Juiz faz parcerias para resgatar autoestima de vítimas de violência doméstica

Juiz de Jataí Rodrigo de Castro Ferreira

O juiz Rodrigo de Castro Ferreira, de Jataí, está mobilizando a cidade para dar mais autoestima às mulheres vítimas de violência doméstica na cidade. Em parceria com a Comissão da Mulher Advogada da OAB – Subseção de Jataí, Município de Jataí, Universidade Federal de Goiás, Instituto Federal de Goiás, Raízen, Senac Jataí, psicólogos, cabeleireiros e manicures, ele quer devolver às vítimas de agressões físicas e psicológicas o amparo necessário para que elas reassumam suas vidas.

No dia em que marca a conquista do voto feminino, 24 de fevereiro, o projeto foi apresentado à desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis, que assumiu recentemente a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Familiar.

Para se ter uma ideia da sensibilidade do magistrado, só pelo fato de ser homem, ele não recebe de imediato a vítima, que é prontamente atendida por estudantes de psicologia, integrantes da equipe interdisciplinar, que propiciam uma escuta qualificada. As vítimas recebem também atendimento jurídico. Quando o caso requer, principalmente aqueles em que ela ainda vive com o agressor e não quer se separar dele, ela é encaminhada para cabeleireiros e manicures, que cuidam de sua aparência, como uma forma de reduzir os efeitos da violência psicológica e agressões, que machucam a mulher e minam sua autoestima como aquelas em que elas são chamadas de feias, velhas ou gordas.

De acordo com o Mapa Nacional da Violência contra a Mulher, a cidade de Jataí ocupa o 82º lugar na escala nacional e 8º lugar na estadual em número de feminicídios. Além disso, de acordo com um estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Jataí é a 27ª cidade brasileira com maior número de registro de ocorrência de violência doméstica em delegacias. Diante destes dados, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) percebeu a necessidade de instalar um juizado da Mulher na comarca, sua quarta unidade especializada nesse tipo de crime, uma vez que já existem duas em Goiânia e uma em Rio Verde.

Até então titular do Juizado Especial Cível e Criminal de Jataí, o juiz Rodrigo de Castro foi escolhido para assumir o Juizado da Mulher e se deparou então com uma realidade que o tocou. Ao analisar os processos que foram transferidos para o novo juizado, ele percebeu que o tratamento dado a essas mulheres era revitimizador e que a justiça, apesar de cumprir o seu papel, o fazia da maneira que se espera dela, ou seja, retributiva, punindo o agressor.

“Essa justiça retributiva, de penalizar, foca toda a atuação estatal em punir o agressor, que precisa ser punido mesmo. Mas, em relação à violência doméstica, a sentença não põe fim ao conflito”, explicou o magistrado para quem o objetivo do Colmeia é resolver o conflito sociológico. A conclusão que o juiz chegou foi que punir o agressor, por si só, não protege a mulher. Mas, como alterar essa realidade?

Rodrigo de Castro, então, foi buscar parcerias para fazer um acolhimento decente para estas mulheres. Com a Universidade Federal, regional de Jataí, ele conseguiu o apoio do curso de Psicologia, que destina alunas para fazer uma escuta qualificada dos casos. Município, OAB e Senac, além de profissionais liberais, também colaboram com a causa e agem sempre que a situação exige. Policiais e oficiais de Justiça vinculados ao juizado também receberam orientações para alterar suas posturas e saber se portarem diante das particularidades de cada caso.

Colmeia
Com o envolvimento destes vários segmentos, em agosto de 2016, surgiu o Projeto Colmeia, que desde então já atendeu aproximadamente 40 mulheres e 20 homens mensalmente. O objetivo é prevenir, acolher, proteger e empoderar a mulher vítima de violência doméstica, bem como transformar a cultura machista que ainda é presença em boa parte da sociedade. Para garantir uma acolhida digna a estas mulheres, o juiz entendeu que ele, sendo homem, não poderia ser a primeira face a receber as vítimas. Uma de suas primeiras atitudes foi, então, solicitar um novo gabinete para a Diretoria do Foro e transformar o seu numa sala de acolhida, com alunas do curso de Psicologia da UFG, brinquedoteca e banheiro.

Estas alunas recebem as vítimas, recolhem informações e classificam os casos para que eles possam receber o tratamento adequado. Como eles são muito complexos e muitas vezes a própria vítima desiste de denunciar o agressor, Rodrigo de Castro precisou lançar mão de recursos como o Justiça Restaurativa, que prevê a recuperação também dos agressores. Além das medidas protetivas de urgência e outras providências, o juiz determina o comparecimento do agressor às sessões do Justiça Restaurativa, que é uma espécie de mediação de conflitos.

Além disso, Rodrigo de Castro Ferreira firmou parceria para realização de constelações familiares a fim de prevenir conflitos em núcleos familiares desgastados. Esta seria, na visão do juiz, uma maneira de construir a solução mais duradoura, uma forma de punição que tenha a vítima como fim e não o opressor. “É uma maneira de transferir a energia para o bem-estar da vítima e não só para a condenação do agressor”, disse Rodrigo de Castro.