MP-GO denuncia proprietários de clínica de reabilitação por sequestro e cárcere privado

O Ministério Público de Goiás (MP-GO), por intermédio da 16ª Promotoria de Justiça de Aparecida de Goiânia, denunciou Marcos Dhouglas Gomes de Moraes, Leilislany Esteves de Sousa, Fernando Wesley Silva e Thiary Thais Silva Andrade por cárcere privado e sequestro. O que ocorria mediante internação forçada por período superior a 15 dias, de 36 pessoas, na Clínica de Reabilitação Terapêutica Filhos do Reino, no Jardim dos Buritis, naquela cidade. Os quatro estão presos desde o dia 20 deste mês.

De acordo com a promotora de Justiça Simone Disconsi de Sá Campos, em um dos casos, uma equipe da clínica foi até a residência de uma das vítimas e, com emprego de força, a segurou e a obrigou a tomar um medicamento, que a dopou. Em seguida, esta pessoa foi levada para o estabelecimento contra a vontade dela, onde permaneceu de 22 de novembro de 2020 até 20 de abril de 2021.

A promotora de Justiça destaca que, de 2 de fevereiro de 2020 a 20 de abril de 2021, os quatro denunciados expuseram a perigo a vida e a saúde dos pacientes. Segundo Simone Disconsi de Sá Campos, eles privaram as pessoas de cuidados indispensáveis e as sujeitaram a trabalho inadequado, enquanto estavam sob os cuidados deles.

Clandestina

A denúncia narra que Marcos Dhouglas Gomes de Moraes era o responsável legal pela clínica, pois era quem assinava os contratos e recebia os valores pagos por familiares das vítimas. Leilislany Esteves de Sousa, além de companheira de Marcos Dhouglas, era a enfermeira responsável por ministrar a medicação dos pacientes, enquanto Fernando Wesley Silva tinha o cargo de coordenador, que atuava na segurança, administração e demais afazeres da clínica de reabilitação. Já Thiary Thais Silva Andrade era a psicóloga responsável pelos atendimentos dos internos da clínica.

Segundo a peça acusatória, foi apurado, no inquérito policial, que a Clínica de Reabilitação Terapêutica Filhos do Reino funciona desde 2019, já tendo sido registradas diversas denúncias na Comissão de Orientação e Fiscalização do Conselho Regional de Psicologia de Goiás e em outros órgãos públicos sobre a ocorrência de maus-tratos contra os pacientes. Além disso, funcionaria de forma clandestina, sem autorização dos órgãos competentes.

Foram registrados relatos, na Comissão de Orientação e Fiscalização do Conselho Regional de Psicologia, de que os pacientes do local estariam sendo maltratados, medicados contra a vontade, além de proibidos de deixar o local. Também foram apontadas privações de necessidades básicas, perpetradas com o aval de uma psicóloga registrada no Conselho Regional de Psicologia, a qual era conivente e não comunicava os órgãos fiscalizatórios.

Averiguação

No dia 20 de abril deste ano, diante da nova denúncia, MP-GO, Defensoria Pública do Estado de Goiás e a Comissão de Orientação e Fiscalização do Conselho Regional de Psicologia realizaram uma averiguação preliminar na clínica. Havia 40 internos. Foi constatado que o local não possuía as mínimas condições de funcionamento, a estrutura não era adaptada para as atividades de uma clínica e as instalações físicas não suportavam a quantidade de internos. As condições de higiene não eram adequadas, sendo notado odor fétido, bem como havia internos da clínica necessitando de atendimento médico primário.

Dos 40 internos do local, 39 relataram que estavam internados contra a vontade e que foram conduzidos para o local por uma prática conhecida por resgate, que era praticada por uma equipe formada por três a cinco homens, que se dirigiam para o local onde as vítimas estavam a pedido dos familiares. A equipe, então, com emprego de força, pegava as vítimas de surpresa – em suas residências, igreja ou na rua. Elas eram amarradas, vendadas e medicadas. Quando acordavam, já estavam no interior da clínica.

Os internos relataram também que, quando estavam na clínica, eram proibidos de deixar o local, podendo apenas conversar com familiares por telefone em dias não especificados. As vítimas eram obrigadas a realizar a limpeza da clínica, enquanto os seus familiares pagavam mensalmente pela internação e tratamento, acreditando que estariam realizando tratamento de dependência alcoólica ou de substâncias entorpecentes. Duas vítimas afirmaram que sofreram agressões físicas consistentes em enforcamento pelos monitores da clínica. Além disso, uma delas já estava internada na clínica de reabilitação há mais de um ano e dois meses.

Simone Disconsi de Sá Campos afirmou, na denúncia, que, diante da gravidade da situação, o Conselho de Psicologia e da Defensoria Pública acionaram a Vigilância Sanitária e a Polícia Militar. Os quatro responsáveis pela clínica foram presos em flagrante.

O MP-GO denunciou Marcos Dhouglas Gomes de Moraes, Leilislany Esteves de Sousa, Fernando Wesley Silva e Thiary Thais Silva Andrade pela prática dos crimes previstos nos artigos 288, caput, do Código Penal (associação criminosa) e 148 (privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado), parágrafo 1º, incisos I (se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior de 60 anos), II (se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital) e III (se a privação da liberdade dura mais de 15 dias), do Código Penal, por trinta e seis vezes, na forma do artigo 71 (crime continuado). (Assessoria de Comunicação Social do MP-GO)