Tribunais deverão realizar audiências públicas sobre aborto

O Supremo Tribunal Federal (STF), tendo como relatora a ministra Rosa Weber, determinou que todos os Tribunais Estaduais, Regionais e Federais, bem como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), promovam audiências públicas para tratar sobre o tema da criminalização da interrupção voluntária da gravidez (aborto). Determinou, ainda, que o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) emita convites aos demais Ministros integrantes do STF para participarem da sessão, bem como enviarem indicações de convidados.

Isso porque o Psol ajuizou pedido de medida liminar alegando a controvérsia dos artigos 124 e 126 do Decreto-lei nº 2.848/1940, que instituem a criminalização da interrupção voluntária da gravidez pela ordem normativa constitucional vigente. O Psol defende que o dispositivo afronta a dignidade da pessoa humana, da cidadania, a não discriminação, a inviolabilidade da vida, a liberdade, a igualdade, a proibição de tortura ou o tratamento desumano e degradante, a saúde e o planejamento familiar das mulheres e dos direitos sexuais e reprodutivos.

O Psol alega ainda a desproporcionalidade da criminalização do aborto como medida estatal adequada de tutela ao valor intrínseco do humano no embrião estatal adequada de tutela ao valor intrínseco do humano no embrião ou feto, uma vez que não coíbe a prática nem promove meios eficazes de prevenção da gravidez não planejada e, consequentemente, do aborto, que exigem educação sexual integral, acesso a métodos contraceptivos adequados, combate à violência sexual e fortalecimento da igualdade de gênero.

No mérito pugnou pela procedência da arguição de descumprimento de preceito fundamental, a fim de que seja declarada a não recepção pela ordem constitucional vigente dos artigos 124 e 126 do Código Penal, tendo por objetivo excluir do seu âmbito de incidência a interrupção da gestação induzida e voluntária realizada nas primeiras 12 semanas, de modo a garantir às mulheres do direito constitucional de interromper a gestação, de acordo com a autonomia delas, sem necessidade de qualquer forma de permissão específica do Estado, bem como garantir aos profissionais de saúde o direito de realizar o procedimento.

Em razão deste pedido de medida cautelar, bem como a controvérsia constitucional, o Supremo consultou a Presidência da República, o Senado Federal e a Câmara dos Deputados. Em resposta, a Presidência da República sustenta a existência de desacordo moral razoável sobre a questão da descriminalização do aborto na sociedade brasileira, diante da ausência de consenso mínimo acerca das concepções morais, filosóficas e mesmo religiosas sobre a matéria. Em decorrência desse desacordo razoável, defende ser o Poder Legislativo a arena deliberativa competente para promover a discussão e o processo da tomada de decisão política, vinculante para todos os integrantes da sociedade. Isso porque, o Parlamento é o espaço democrático, dentro da estrutura procedimental do Estado de Direito, responsável por tutelar o pluralismo político.

Já o Senado Federal, apresenta informações nas quais esclarece que os artigos questionados não foram objeto da reforma legislativa empreendida no Código Penal, conforme a Lei nº 7.209/1984, motivo pelo qual são dispositivos legais aplicados pelas autoridades judiciais do País. Acrescenta a aprovação pelo Poder Legislativo do artigo 2º do Código Civil de 2002, o qual assegura direitos ao feto viável. Afirma que, para além da disciplina jurídica da matéria em questão, o Parlamento está promovendo as discussões pertinentes para eventual modificação do parâmetro legal.

A câmara dos Deputados, por sua vez, sustentou a vigência dos dispositivos legais questionados há mais de 70 anos, fato jurídico que, ao lado da vigência da regulamentação da ação, evidencia a não configuração do requisito legal do perigo da demora para a concessão da medida liminar. Quanto ao mérito, comprova que as normas impugnadas têm por objeto a tutela da vida humana intra uterina, de modo que a prática do aborto implica em atentado contra vida humana, direito fundamental inviolável, conforme o artigo 5º, da Constituição Federal.

Decisão
Ao analisar o processo, a ministra explicou que a questão da interrupção voluntária da gravidez nas 12 primeiras semanas envolve o espaço de conformação e incidência de diferentes valores públicos e direitos fundamentais. “A discussão que se coloca para apreciação e deliberação desse STF é um dos temas jurídicos mais sensíveis e delicados, uma vez que envolve razões de ordem ética, moral, religiosa, saúde pública e tutela de direitos fundamentais individuais”, afirmou a magistrada.

Ressaltou que a complexidade da controvérsia constitucional, bem como o papel de construtor da razão pública que legitima a atuação da jurisdição constitucional na tutela de direitos fundamentais, justifica a convocação de audiência pública, como técnica processual necessária, a teor do artigo 6º, da Lei nº 9.882/99 e dos artigos 13 e 154, ambos do RISTF. “Os interessados deverão manifestar seu interesse em participar da audiência pública pelo endereço eletrônico adpf442@stf.jus.br até o dia 25 de abril deste mês”, pontuou.

A solicitação deverá conter a qualificação do órgão, entidade ou especialista, conforme a configuração do requisito da representatividade adequada, a indicação do expositor, acompanhada de breve currículo de até duas páginas e o sumário das posições a serem defendidas na audiência pública. Os participantes serão selecionados, entre outros, pelos critérios como representatividade, especialização técnica e expertise do expositor ou da entidade interessada, garantia da pluralidade da composição da audiência e das perspectivas argumentativas a serem definidas como forma de se assegurar a legitimidade do processo de tomada de decisão e a utilidade dessa técnica processual para o esclarecimento de dúvidas acerca das diretivas e conteúdos interpretativos da matéria em debate. (Centro de Comunicação Social do TJGO)