Justiça entende que CVM não tem de indenizar investidores de empresa de Eike Batista

A Advocacia-Geral da União (AGU) comprovou que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) não pode ser responsabilizada pelo prejuízo que investidores particulares tiveram com a queda do valor das ações da antiga OGX, petrolífera fundada por Eike Batista. A atuação ocorreu em ação ajuizada por acionistas com o objetivo de condenar a autarquia federal, responsável pela regulação do mercado de capitais, a pagar, junto com o empresário, indenização pelas perdas financeiras.

Os aplicadores alegaram que os gestores da OGX forneceram informações falsas sobre a capacidade da empresa de explorar reservas de petróleo. O objetivo teria sido o de estimular a compra de ações. Já a CVM foi acusada de ter sido omissa ao não impedir a divulgação dos dados supostamente inverídicos.

Contudo, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM (PFE/CVM) lembrou precedente de caso semelhante julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no qual foi reconhecido que responsabilizar o Estado por prejuízos no mercado financeiro seria o mesmo que estabelecer uma espécie de direito à socialização das perdas, assegurando judicialmente lucros ao capital e eliminando o risco de aplicações em que ele é inerente.

De acordo com os advogados públicos, o investidor adquire ações com a expectativa de lucrar, mas tal rentabilidade é condicionada ao desempenho e sucesso da empresa, de maneira que a CVM não poderia ser entendida como uma garantidora universal do retorno financeiro dos investimentos realizados.

“O elemento risco integra naturalmente as relações de troca promovidas pelos agentes econômicos no mercado de ações, uma vez que não há garantia de retorno sobre o investimento realizado. Os prognósticos de crescimento de qualquer empresa são, por definição, uma expectativa e não uma promessa de resultado”, explicou a procuradoria, lembrando, inclusive, que todas as projeções divulgadas pelas empresas que negociam ações são acompanhadas de um alerta para os investidores de que se trata de mera expectativa, que não necessariamente se concretizará.

Fiscalização

A PFE/CVM também esclareceu que a autarquia abriu dois processos administrativos para punir Eike Batista por condutas irregulares. A comissão também já havia realizado 18 procedimentos de monitoramento das empresas integrantes do chamado grupo X entre 2010 e 2013. Além disso, desde julho de 2013, quando foi anunciado que a OGX não teria condições de explorar os campos de petróleo cujos direitos havia adquirido, o órgão regulador havia enviado para os gestores da empresa 85 ofícios solicitando esclarecimentos e informações. Segundo a procuradoria, “não há que se falar, portanto, em omissão” da autarquia.

“Tão logo se deparou com indícios de irregularidade na atuação dos administradores da OGX, a CVM instaurou procedimentos de fiscalização adicionais aos de supervisão e aprofundou seu conhecimento dos fatos. As apurações já resultaram na instauração de dois processos administrativos sancionadores visando à punição do responsável”, observou a procuradoria.

A unidade da AGU afirmou, ainda, não caber à CVM verificar previamente a veracidade das informações divulgadas pelas empresas, o que seria impossível tecnicamente e ainda inviabilizaria a chegada dos dados aos investidores com a velocidade necessária para que eles estivessem devidamente informados antes de tomar decisões.

Também foi destacado que os autores do processo insistiram por escolha própria em realizar os investimentos, ignorando uma longa trajetória de redução do valor das cotações da OGX que antecedeu até mesmo a queda mais acentuada, registrada em julho de 2013.

Além disso, segundo os advogados públicos, os aplicadores ainda são proprietários das ações adquiridas e, como não é possível garantir que elas não serão valorizadas novamente, não se pode nem mesmo afirmar que houve um dano irreversível, como seria necessário para que existisse o direito à reparação. “Conclui-se, portanto, que os autores têm a ousada pretensão de manter os títulos em suas carteiras, beneficiando-se com a possível retomada das cotações, e ainda obter indenização do Estado pela oscilação negativa observada até aqui”, completou a PFE/CVM.

Riscos inerentes

A 30ª Vara Federal Cível do Rio de Janeiro acatou os argumentos da AGU e julgou improcedente o pedido dos acionistas. A decisão reconheceu que a CVM não pode ser responsabilizada pela veracidade das informações fornecidas pelas empresas e tampouco tem como assegurar o retorno dos investimentos realizados. “A CVM não tem o poder de prever o futuro do empreendimento, de saber se será rentável, próspero ou não, para assumir a condição de garantidor dos negócios celebrados pelos investidores. O mercado de valores envolve riscos inerentes a sua própria atividade, não havendo amparo legal para responsabilizar a autarquia”, observou o magistrado que analisou o caso.

Já o processo contra Eike Batista foi extinto sem resolução do mérito, tendo em vista que a Justiça Federal reconheceu não ter competência para julgar a parte da ação envolvendo o empresário.