Acordo de despenalização não retroage quando já houver denúncia ou condenação, defende MPF

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O Ministério Público Federal (MPF) defende no Supremo Tribunal Federal (STF) que acordos de não persecução penal (ANPPs) – previstos no artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP), introduzido pela Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime – só devem valer para a fase de investigação, ou seja, para o momento pré-processual, anterior ao recebimento da denúncia.

Nas hipóteses de denúncias oferecidas ou já aceitas pela Justiça ou ainda de condenação proferida, o instrumento não pode retroagir para beneficiar o réu. É o que consta de cinco pareceres assinados pelo subprocurador-geral da República Juliano Baiocchi (nos habeas corpus 204.711, 215.396 e 223.255; no Recurso em Habeas Corpus 215.037 e no Recurso Extraordinário 1.339.068).

Em todos os processos nos quais o MPF opina, a situação é semelhante: pessoas denunciadas antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019 pedem a aplicação do acordo de despenalização, sob o argumento de que a nova lei deveria retroagir para beneficiá-las.

Ao julgar outro recurso (HC 185.913/DF) no último dia 17 de dezembro, o ministro Gilmar Mendes, do STF, reconheceu monocraticamente a retroatividade do art. 28-A do CPP e determinou a devolução do processo ao Ministério Público para propositura do ANPP. Essa decisão, no entanto, contraria a jurisprudência da Primeira e Segunda Turmas do Supremo e precedente do próprio Plenário da Corte. O caso agora deve ser submetido à apreciação dos demais ministros, para deliberação de mérito.

Nos pareceres, Juliano Baiocchi pede o sobrestamento, até o julgamento final do HC 185.913/DF pelo Plenário do STF, da determinação que pode resultar na proposta de ANPP, e a suspensão da prescrição até a resolução de mérito. Ainda requer a reforma da decisão do ministro Gilmar Mendes e, subsidiariamente, caso não haja retratação, que o caso seja apreciado pelo Plenário.

O representante do MPF destaca que o artigo 28-A do CPP não determina a automática anulação das condenações ou a revisão de processos em curso. Para ele, a aplicação retroativa de lei, sem maiores ponderações, teria o potencial de violar a ordem jurídica, pois seriam relativizados dispositivos do texto constitucional como os que determinam que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Nesse sentido, na fase investigativa, é cabível o acordo de despenalização, pois ainda falta a certeza da materialidade ou da autoria do crime, ou seja, existe dúvida razoável, que pode cessar mediante a confissão do investigado. Situação diversa ocorre após o oferecimento da denúncia e do seu recebimento, pois nesse momento já há prova da materialidade e indícios suficientes da autoria (requisitos para o recebimento da denúncia – art. 40 do CPP). E na sentença condenatória, presume-se a existência de prova acima da dúvida razoável da autoria.

Outro ponto importante é que o novo dispositivo não tem eficácia retroativa ampla, por ser norma de natureza mista (penal/processual), sem previsão expressa de aplicação para casos ocorridos antes da entrada em vigor da nova lei. “A decisão ora agravada mostra-se contrária a precedentes das duas Turmas deste STF e mesmo de seu Plenário, que são no sentido de que o acordo de não persecução penal esgota-se na fase pré-processual, não sendo possível aplicá-lo a feitos em curso quando da vigência da nova norma, em que já recebida a denúncia e, muitas vezes, proferida condenação, confirmada em grau de apelação e por Tribunal Superior”, salienta.

Íntegras dos agravos

HC 204.711
HC 215.396
HC 223.255
RHC 215.037
RE 1.339.068

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