Estado terá de indenizar servidor que foi objeto de sindicância por mais de um ano

Wanessa Rodrigues

O Estado de Goiás terá de indenizar um agente de segurança educacional que sofreu processo de sindicância por mais de um ano, foi afastado de suas funções e teve o pagamento de gratificação de função suspenso. O procedimento foi prorrogado por mais de cinco vezes e, ao final, arquivado por falta de comprovação das condutas irregulares do servidor. O juiz Reinaldo Alves Ferreira, da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual da comarca de Goiânia, determinou o pagamento de R$ 5 mil, a título de danos morais, em função justamente da extrapolação do tempo de investigação.

Conforme o magistrado, a perenização da sindicância contraria vários dos princípios constitucionais norteadores da conduta administrativa, especialmente o da eficiência, da razoável duração dos processos, da moralidade e, até mesmo, da dignidade da pessoa humana. Ferreira determinou, ainda, indenização por danos materiais, condenando o Estado a pagar parcelas da Gratificação de Atividade Socioeducativa (Gase) que foram ilegalmente suprimidas no período em que servidor ficou afastado de suas funções.

Advogado Oto Lima Neto.

O servidor, que foi representado na ação pelos advogados Oto Lima Neto e Thiago Vieira Cintra, sócios do escritório Lustosa & Lima Sociedade de Advogados S/S, narra que tomou posse como agente de segurança educacional em 2012. Em abril de 2013, com base em denúncia anônima, foi instaurado processo de sindicância para apurar supostas irregularidades cometidas por ele e outros servidores. À época, o servidor autuava no Centro de Internação Provisória (CIP) e foi realocado na Superintendência de Gestão do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), onde passou a exercer a função de motorista.

Com a mudança de função, o servidor perdeu, inclusive, o direito ao recebimento de Gratificação de Atividade Socioeducativa (Gase), correspondente a R$ 600 mensais, durante todo o período de tramitação da sindicância, que foi finalizada apenas em maio de 2014. Na ação, os advogados salientam que o Estado foi muito além da mera investigação informal, discreta e prudente. Deu publicidade e formalidade a acusações anônimas e apócrifas, transferindo o servidor de seu local de labor e suprimindo-lhe, injusta e injustificadamente, considerável parcela de seus ganhos alimentares.

Em sua contestação, o Estado de Goiás alegou, inicialmente, a perda parcial do objeto da demanda, diante do restabelecimento do pagamento da Gase ao Autor. Defendeu a inexistência dos pressupostos para a responsabilização da Administração, tendo em vista o dever de investigação de supostas condutas irregulares, além de que a simples instauração do procedimento de sindicância não acarretaria nenhum dano ao servidor. Isso porque, o procedimento visa apurar fatos e não aplicar penalidades, mormente pelo fato de ter sido arquivada pela não demonstração das irregularidades.

Advogado Thiago Vieira Cintra.

Quanto ao tempo de duração da sindicância, diz que inexiste em lei prazo previsto para a conclusão do procedimento. Em relação à supressão da gratificação, salienta que o benefício possui caráter propter laborem, decorrente, segundo a Lei Estadual nº 17.683/2012, do efetivo desempenho de atividades psico-sócio-pedagógicas e profissionalizantes e de atendimento, monitoramento, e segurança ao sócio-educando, além de exigir a aprovação dos servidores em avaliações periódicas de desempenho individual de mérito. A gratificação só foi restabelecida a partir de fevereiro de
2015.

Sentença
Ao analisar o caso, o magistrado ressaltou que, como restou comprovado pelo Estado, à época do ocorrido o Estatuto dos servidores públicos do Estado de Goiás (lei nº 10.460/1988) não previa prazo máximo de duração para a sindicância. Contudo, cuidou a lei de fixar, para o processo administrativo disciplinar, o prazo máximo, mesmo após prorrogações, de 180 dias. Assim, salienta o magistrado, não é possível considerar que um simples procedimento investigativo preliminar possa se estender por prazo tão excessivo, superior, até mesmo, ao que é previsto para o próprio processo disciplinar.

O juiz observa que, na seara federal, a Lei nº 8.112/1990 já limitava a duração do procedimento de sindicância a apenas 30 dias, prorrogáveis por igual, redação que foi transplantada, por força da Lei Estadual nº19.477/2016, para o atual parágrafo 7º do artigo 327 da Lei 10.460/1988. “De onde se pode concluir que o próprio Estado reconhece a necessidade de imprimir celeridade à sindicância, situação que, a toda evidência, não foi respeitada no procedimento movido em face do autor”, diz o magistrado.

Dor moral
Em sua sentença, Reinaldo Alves Ferreira diz que impor ao servidor aguardar, por mais de um ano, a solução de simples processo investigativo preliminar sucessivamente prorrogado por culpa da própria Administração, constitui situação ensejadora de verdadeira aflição e dor moral. Ainda mais sem parcela substancial de sua remuneração, e sem sequer terem sido comprovadas as denúncias iniciais.

Quanto ao afastamento do servidor, o magistrado disse que, tendo sido fixado o prazo de 15 dias para a realização da sindicância, o afastamento deveria ter sido pelo mesmo período, com previsão de uma prorrogação. Ou seja, de apenas 30 dias. Conforme Ferreira, o período superior a 30 dias mostra-se ilegal e desarrazoado. Segundo diz, passado esse prazo, ele deveria ter sido imediatamente reconduzido às suas funções, independentemente da conclusão da sindicância.

Assim, conforme Ferreira, o servidor deveria ter continuado a receber a gratificação Gase após o período lega de afastamento. “Não se pode considerar legítima a supressão da gratificação após o prazo inicial de 30 dias. É que trata-se de vício criado pela própria incúria administrativa, não podendo ser o servidor penalizado por motivo ao qual não deu causa”, esclarece o magistrado.

Processo Nº: 0408522.78.2014.8.09.0051