Uma pequena alteração legislativa, um enorme avanço jurídico

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    O Brasil finalmente chegou à margem do período “pós-utópico”, expressão proposta por Eric Hobsbawn para demonstrar o período de descrença nos ideais de Estado totalitário, ainda que o totalitarismo esteja disfarçado.

    Quando a grande massa não mais aceita as atitudes totalitárias do Estado faz emergir o terreno para a edificação democrática. Democracia, ainda que polissêmica – pode ser entendida como o conjunto de regras que fixam quem está autorizado a tomar decisões coletivas e com quais procedimentos, sempre em benefício dos cidadãos. Bobbio acrescenta que, quanto mais pessoas puderem influenciar na tomada de decisão e quanto mais ela se basear na realidade fática, mais democrática será.

    É nesse contexto que, recentemente, os cidadãos brasileiros tiveram uma enorme vitória frente ao totalitarismo estatal.

    A lei 13.245 de 12 de janeiro de 2016 que alterou o artigo 7º, inciso XXI do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil para garantir aos advogados a assistência a seus clientes em quaisquer, sublinha-se, quaisquer procedimentos de investigação e apuração de infrações, podendo formular quesitos e apresentar razões.

    Mais que uma “intromissão” em uma fase até então tida como inquisitorial – restolho autoritário – a alteração possibilita, ainda em fase vestibular, o contraditório e a ampla defesa efetiva.

    A possibilidade de o investigado manifestar, participar e produzir provas, seja no inquérito policial (onde o acesso já estava garantido por súmula vinculante do Supremo Tribunal), no inquérito civil público ou em qualquer outro procedimento ou processo, de qualquer natureza, fará com que a verdade do Estado – ou do agente do Estado – possa ser confrontada com a verdade material, afastando-se as “presunções de legitimidade e de veracidade”.

    Nada disso teria efeito, ou seria uma lei sem dentes, se não houvesse no mesmo inciso XXI, do artigo 7º, do Estatuto da OAB a consequência para o não respeito a esses direitos: haverá nulidade absoluta de interrogatórios, depoimentos e todos os atos investigatórios e probatórios sequentes e decorrentes se o acesso e a participação do advogado forem negados.

    Até mesmo o acesso a casos sigilosos é tratado. Nestas hipóteses será necessária procuração com poderes específicos do investigado, podendo ser declarados sigilosos pela autoridade investigante apenas os documentos que possam causar prejuízo à investigação, podendo ela ser responsabilizada penalmente se impedir o acesso para dificultar a defesa.

    É momento de evolução. De compreender que as garantias constitucionais do processo são aplicáveis aos processos judiciais e aos administrativos. Inquéritos, sindicâncias e investigações nada mais são que processos administrativos. Comemoremos.