Brasil tem segunda população carcerária. Em GO, mais da metade dos detentos são temporários

Um relatório divulgado ontem pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) faz duras críticas ao demasiado uso do instituto da prisão provisória em países da região. Segundo o estudo, 40% dos presos brasileiros são detentos temporários. O levantamento revelou ainda que o Brasil está em segundo lugar, atrás somente dos Estados Unidos, no número de população carcerária. As informações são do jornal O Hoje.

Com déficit de 3.698 vagas em seu sistema carcerário, Goiás está entre os Estados da Federação que mais usam o artifício da prisão temporária. De sua população de mais de 12.059 detentos, conforme último senso carcerário realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mais da metade (53%) está presa preventivamente.

De acordo com o levantamento do CNJ, a população carcerária de Goiás está em 12º lugar no déficit de vagas e, no número total de presos, tanto domiciliares quanto nas prisões, o senso apontou que o Estado está em 14º lugar.

Para o juiz da primeira Vara Criminal, Jesseir Coelho de Alcântara, algumas medidas tomadas pelo Estado, como o uso da tornozeleira, são redutores da situação caótica que tomou conta das prisões goianas. “Essas providências esvaziam o regime semiaberto, e abrem espaço para o regime fechado”.

Jesseir cita outras situações que favorecem a redução da superpopulação carcerária. “Podemos citar a remissão de penas, onde estudo e trabalho diminuem o tempo de permanência do preso na cadeia”. Ele explicou que quem estuda tem direito à redução de um dia de pena a cada 12 horas de frequência escolar. “Já quem trabalha três dias tem direito a um dia descontado na pena”.

Distorções

Para o magistrado, falhas na legislação penal provocam distorções no sistema carcerário brasileiro, como muitas prisões por pequenos delitos como furtos em lojas e outros, enquanto criminosos perigosos e com reincidência em delitos graves seguem são soltos facilmente ou nem são presos. “Como uma lei muitas vezes é benéfica, os criminosos se pegam nesses pequenos detalhes”, alega o juiz.

O magistrado defende que as modificações devem ser feitas por meio da alteração das leis e também no sistema. “É preciso que haja uma apuração mais rápida da polícia, o Ministério Público deve fiscalizar mais eficazmente a aplicação da pena e o trabalho da polícia e a população deve cobrar menos morosidade do Poder Judiciário”. Ele acredita que, se todos esses fatores forem somados, é possível experimentar uma melhoria no sistema.
 

Esforços insuficientes

Já o presidente da Comissão de Segurança Pública e Política Criminal da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB Goiás), Rodrigo Lustosa, acredita que o Estado tem feito esforços, infelizmente insuficientes, para combater esse déficit. “Quando se fala em sistema prisional, a questão não se resume à ampliação de vagas em regime fechado”, afirma o representante da OAB.

Segundo o advogado, a Lei de Execuções Penais não contempla isso. Ele diz que, muitas vezes, a pessoa progride de regime, mas fica presa em um lugar onde não existe regime semiaberto. “Então, por falta da vaga, o juiz acaba mandando a pessoa para casa. Aí, a ideia da reintegração gradual desmorona”. O presidente explicou que os regimes semiaberto e aberto fazem parte de um conjunto sistêmico de execução penal. Segundeo ele, a reinserção deve ser gradual, por isso a lei prevê os três regimes. “No entanto, a existência de mais de 50% de presos provisórios em Goiás é indicativo de que o Judiciário tem vulgarizado a prisão provisória”, diz.

O representante da OAB informa que o Código de Processo Penal abre condições para que isso não seja uma prática. “Podem se usar medidas como proibição de frequentar determinados locais, proibição de se ausentar da cidade, recolhimento em domicílio em determinado horário”. Lustosa argumenta que os números mostram que a prisão tem sido a opção preferencial. “Isso gera sobrecarga no sistema, em que de 12 mil presos, 6 mil são provisórios”.

O advogado afirma que a alteração na lei tem sido apontada como grande solução para os males nacionais. “E esse discurso em certa medida se apresenta demagógico. Porque não cumprir a lei antes de ela ser modificada. Eu acredito que o cumprimento da lei de execuções penais como está hoje teria grande impacto para reduzir os índices de reincidência”, diz o advogado.