EUA exigem senhas e logins de redes sociais para conceder visto. Goiana teve de fornecer dados esta semana

Wanessa Rodrigues

Os Estados Unidos estão endurecendo ainda mais a maneira pela qual suas embaixadas e consulados analisam os candidatos a um visto de turismo e de imigração. Esta semana, por exemplo, uma goiana teve de fornecer a agentes consulares em Brasília login e senha de redes sociais antes de conseguir visto para visitar aquele país. A medida havia sido anunciada no último mês de fevereiro pelo o secretário de Segurança Interna, John Kelly, com o objetivo de estabelecer controles ainda mais rígidos e eliminar os que possam constituir uma ameaça à segurança.

Especialistas observam que, perante a legislação brasileira esse tipo de solicitação significa invasão de privacidade. As senhas só podem ser fornecidas por ordem judicial. Porém, conforme explica o advogado Witer DeSiqueira, do escritório Law Offices Of Witer DeSiqueira, as Embaixadas ou Consulados são território Americano e as leis que regem lá dentro são as americanas.

A advogada Camila Hermano, especialista em Direito Internacional e sócia-proprietária da Hermano Advogados, lembra que cada país possui sua legislação específica. Para os EUA, esta solicitação para entrada no país está prevista em lei. Mas ela salienta que há uma linha tênue entre essa solicitação e o ferimento dos direitos humanos individuais. Forçar o indivíduo a entregar seus dados de maneira indiscriminada pode ferir esses direitos.

Em tese, conforme Camila Hermano, pode vir a ferir o direito fundamental da pessoa humana à privacidade, de acordo com o artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras tantas convenções internacionais. De acordo com a Corte de Apelação Americana em US vs. Cotterman, os agentes americanos devem ter ao menos uma suspeita plausível – algo entre suspeita e uma causa razoável – para ter acesso aos dispositivos dos viajantes.

Precaução

Advogado Witer DeSiqueira.

Witer DeSiqueira salienta que este é mais um meio de os EUA se precaverem de possíveis fraudes e de infiltrações terroristas, pois é uma maneira de identificar se o aplicante ao visto tem ligações com esse tipo de grupo. Além disso, ele observa que, a partir das postagens em redes sociais é possível detectar se o solicitante realmente está indo fazer turismo, ou se é uma fraude, e se a intenção é ficar ilegalmente no país posteriormente.

O especialista diz que a solicitação de senhas e logins já acontece nos portos de entrada daquele país. Ou seja, quando uma pessoa é conduzida à famosa “salinha da imigração”, são solicitadas informações de suas redes sociais para verificar suas reais intenções nos EUA.

O advogado conta que, em um caso tratado pelo escritório, por exemplo, uma brasileira foi para aquele país a turismo e acabou ficando lá por cinco meses e trabalhou em uma lanchonete sem registro legal. Ao retornar aos EUA depois de vir para o Brasil, os agentes de imigração apenas digitaram a palavra “trabalho” no aplicativo WhatsApp dela e localizaram todas as conversas respectivas à atividade que ela iria iniciar naquele país. A brasileira foi deportada pelo crime de missrepresentation (termo jurídico para mentira).

Dificuldades
Witer DeSiqueira acredita que as consequências do endurecimento na análise é que dificulta ainda mais a aquisição do visto. Isso porque os vistos poderão ser negados por conta de pequenos detalhes postados em perfis de redes sociais. Porém, ele lembra que as pessoas que têm intenção de pedir um visto, não o deixarão de fazê-lo por conta desta nova regra, deverão apenas tomar os cuidados necessários.

O advogado aconselha àqueles que estão indo para uma entrevista de visto que forneçam suas senhas e logins de redes sociais sempre que solicitados. Porém, recomenda que antes tomem o cuidado de excluir qualquer postagem que faça apologia à violência, terrorismo, preconceitos, etc. Além disso, evitem deixar em seus perfis qualquer alusão à ideia de ir morar nos EUA. “O mais importante em uma solicitação de visto é não mentir jamais. Em segundo lugar, comprovar vínculos fortes com o Brasil, o que fará o agente acreditar que o aplicante do visto voltará ao fim de sua viagem de turismo”, completa.

Impedimento

Advogada Camila Hermano.

A advogada Camila Hermano lembra que a proposta de que viajantes internacionais indicassem suas contas pessoais de redes sociais durante o processo para requisitar o visto americano foi feita pelo Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos durante o último ano de governo do então presidente, Barack Obama. Desde então, as informações contidas​ nas redes, pode​m ser usadas para que as autoridades neguem a entrada d​os visitantes naquele país. ​A especialista lembra que o atendimento a tal solicitação não é obrigatório​​, mas pode ​vir a ​impedir a entrada do estrangeiro no país ​caso​ os agentes americanos entendam​ que este ato tenha alguma relação com o terrorismo.

Na opinião da especialista, com esse endurecimento nas regras para conseguir o visto, as pessoas podem passar a optar por viajar para outros países devido à burocracia para entrada nos EUA, que, consequentemente, não seriam a primeira opção de turismo para muitas pessoas. ​​Além disso, ela acredita que haverá diminuição de imigração irregular.​

​Reciprocidade
Para a especialista, o Brasil pode começar a utilizar do mesmo controle com os visitantes americanos. A União Europeia, por exemplo, decidiu isso recentemente que, para a entrada nos países europeus, os americanos precisarão de vistos previamente emitidos pelas autoridades. Antes, previa a entrada indiscriminada de cidadãos americanos nos países​. Esta foi uma resposta à decisão dos EUA de impedir a entrada de alguns visitantes/imigrantes de determinados países da União Europeia. “Assim, o Brasil pode também optar por atuar norteado pelo princípio da reciprocidade, pedindo login e senha dos norteamericanos que venham ao Brasil”, ressalta.