A incapacidade para o trabalho e o direito à quitação do imóvel

*Fabrício Cardoso Gomes

O contrato de financiamento de imóvel habitacional tornou-se bastante usual entre instituições financeiras e pessoas que buscam realizar o sonho da casa própria, em especial os contratos firmados pela Caixa Econômica Federal, como os programas Minha Casa Minha Vida. Uma das características intrínsecas desses contratos são as cláusulas de seguro, que visam resguardar o contratante de eventuais sinistros que venham a ocorrer no próprio imóvel ou com a pessoa do contratante.

Em relação aos riscos à pessoa, o contratante, nos casos em que for acometido por invalidez para o seu trabalho habitual após a assinatura do contrato, tem o direito à quitação do saldo devedor do financiamento a partir da data de início da incapacidade, desde que haja previsão contratual para tanto.

Ressalta-se que a proteção conferida pelo seguro abrange a quitação do saldo devedor de todo o período após o início da incapacidade. Por exemplo, caso o contratante tenha ficado inválido e ainda reste R$ 50.000,00 para quitar o imóvel, a instituição financeira é obrigada quitar o saldo devedor do contratante.

Sendo assim, mesmo aquele que, após a invalidez continuou pagando as parcelas do financiamento, tem o direito ao ressarcimento da quantia já paga, pois, como dito, o direito ao prêmio do seguro surge com o início da incapacidade. Importante ter o cuidado com o prazo do art. 206, §1º, inc. II, do Código Civil, o qual confere ao contratante um ano para requerer o prêmio a partir da ocorrência do sinistro ou, conforme a jurisprudência, um ano a partir da ciência inequívoca da invalidez[1] (Súmula 278 do STJ), que pode ocorrer após a conclusão de um processo administrativo de aposentadoria, por exemplo.

Desse modo, o interessado deve procurar o setor de seguro da instituição financeira munido com documentos pessoais, laudos médicos e carta de concessão de aposentadoria (caso tenha sido aposentado), bem como cópia do seu contrato de financiamento e, assim, realizar o formal comunicado de sinistro, para que se proceda com o ressarcimento (se caso for) e a quitação do financiamento.

Os deveres de quitação do financiamento, bem como o de ressarcimento de quantias já pagas, são frutos do estrito cumprimento da boa-fé objetiva dos contratos e à sua função social. O art. 757, do Código Civil, prevê que “o segurador se obriga mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo à pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

Mais especificamente no caso de financiamento de imóveis habitacionais pela Caixa Econômica Federal, existe o Seguro Habitacional do Sistema Financeiro da Habitação – SH/SFH, o qual, por meio do Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS, autorizado pela Lei 12.409/2011, visa garantir o pagamento integral do saldo devedor do financiamento de imóveis nos casos de incapacidade, invalidez ou morte do mutuário (contratante), caso exista previsão contratual.

A jurisprudência dos Tribunais é uníssona no sentido de resguardar o direito à indenização nos casos de injusta negativa da seguradora em efetivar o pagamento do prêmio, na hipótese de expressa previsão contratual, pois “comprovada a invalidez total e permanente do mutuário por causa superveniente à pactuação […], impõe-se reconhecer a amortização do salto devedor […]”.[2]

Portanto, o direito do contratante ao prêmio do seguro advindo de sinistro ocasionado pela aposentadoria por invalidez é claro, porém desconhecido por grande parcela das pessoas que efetivam esse tipo de contrato. Importante lembrar que, nos casos de indeferimento pela seguradora do direito à quitação do financiamento, pode-se buscar o poder judiciário, o qual sempre poderá dar a última palavra. 

*Fabrício Cardoso Gomes é advogado no GMPR Advogados, pós-graduando em Direito Previdenciário pelo IEPREV, membro do núcleo de Direito Previdenciário do IEAD. E-mail para contato: fabricio.cardoso@gmpr.com.br. 

 REFERÊNCIAS.

BRASIL. TRF-1. Processo AC 0008249-13.2007.4.01.3400. QUINTA TURMA. Julgamento 20 de Fevereiro de 2019. Relator DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA. Publicação 16/04/2019. JusBrasil, 2019. Disponível em: https://trf-1.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/890467396/apelacao-civel-ac-ac-82491320074013400. Acesso aos 13/10/2021.

BRASIL. TRF-3. Processo Ap 0009536-29.2012.4.03.6100. PRIMEIRA TURMA. Julgamento 26 de Março de 2019. Relator DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS. Publicação e-DJF:04/04/2019. JusBrasil, 2019. Disponível em: https://trf-3.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/695015013/apelacao-civel-ap-95362920124036100-sp. Acesso aos 13/10/2021.

BRASIL. STJ. Súmula 278. Segunda Seção. Min. Relator. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Julgamento em 14/05/2003. Publicado em 16/06/2003. Disponível em: https://www.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-2011_21_capSumula278.pdf. Acesso aos 13/10/2021.

[1] TRF-3. Processo Ap 0009536-29.2012.4.03.6100. PRIMEIRA TURMA. Publicação e-DJF:04/04/2019. Julgamento 26 de Março de 2019. Relator DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS.

Sumula 278, do STJ: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral.”

[2] TRF-1. Processo AC 0008249-13.2007.4.01.3400. QUINTA TURMA. Publicação 16/04/2019. Julgamento 20 de Fevereiro de 2019. Relator DESEMBARGADORA FEDERAL DANIELE MARANHÃO COSTA.