terapêutica do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) completou cinco anos desde a sua implantação, em outubro de 2010, com 1.728 participantes. Do total, 84% dos atendidos não tiverem reincidência criminal. As estatísticas da iniciativa são da coordenadora-geral, juíza Maria Umbelina Zorzetti, que considera o resultado como “extremamente positivo”.

A juiza Maria Umbelina Zorzetti é coordenadora do programa em Goiás
A juiza Maria Umbelina Zorzetti é coordenadora do programa em Goiás

Homens com menos de 30 anos de idade, com ensino escolar incompleto e vínculos familiares desfeitos representam a maioria do público. Eles cometeram crimes em que a droga estava presente de alguma forma – para alimentar o vício ou o tráfico. “É necessário trabalhar além da punição penal, para que seja possível reinserir essa pessoa na sociedade. O objetivo do programa é ouvir, acompanhar e ajudar esse público”, sintetiza Maria Umbelina Zorzetti.

Em média, são 330 participantes por mês. O programa oferece atividades e grupos reflexivos de forma harmônica ao cumprimento da pena. A participação no programa é, inclusive, uma forma de monitorar o réu e ajudar o trabalho da Execução Penal, para fins de progressão do regime.

“A Justiça Criminal é, normalmente fria: seu papel é processar, condenar e mandar prender o réu. O novo paradigma que o Justiça Terapêutica propõe é um olhar diferente da Justiça: além de responsabilizá-lo, vamos conhecê-lo como ser humano”, completa Maria Umbelina.

O juiz auxiliar da presidência do TJGO Márcio de Castro Molinari  elogia o trabalho desempenhado no programa. “No Brasil, prefere-se a repressão do usuário de drogas, pura e simplesmente, em vez da busca por soluções da origem do problema. Neste âmbito diferencial, o programa trabalha um novo enfoque e se apresenta como opção para reduzir a criminalidade como um todo”.

Oportunidade
Lucas Rodrigues, que foi incluído no programa, faz palestra sobre sua participação no Justiça Terapêutica. Ela será incluída rotineiramente na agenda oferecida aos novos participantes. Sua entrada no programa ocorreu por maneira peculiar: ele estava foragido, mas queria mudar de vida e procurou a coordenação do programa.

Lucas Rodrigues, já incluído no programa, dá palestras sobre a iniciativa
Lucas Rodrigues, já incluído no programa, dá palestras sobre a iniciativa

Sua vida, até então, havia sido marcada por assaltos a casas lotéricas, correios e residências. “Quando era mais novo, queria aparecer e ter dinheiro. Demorou, mas caí na real. É possível conquistar uma vida boa, sem fazer coisas erradas. Além disso, nada supera nossa paz de espírito e o bem-estar com a família”, assume.

Na época, com 24 anos de idade, 3 deles na cadeia decorrentes de roubo, Lucas havia conseguido o direito de cumprir o restante da pena no regime semiaberto, mas desesperado, acabou fugindo. Apesar de estar em liberdade irregular, ele procurou emprego e se manteve longe dos crimes desta vez. Pouco tempo depois, foi oferecido ao seu pai, que é usuário de drogas e se envolveu em delitos, participação no Justiça Terapêutica.

Lucas não pensou duas vezes, mesmo foragido, compareceu ao fórum para acompanhar seu genitor. Gostou tanto de participar da iniciativa que resolveu continuar como voluntário até que, um ano depois, criou coragem para se abrir sobre sua ilicitude. “Fui incentivado a me apresentar voluntariamente à Justiça. A Thayssa (Thayssa Maria Garcia Moiana, da comissão gestora) fez um laudo sobre minha vontade de mudar e me apoiou bastante. Acreditaram e confiaram em mim”, conta sobre o momento crucial que o ajudou a colocar um ponto final na vida pregressa.

Em audiência com a juíza Wanessa Rezende Fuso, da 2ª Vara de Execução Penal de Goiânia, Lucas conseguiu o direito de responder a pena em prisão domiciliar. Continuou no Programa Justiça Terapêutica e, mesmo após sua conclusão, participa hoje como voluntário, tamanho seu engajamento. “Quero ser um bom exemplo para minha filha e para outras pessoas que possam estar numa situação parecida. Errei e ainda estou pagando (diz se referindo ao uso da tornozeleira), mas vejo que muita gente lutou e acreditou em mim. É possível mudar, basta acreditar que se é capaz”, finaliza.