A responsabilidade civil do fornecedor nos contratos de rastreamento e localização de veículos em caso de acidente

advogado felipe noleto dos santosCom o avanço da tecnologia, a utilização de equipamentos eletrônicos na prevenção de delitos e na resolução de crimes em geral se tornou comum e as empresas do ramo de segurança investem muito no desenvolvimento e aprimoramento de novas técnicas que impeçam ou dificultem a efetivação das atividades criminosas.

Com base nessas técnicas, surge o negócio jurídico de prestação de serviço de rastreamento e localização de veículos automotores, modalidade de serviço já bastante disseminada entre nós e ofertada por uma extensa gama de fornecedores e que pode ser oferecida isoladamente ou em conjunto com outras modalidades incrementais de serviços, tais como o de monitoramento de frotas, sistemas anti-furto e ainda seguro veicular, entre outros.

 

À vista disso, faz-se necessário o correto posicionamento do serviço de rastreamento de veículos dentro de um dos diversos ramos do direito privado, procurando estabelecer se se trata de relação jurídica civil comum ou submetida à incidência do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

 

Isso estabelecido, pode-se discorrer sobre como se dará a responsabilização da empresa prestadora dos serviços pelos danos ocorridos por acidente em decorrência do travamento do caminhão – se de forma subjetiva ou objetiva – bem como os principais elementos deflagradores do dever indenizatório e sua extensão pecuniária.

Para que se possa afirmar que entre duas pessoas desenvolve-se uma relação de consumo, faz-se necessário que estejam presentes três elementos, dois deles de ordem subjetiva e o terceiro de ordem objetiva.

Quanto aos dois elementos de ordem subjetiva, trata-se do fornecedor (artigo 3º do CDC) e do consumidor (artigo 2º do CDC), enquanto o elemento objetivo se refere ao produto ou serviço (parágrafos 1º e 2º do artigo 3º do CDC).

O que se tem, sob esta vertente de relação, é a perfeita subsunção do serviço de rastreamento às relações jurídicas submetidas ao Código de Defesa do Consumidor, justamente por estarem preenchidos os conceitos de consumidor, fornecedor e serviço, estatuídos respectivamente nos artigos 2º, caput, 3º, caput e parágrafo 2º, todos do Código de Defesa do Consumidor, com a aplicação da base principiológica, como a responsabilidade objetiva, e institutos insertos na Lei n. 8.078/90, dos quais se destacam: a inversão do ônus probatório, o foro do consumidor como competente para o ajuizamento das demandas, a proteção contra práticas comerciais abusivas etc.

Analisando sob o prisma dos acidentes causados pelo travamento do sistema de rastreamento, não obstante a carência do Direito em disciplinar novas situações concretas oriundas do avanço tecnológico logo que elas se apresentam, é certo que tal momentânea deficiência não pode resultar em exoneração do dever indenizatório.

Assim, de nada adiantaria se caracterizar o serviço de rastreamento como relação de consumo, se de tal fato não surgissem efeitos legais extensíveis à relação desenvolvida entre as partes e que lhe assegurassem o devido ressarcimento em caso de eventuais prejuízos após a identificação dos seus caracterizadores.

Os acidentes causados por travamento do sistema podem ser inseridos dentro do sistema de proteção ao consumidor no quesito de má prestação do serviço que pode gerar um vício ou defeito do produto que, por consequência gerará responsabilidade por parte do fornecedor, que será objetiva, ou seja, independe de prova por parte do consumidor.

Entretanto, há de se ressaltar que se o fornecedor comprovar que o travamento ocorreu por falta de manutenção do sistema, a responsabilidade recai novamente sobre o consumidor.

Assim, conclui-se que a responsabilidade civil das empresas prestadoras de serviço de rastreamento é objetiva – seja pelo fato, seja pelo vício do produto – não obstante se tratar de obrigação de meio, eis que oriunda de relação de consumo, sendo certo que as empresas fornecedoras somente se desvencilharão de seu dever indenizatário se comprovarem o perfeito funcionamento do sistema e o cumprimento de todas as ofertas veiculadas, como corolário do princípio da boa-fé objetiva incidente nas relações negociais.

*Felipe Noleto dos Santos é advogado, pós-graduado em Direito Corporativo pelo Ibmec/RJ, sócio e coordenador da área cível /empresarial do escritório Lara Martins Advogados.