Tese sustentada por advogado muda entendimento adotado em Goiás sobre crimes contra a ordem tributária

Advogado tributarista Antônio Luís dos Santos Barros inovou e a tese passou a ser acatada

Wanessa Rodrigues

Quando o contribuinte apura e declara o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) devido nas operações próprias, mas deixa de efetuar o pagamento, não há, nesse caso, incidência da norma penal, pois não ocorre apropriação indébita.  De acordo com o artigo 1º, da Lei nº 8.137/90, somente há incidência da norma penal quando o contribuinte se utiliza fraude para suprimir ou reduzir tributos. A partir dessa tese, o advogado tributarista Antônio Luís dos Santos Barros, do escritório Antônio Luis Advogados Associados S/S & SBR Consultoria Tributária, conseguiu há algum tempo mudar entendimento adotado em casos de Goiás sobre crimes contra a ordem tributária.

Em Goiás, segundo explica o advogado, a Justiça vinha mantendo entendimento no sentido de que o simples não pagamento do ICMS configuraria crime contra a ordem tributária, tendo em vista que esse imposto em regra é repassado ao consumidor . Porém, ele explica que foi possível mudar essa percepção, demonstrando de forma didática a diferença entre o imposto devido nas operações próprias e aquele em que a pessoa figura apenas na condição de responsável por substituição tributária.

Em um dos casos em que o advogado atuou, o 2º Juízo da 12ª Vara Criminal de Goiânia o qual condenou o réu como incurso nas condutas do artigo 2º, inciso II, da Lei 8.137/90 c/c art. 71, do Código Penal. Ou seja, não recolhimento, no prazo legal, de ICMS descontado ou cobrado, em continuidade delitiva – 15 meses inadimplidos. A pena foi fixada em 1 anos e 9 meses de detenção no regime inicial aberto, mais 180 dias-multa pela proporção mínima – substituída por limitações de direitos.

Ao entrar com recurso no Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), o advogado salientou que as condutas são atípicas na medida em que se referem a mera inadimplência de ICMS próprio, quando, em verdade, o art. 2º, II, da Lei 8.137/90, ao condicionador o não recolhimento de tributo “descontado” ou “cobrado”, converge antijuridicidade à hipótese de apropriação indébita decorrente da responsabilidade tributária. Além disso, que o caso é de cobrança de dívida civil inadimplida, cuja sanção prisional é inconstitucional. A tese foi acolhida pelo relator, desembargador João Waldeck Felix de Sousa.

Crime
O advogado explica que a Lei nº 8.137/90 qualifica como crime apenas a supressão ou redução de tributos quando o contribuinte age dolosamente, omitindo informações, prestando declarações falsas, falsificando documentos ou adulterando escrituração. Existe também situação em que a simples ausência de pagamento do imposto caracteriza crime, mas isso somente ocorre quando a pessoa deixa de recolher o tributo descontado ou cobrado, na qualidade de responsável. Em relação ao ICMS, somente se aplica nos casos de substituição tributária, em que o substituto cobra o imposto pelas operações subsequentes, ou antecedentes, mas deixa de repassá-lo aos cofres do Estado.

Em regra, segundo o advogado salienta, a simples falta de pagamento de tributo não configura crime, salvo os casos em que ocorre a apropriação indébita, ou seja, em que o contribuinte deixa de recolher o tributo que descontou de outrem. “Importante assinalar que a Constituição Federal assegura que não haverá prisão civil por dívidas (art. 5º, inciso LXVII), por esta razão, a simples falta de pagamento de tributo não viola a norma penal”, diz.

Dificuldade
O advogado diz que o crime contra a ordem tributária é material e, por isso, oferece muita dificuldade ao aplicador do Direito. É que, por se tratar de crime material (na maioria dos casos), a aplicação da lei penal requer bom entendimento do direito tributário. A título de exemplo, podemos citar inúmeros casos em que o tributo autuado se deu por aferição indireta (presunção ou arbitramento), e mesmo assim o Ministério Público oferece a denúncia, a justiça recebe e condena.

“Ora, no direito tributário se admite o emprego da presunção legal para constituição do crédito tributário, invertendo o ônus probatório. Ocorre que, em sede penal não se admite o crime presumido, até porque a presunção milita sempre em favor do réu, que deve ser considerado inocente até prova em contrário. Por isso, nos crimes tributários, não pode o lançamento embasado por aferição indireta ter reflexo não âmbito penal”, completa.