É possível recorrer à Justiça em caso de reprovação no TAF?

O concurso público normalmente é composto por diversas fases eliminatórias e classificatórias, tais como as provas objetivas, discursivas, avaliação médica, teste de aptidão física (TAF), psicotécnico e investigação social. Neste artigo nos atentaremos ao teste físico, onde o candidato é avaliado por meio de alguns exercícios físicos (corrida, barra, flexão, salto, natação etc.).

Diversos candidatos são eliminados nesta etapa e não sabem se é possível recorrer à Justiça em face deste exame de aptidão física. Então, visando o caráter informativo em conscientizar àqueles que forem considerados “reprovados”, a seguir será exposto algumas hipóteses e argumentações jurídicas envolvidas em situações desta natureza.

Inicialmente, é importante o candidato saber que só é possível exigir prova física se houver previsão legal (tem que ter uma lei prevendo o teste). E mais, é imprescindível que a atividade física seja relevante e pertinente ao exercício da função.

Dessa forma, o organizador do concurso não tem a liberdade (discricionariedade) de decidir se vai ou não inserir o teste físico no concurso. Por conseguinte, deve haver pertinência com as funções do cargo e previsão legal, pois o TAF é uma restrição ao princípio do amplo acesso aos cargos públicos.

Para corroborar o nosso entendimento, segue uma decisão do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser ilegal a cobrança da avaliação de aptidão física envolvendo, por exemplo, o cargo de auxiliar de autópsia por ausência de previsão na lei:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA TÉCNICO-CIENTÍFICA. AUXILIAR DE AUTÓPSIA. EXAME DE APTIDÃO FÍSICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Cinge-se a controvérsia à legalidade da exigência de aprovação em teste de aptidão física, em face das atividades inerentes ao cargo de Auxiliar de Autópsia, para o qual o recorrente concorreu. 2. As disposições do edital inserem-se no âmbito do poder discricionário da Administração, o qual não está, porém, isento de apreciação pelo Poder Judiciário, se comprovada ilegalidade ou inconstitucionalidade nos juízos de oportunidade e conveniência, como na espécie, em que não há previsão legal para a exigência do teste de aptidão física. 3. O exame de aptidão física em concurso público apenas poderá ser exigido se for amparado em lei, por força do que estabelece o II do art. 37 da Constituição Federal de 1988. Precedentes. 4. Agravo regimental não provido. (STJ – AgRg no RMS: 34676 GO 2011/0124462-8, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 09/04/2013, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/04/2013)

Outro entendimento é que a prova física não pode ser exigida para cargos burocráticos, mesmo que haja previsão legal. É relevante salientar que embora o edital tenha previsão da etapa física é necessário verificar se tal exigência é legal e razoável.

Portanto, a exigência editalícia para realizar o TAF para os candidatos que disputam cargos burocráticos ou cujo intelecto supera a necessidade da condição física é desarrazoada. Podem-se citar, a título exemplificativo, os cargos de auxiliar de autópsia, escrivão da polícia civil, médico legista, papiloscopista e perito criminal.

Em relação ao cargo de escrivão da polícia civil, o próprio Supremo Tribunal Federal julgou um caso onde estava sendo discutida a legalidade do Teste de Aptidão Física para esse cargo. O STF entendeu que a exigência do Exame Físico não seria legítima em razão da não pertinência com a função a ser desempenhada pelo candidato tendo em vista que se tratava de função burocrática, diferentemente do agente de polícia. Segue a decisão proferida pela Suprema Corte, pela 1ª Turma, por ocasião do julgamento do RE 511.588-AgR/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, restando o acórdão assim ementado:

CONCURSO PÚBLICO – PROVA DE ESFORÇO FÍSICO. Caso a caso, há de perquirir-se a sintonia da exigência, no que implica fator de tratamento diferenciado com a função a ser exercida. No âmbito da polícia, ao contrário do que ocorre com o agente em si, não se tem como constitucional a exigência de prova física para a habilitação ao cargo de escrivão, cuja natureza é estritamente escriturária, muito embora de nível elevado.

Portanto, é ilegal e inconstitucional exigir o Teste de Aptidão Física para os cargos burocráticos, pois estes não necessitarão de uma envergadura corporal substancial do servidor público para o exercício de suas atribuições funcionais, basta ter a capacidade física do ser humano “médio”.

Ademais, outro ponto merece destaque, o candidato tem direito a que a prova física seja filmada, e este tem o direito de ter acesso à cópia da filmagem. A gravação do momento da prova é extremamente relevante, pois muitas vezes o candidato é eliminado por alguns poucos segundos, e, por conseguinte, é possível pelas vias judiciais requerer o direito de ser considerado apto, amparado pelo princípio da razoabilidade e proporcionalidade. Neste caso, dependerá da análise de cada caso em particular.

Por fim, vale frisar que a prova física tem de ser aplicadas em igualdade de circunstâncias para os candidatos, especialmente as condições climáticas. Se um candidato faz a prova às 08 horas da manhã, cuja temperatura ambiente é de 25 graus Celsius, outro, porém, realiza a mesma prova meio-dia, sendo a temperatura exacerbada de 32 graus, percebe-se claramente que houve lesão ao princípio da isonomia. Por conseguinte, o candidato tem o direito de fazer a prova novamente em caso de eliminação, pois as condições entre os candidatos foram distintas.

É perceptível que o calor é fator determinante quando se faz exercícios e, para alguns, a atividade se torna praticamente impossível. As condições fisiológicas para quem realiza um esforço físico pela manhã estarão mais preservadas do que as dos candidatos que cumpriram a etapa na parte da tarde. Por isso, se for para fazer uma análise justa de quem é mais bem capacitado, todos devem ser analisados sob as mesmas condições de temperatura.

Denominamos esta análise de Princípio da Igualdade de Condições ou de Oportunidade. Significa dizer que a todos os concorrentes devem ser dadas as mesmas condições de participação em cada fase do certame, não podendo haver qualquer forma de privilégio ou facilitação, sob nenhum pretexto.

Logo, cada candidato que se sentir injustiçado pela eliminação no teste de aptidão física, deverá analisar a sua situação em particular para identificar se enquadra em algumas das hipóteses supracitadas.

*Dúvidas podem enviar para o e-mail contato@agnaldobastos.adv.br