O eventual consentimento de vítima menor de 14 anos para ato sexual é irrelevante e, mesmo que exista, não anula a prática do crime de estupro. Esse foi o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que seguiu o entendimento de parecer emitido pelo Ministério Público Federal (MPF) no Recurso Especial 2050425.
O processo tem como pano fundo a absolvição, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), de um homem acusado de estupro de vulnerável, por praticar sexo com uma garota de 13 anos à época dos fatos, em 2014. O STJ anulou a sentença do TJMG e condenou o réu à pena de oito anos de reclusão, em regime inicial semiaberto.
A decisão que havia absolvido o homem no tribunal de origem foi baseada na retirada da chamada “presunção de violência” do Código Penal, a partir da entrada em vigor da Lei 12.015/09. No acórdão, o TJMG entendeu que o art. 217-A, que tipifica o crime de estupro de vulnerável, pode ser relativizado a partir das “condições reais da vítima de entender o caráter das relações sexuais e de se orientar de acordo com esse entendimento”.
No parecer, o MPF esclareceu que a jurisprudência do STJ é “sistemática” quanto à impossibilidade de relativizar a presunção da violência no estupro de vulnerável. A matéria é abordada em norma vinculante da Corte, na Súmula 593. “O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente”, diz a normativa.
A manifestação, assinada pela subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen, destaca que, ao alterar o Código Penal Brasileiro, a Lei 12.015/09 retira o estupro de vulnerável do campo da “presunção legal”, passando o crime a integrar o próprio tipo penal.
O parecer também reforçou que o próprio TJMG reconheceu a autoria e materialidade dos fatos que levaram à acusação do homem. Segundo consta nos autos, ele praticou ato sexual com a adolescente após ter oferecido, consentido e disponibilizado bebida alcoólica a ela, causando-lhe embriaguez e tirando-lhe a capacidade de resistência e discernimento.
Ao defender o provimento do recurso, interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais, Frischeisen esclareceu, ainda, que o debate trata da correta interpretação da lei penal e não da necessidade de revisitar material probatório. Os fatos foram devidamente narrados pelo TJMG, mas a vulnerabilidade da vítima não poderia ter sido relativizada. (MPF)