Município de Goianésia está impedido de aplicar verba pública no Carnaval 2017

O município de Goianésia está proibido de empregar verba pública na realização dos festejos de carnaval deste ano. Esta foi uma das determinações da juíza Ana Paula de Lima Castro, ao acolher parcialmente pedidos feitos em ação cautelar proposta na semana passada pelos promotores de Justiça Antônio de Pádua Júnior, Luciano Meireles e Márcia Cristina Peres. Segundo sustentaram, o objetivo da ação não é o de impedir a realização do evento, mas, sim, garantir o correto uso de verba pública municipal.

Também foi determinado que o município não poderá autorizar a realização do evento na Avenida Goiás, no centro de cidade, e, por fim, deverá exigir e analisar estudo de impacto de vizinhança para a realização do Carnaval 2017. Para a magistrada, “a pretensão de realizar o evento na região central (entre a Avenida Mato Grosso e Rua 12), área de uso predominantemente residencial, representa clara afronta à lei municipal, não somente por inobservância do artigo 77 da Lei n.º 2.615/2008, mas também pela ausência de estudo de impacto de vizinhança”.

Conforme apontado pelos promotores, assim que foram informados da realização do evento, que teria verbas do Ministério do Turismo, o MP-GO encaminhou ofícios ao município solicitando esclarecimentos quanto à realização do evento. Contudo, a resposta ao primeiro deles veio assinada pelo chefe da Casa Civil e pai do atual prefeito, contendo informações evasivas nem atendimento das solicitações, pois não informou a previsão de valores a serem gastos no evento, a origem dos recursos, os valores da contratação dos artistas, quais ruas seriam fechadas, e nem mesmo prestou informações sobre os necessários procedimentos licitatórios, embora tenha afirmado que estavam em andamento, o que não correspondia à realidade, pois os editais respectivos só foram publicados alguns dias depois.

A resposta ao segundo ofício, também assinado pelo chefe da Casa Civil, não prestou quaisquer esclarecimentos, limitando-se a dizer que o projeto para execução das festividades de carnaval ainda estava em conclusão, e, por esse motivo, ainda não era possível informar com precisão todas as questões levantadas. Já ao terceiro ofício enviado não houve qualquer resposta.

Ainda segundo os promotores, com notícias sobre o possível gasto de cerca de R$ 600 mil nas festividades do carnaval, aliadas ao fato de que existem indícios de irregularidades nos procedimentos que envolvem o evento, foi instaurado procedimento administrativo preparatório para inquérito civil público. Assim, foram novamente solicitadas informações e documentos sobre o evento, respondidos pelo prefeito apenas com uma solicitação de prazo de dez dias. Para os promotores, a postura do município “foi de recalcitrância e afronta ao procedimento instaurado, optando pela falta de transparência quanto a informações mínimas do evento, tais como estimativa de custos, origem dos recursos, dispêndio com os shows, despesas com estrutura, segurança e higiene, informação sobre a interdição de ruas e local de montagem de palco e das barracas, dentre outras”.

No mesmo procedimento, foi expedida recomendação ao prefeito, orientando-o a não destinar recursos públicos municipais para a realização do Carnaval 2017, e sim para obras e serviços permanentes, urgentes ou prioritários para a população, excetuando-se a renda advinda do próprio evento com a concessão de áreas públicas para a montagem de barracas e camarotes, precedidos de licitação. No entanto, a recomendação foi ignorada pelo gestor municipal.

Direitos fundamentais
A fim de comprovar a difícil situação financeira do município, o Ministério Público fez diligência à Farmácia Básica, quando se constatou que estava fechada desde dezembro de 2016, além de possuir uma dívida com o Instituto Brasileiro de Gestão Hospitalar, organização social gestora da Unidade de Ponto Atendimento, em valor superior a R$ 1,6 milhão, com riscos de fechamento da unidade durante o carnaval. Também foram constatadas dívidas com hospitais conveniados, sendo que os Hospitais Santa Luzia e São Carlos informaram a suspensão do atendimento aos usuários do SUS em razão do inadimplemento por mais de quatro meses pelo município.

Além disso, o Hospital Municipal Irmã Fanny Duran não possui estrutura para acolher todos os pacientes que procuram atendimento pelo sistema público de saúde. Ainda na área da saúde, foram apresentados os inúmeros procedimentos em curso e mandados de segurança ajuizados nos últimos seis meses com vista à garantia do direito à saúde (acesso a medicamentos, consultas médicas, exames complementares e cirurgias).

Educação
Na área da educação, foi sustentado que a Escola Municipal Luiz de Oliveira, de tempo integral, atualmente encontra problemas com a falta de equipamentos e servidores para suprir as necessidades dos alunos ali matriculados. Para os promotores, isso revela a incompatibilidade em dispender altas somas de verbas públicas municipais com a realização de festejos de qualquer natureza, em detrimento de áreas prioritárias como saúde e educação, violando-se os princípios constitucionais da moralidade administrativa e da legalidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal.

Conforme detalhado na ação, os gastos não se dariam apenas com a contratação de shows, mas também com publicidade, locação de serviços de som, palco, tendas, banheiros, gerador, hospedagem e alimentação de artistas e equipes, despesas com montagem de camarim, iluminação, Ecad, serviços de segurança e higiene, dentro outros, o que onera desnecessariamente o município no momento de grave dificuldade financeira.

Meio Ambiente e urbanismo
Também foi apontada pelos promotores a inadequação do espaço por ferir o Código de Posturas do Município em vários artigos, já que se trata de local distante apenas duas quadras do hospital municipal, além de ferir também o Plano Diretor Municipal, na medida em que não foram elaborados Estudo de Impacto de Vizinhança e Estudo de Impacto Ambiental. Segundo sustentado na ação, a realização do evento na área central da cidade gera transtornos de grande monta à população, com interdição de ruas e desvio de grande fluxo de veículos, poluição sonora excessiva, perturbação do sossego de grande parte da população, além de estar localizado próximo a escolas, centros religiosos e instituições bancárias, ferindo assim o Código de Posturas do Município.

Indícios de favorecimento
Outra questão levantada na ação é a possibilidade de favorecimentos de particulares. Segundo observaram, constatou-se a vinculação do Poder Público com a pessoa conhecida como “Bilika Dandas”, anunciante do único camarote que está vendendo ingressos até o momento (Camarote Sumiu Uai!), e empresário no empreendimento denominado Rural Grill, restaurante localizado no centro do evento.

Segundo divulgado em redes sociais desde 10 de janeiro, a exploração da atividade de camarote será realizada pelos responsáveis do Camarote Sumiu Uai!, havendo até mesmo venda de “passaportes” (ingressos) desde o dia 23 de janeiro. De acordo com os integrantes do MP, a situação demonstra que os responsáveis pelo aludido carnaval divulgam anúncios como se já fossem vencedores do procedimento licitatório, informando até mesmo a relação de shows e as datas do evento.

Ocorre que um dos responsáveis pelo camarote é Andrieferson Pereira da Silva, conhecido pela alcunha “Bilika”, o qual integrou comitiva do prefeito Renato de Castro a Brasília para tratar, no Ministério do Turismo, da verba disponibilizada ao município de Goianésia para realização do carnaval 2017 – notícia publicada no portal da prefeitura de Goianésia. Contudo, não houve qualquer comprovação de que houve procedimento licitatório para o uso do espaço, já que o edital de licitação de camarotes publicado no Diário Oficial no dia 2 de fevereiro foi cancelado quatro dias depois. Esta possível irregularidade na licitação será discutida pelo Ministério Público em ação própria.

“Em outras palavras, o poder público municipal está se responsabilizando pelas contratações de mais alto custo, enquanto alguns poucos particulares maximizam seus lucros, beneficiando-se da estrutura montada pela municipalidade no chamado ‘parque do carnaval’, em situação de evidente afronta à lei”, asseverou a magistrada. Fonte: MP-GO

Processo 5038430.64.2017.8.09.0049