Recebida denúncia contra procuradores, ex-vereador e delegado acusados de favorecerem Carlinhos Cachoeira

O juiz Vitor França Oliveira recebeu, no dia 25 de janeiro, denúncia oferecida pelo Ministério Público  contra agentes públicos do Estado de Goiás pelo suposto favorecimento a Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, também réu na ação. Foram acionados por ato de improbidade administrativa os procuradores do Estado Ronald Christian Bicca e Marcelo Marques Siqueira, o ex-diretor-geral da Polícia Civil de Goiás Edemundo Dias e o ex-vereador de Goiânia Wladimir Garcêz.

A ação, proposta pela promotora de Justiça Fabiana Lemes Zamalloa do Prado, foi apresentada em dezembro de 2016, apontando que, durante as investigações, que ficaram conhecidas como Operação Monte Carlo, ficou constatado que os procuradores Bicca e Marcelo Siqueira estariam envolvidos em suposta organização criminosa chefiada por Cachoeira.

Um inquérito civil público, apontado pela representante do MP, teria apurado que todos eles teriam participado de manobra ilícita para viabilizar o retorno de Edemundo Dias ao cargo de delegado de polícia que, anteriormente, ocupava. Ele, como apontou o MP, foi aprovado em concurso público, empossado em 1987, e acumulava indevidamente a função do emprego público na Caixa Econômica Federal, até que apresentou requerimento para saída do cargo de delegado.

Após quatro anos do ato, o então governador Maguito Vilela, por meio de novo decreto, tornou sem efeito a exoneração, o que, segundo a promotora, teria ocorrido sem nenhum amparo jurídico para a readmissão. Na mesma época, foi prorrogada a licença para tratar de interesses particulares por quatro anos. “Assim, após retornar ao exercício da função em 2011, foi concedida sua aposentadoria, com base no vínculo nulo”, apontou Fabiana.

Conforme relatou a promotora, nesse contexto, conversas interceptadas no curso da Operação Monte Carlo evidenciaram que os membros da suposta organização criminosa iniciaram diversas tratativas para viabilizar o retorno de Edemundo ao cargo de delegado, em especial no posto de delegado-geral, cargo estratégico para a organização criminosa no âmbito da prevenção e repressão aos jogos ilegais.

As conversas indicaram que Cachoeira e seu intermediário Wladimir Garcêz solicitaram apoio do então procurador-geral do Estado Ronald Bicca e do procurador Marcelo Siqueira para elaboração de pareceres favoráveis à situação de Edemundo, revertendo manifestações em sentido contrário.

Assim, em julho de 2011,  segundo a denúncia, Bicca proferiu despacho em que, apesar de reconhecer a nulidade da readmissão, acolheu a tese da decadência com base em argumentos genéricos de segurança jurídica e se pronunciou por sua manutenção no cargo de delegado, parecer que foi acolhido pelo ex-governador Marconi Perillo.

Além disso, Edemundo Dias, de acordo com a promotora, valeu-se do cargo de delegado-geral da Polícia Civil, autoridade a quem competia dar andamento ao procedimento no qual se averiguava a inconstitucionalidade de sua readmissão e não tomou as providências legais para que a investigação tivesse prosseguimento. Ao invés de encaminhar o procedimento para seu substituto legal ou para seu superior hierárquico, em razão de seu impedimento, encaminhou-à Procuradoria-Geral do Estado, com a sugestão de arquivamento, pela decadência, embora aquele órgão já tivesse feito vários pronunciamentos desfavoráveis a ele.

Influência
Conforme se extraiu das conversas interceptadas, aponta a promotora, Marcelo Siqueira tinha estreita relação com Carlinhos Cachoeira e, além de colocar seu cargo à disposição da organização criminosa, chegou a repassar informações privilegiadas, obtidas no exercício do cargo de procurador do Estado, de interesse da organização, especialmente com o intuito de alertar sobre ações adotadas por órgãos de segurança, o que poderia afetar interesses do grupo.

Em um dos diálogos interceptados pela Polícia Federal, Fabiana afirma que Marcelo comunica a Cachoeira a informação sigilosa, a qual teve ciência em razão de seu cargo de procurador do Estado, que o Setor de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Estado estava investigando o então corregedor-geral de Segurança Pública, Aredes Correa Pires. Este era suspeito de estar envolvido com a organização criminosa chefiada por Cachoeira.

Ronald Bicca, segundo apresentado na ação, igualmente mantinha relações estreitas com os membros da organização criminosa, evidenciados nos constantes encontros realizados além do âmbito da Procuradoria-Geral do Estado, em residências particulares, bares e restaurantes. Em diversas diálogos entre Wladimir e Cachoeira, ou entre o contraventor e Marcelo Siqueira, o nome do procurador Ronald Bicca foi reiteradamente citado.

Apurou-se ainda que, após a realização de uma operação do GT3 no Entorno do Distrito Federal, Carlinhos Cachoeira contatou Wladimir Garcêz, que intermediava os contatos da organização com agentes políticos e servidores públicos, e solicitou que verificasse recentes e futuras atuações da Polícia Civil em relação ao enfrentamento dos jogos ilegais. Para a promotora, a partir das interceptações telefônicas é possível concluir que o então delegado-geral da Polícia Civil, tendo o controle das ações policiais no combate aos jogos de azar, foi, por diversas vezes, contatado por Cachoeira e seus comandados, para obter informações privilegiadas sobre certas ações policiais.

Cachoeira
Ao analisar o conteúdo do processo, o juiz Vitor França destacou que, não sendo Carlinhos Cachoeira ocupante de cargo público, causa estranheza as conversas que manteve com representantes da Procuradoria-Geral do Estado, com ex-vereador e com ex-senador da República sobre a exoneração de Edemundo. “Essas conversas consubstanciam elementos firmes, no sentido de que pretendia valer-se de sua influência com autoridades públicas para articular o retorno deste ao cargo de delegado-geral, posto extremamente relevante para a organização criminosa que aparentemente chefiava”, concluiu o magistrado.

Pedidos
No mérito da ação é pedida a condenação de Ronald Bicca, Marcelo Siqueira, Edemundo Dias, Wladimir Garcêz e Carlos Augusto Ramos nas sanções do artigo 12, inciso III, da Lei de Improbidade Administrativa, o qual prevê perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e proibição de contratar com o poder público. De acordo com Fabiana Zamalloa, “a sanção de perda do cargo a ser imposta na sentença deverá alcançar todos os vínculos existentes entre os condenados e a administração pública, em todos os âmbitos, inclusive aqueles decorrentes de aposentadoria no cargo no qual foi praticado o ato de improbidade administrativa”. Fonte: MP-GO