A Ordem dos Advogados do Brasil — Seção Goiás (OAB-GO) desagravou publicamente um dos advogados mais conhecidos do Brasil, Heráclito Fontoura Sobral Pinto, que teve suas prerrogativas violadas há 55 anos, em Goiânia. O desagravo ocorreu nesta terça-feira (5), na entrada da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG), local onde ocorreu a prisão do advogado em 1968.
Na oportunidade, ocorreu também o descerramento da placa em homenagem a Sobral Pinto, no hall de entrada da instituição. Além disso, as homenagens se estenderam ao estudante Dirceu Borges Ramos que, em 1968, na condição de presidente do Centro Acadêmico XI de Maio, foi detido por agentes da repressão que invadiram o Casarão da Rua 20, no momento em que convocava uma manifestação estudantil em repúdio ao assassinato do estudante Edson Luís no Rio. O objetivo das homenagens foi o resgate de fatos históricos ocorridos na instituição nos seus 125 anos.
O desagravo é uma resposta à injusta violação das prerrogativas de Sobral Pinto, reconhecido por ser um defensor fervoroso da democracia e dos direitos humanos. A OAB-GO, em decisão aprovada pelo Conselho Seccional, aprovou a emissão da nota e reafirmou a luta pela valorização e proteção dos advogados e advogadas, especialmente daqueles que, ao longo da história, desempenharam um papel fundamental na busca pela justiça. Na ocasião, foram destacadas não apenas as conquistas profissionais do advogado, como também sua coragem diante das adversidades, sendo um exemplo para as gerações futuras.
Memória
Em sua fala, o presidente da OAB-GO, Rafael Lara Martins, questionou o público: “Por que a necessidade de estarmos frequentemente em defesa da advocacia? Por que desagravar um advogado que é impedido de exercer sua profissão?”. Segundo ele, a reparação de uma injúria é essencial. “Devemos trazer sempre à memória aqueles que simbolicamente representaram nossa luta constante pelas prerrogativas da advocacia. A advocacia é uma profissão verdadeiramente corajosa, nosso exercício é livre de amarras ideológicas. Somos a defesa da vida, da honra, do nome, do patrimônio e de tudo aquilo que temos o dever de proteger e cuidar. Não nos peçam silêncio jamais!”, salientou.
Ao ler a nota de desagravo, a conselheira seccional e relatora do processo, Thaís Moraes, afirmou que “esse desagravo é também uma reparação histórica para honrar o valor da advocacia para a sociedade e manutenção do Estado Democrático de Direito”. “Sobral Pinto permanece em memória, sendo citado como grande defensor dos direitos humanos e das prerrogativas da advocacia. Eternizado como o “homem que não tinha preço”, sua voz e conduta como advogado é inspiração para todos nós”, disse. Ela também agradeceu e reconheceu o trabalho do historiador Tiago Zancope, que auxiliou na recuperação de documentos históricos sobre o advogado.
O diretor da Faculdade de Direito da UFG, Prof. Dr. José Querino Tavares, destacou que o ato não apenas resgata a dignidade de Sobral Pinto, mas também reforça o compromisso da OAB e UFG com a preservação das prerrogativas da advocacia. “Esse ato é também um ato de memória. Penso que perder a memória deve ser o pior dos males do ser humano. E muitas vezes na história da humanidade, perde-se a memória de forma intencional. Ressalto que preservar a história em um ato de desagravo não resolve tudo; é preciso ir além e restaurar a memória, resgatar, reescrever a história. Esse ato é para sempre”, disse.
O coordenador do projeto Vozes Veladas da UFG, Wladimyr Camargos, relembrou a história de Sobral Pinto. “É uma honra estar aqui com a OAB desagravando esse nobre advogado. Em 14 de dezembro, completamos 55 anos da formatura que ocorreu sem o seu paraninfo, que foi injustamente apreendido em Goiânia e preso em Brasília. Que a memória de Sobral Pinto nos inspire a enfrentar os desafios atuais com a mesma tenacidade e dedicação que caracterizaram sua carreira”, disse.
Presenças
Durante o ato, estiveram presentes o presidente da OAB-GO, Rafael Lara Martins, e a secretária-geral adjunta, Fernanda Terra. Também participaram representantes da Caixa de Assistência dos Advogados de Goiás (Casag), da Escola Superior da Advocacia (ESA), e do Tribunal de Ética e Disciplina (TED), além do conselho seccional, membros de subseções e comissões.
Também estiveram presentes o desembargador do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), Adegmar José Ferreira; o procurador-geral do Estado, Rafael Arruda Oliveira; o superintendente do Iphan, Prof. Pedro Wilson; o coordenador da pós-graduação em Direitos Humanos da UFG, Heitor Pagliaro; o presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), Jales Mendonça; a presidente do Sindicato dos Docentes da UFG, Prof. Gessi Silva; o presidente da Associação de Egressos da UFG, Eliomar Pires; o coordenador do Centro Acadêmico XI de Maio, Gabriel Henrique; o presidente do IGT, Gustavo Afonso Oliveira; o coordenador do projeto Vozes Veladas pela UFG, Wladimyr Camargos; e os professores da turma de graduandos da turma de 1968, Jônathas Silva e desembargador Jamil Pereira.
História
Nascido em 5 de novembro de 1893, Heráclito Fontoura Sobral Pinto foi um dos juristas mais importantes da história do Brasil. Formou-se em Direito em 1920 na Faculdade Nacional de Direito, a atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No Brasil, participou de quase todos os eventos marcantes ao longo do século 20.
Com uma postura conservadora e anticomunista, Sobral Pinto foi injustamente detido no dia subsequente à promulgação do Ato Institucional n° 5 (AI-5). Reconhecido por sua defesa incisiva dos direitos humanos, o jurista estava se preparando para assumir o papel de paraninfo de uma turma de formandos em Goiânia, quando foi surpreendido com uma ordem de prisão por parte de quatro militares. Após recusar seguir as ordens de um general e afirmar que não os acompanharia, foi coercitivamente conduzido a uma delegacia em Brasília.