Exército deve retirar perguntas sobre identificação ideológica e religiosa do recrutamento

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O Exército Brasileiro deve retirar de seus formulários de seleção e cadastramento de militares os tópicos pertinentes à participação dos candidatos em movimentos religiosos, sociais e políticos. A decisão é do juiz federal Francisco Vieira Neto, que acolheu pedido do Ministério Público Federal de Goiás em ação civil pública.

O MPF pediu antecipação de tutela contra a União em decorrência dos resultados da apuração de prática de tortura dentro do 41º Batalhão de Infantaria Motorizada, localizado na cidade de Jataí, no sudoeste de Goiás.

A investigação que deu origem à ação teve início em outubro de 2017, a partir de representação formulada por recrutas do citado Batalhão acompanhada de material probatório (vídeos gravados dentro do quartel), com relatos de condutas de agressão física e moral praticadas por superiores hierárquicos. As torturas estariam sendo praticadas contra recrutas que se declaravam simpatizantes dos Direitos Humanos e de determinados movimentos sociais ou políticos.

Os superiores hierárquicos teriam conhecimento de tais informações, de cunho estritamente pessoal, após análise do formulário de seleção e cadastramento de militares, chamado de “Ficha de Entrevista de Conscrito”, no qual os recrutas eram obrigados a responder informações privadas relacionadas a religião e participação em movimentos sociais e políticos.

Em sua fundamentação, o juiz federal Francisco Vieira Neto considera que o questionamento oral ou por meio de formulários acerca de opção política, religiosa e sobre adesão a movimentos sociais viola o comportamento administrativo esperado e determinado constitucionalmente, uma vez que propicia que os selecionadores afastem da admissão as pessoas que não “lhes agradam” nos aspectos ideológicos, sociais ou religiosos, fazendo prevalecer a vontade privada em detrimento da vontade pública e sobrepor o interesse privado em determinada corrente de pensamento ao interesse público na admissão da pessoa mais qualificada.

A partir da decisão, o Exército deve também abster-se de incluir tópicos análogos em seus novos formulários e de promover questionamentos públicos e generalizados sobre a temática política e religiosa no âmbito do quartel. Determina-se, por fim, que adote tratamento nacionalmente uniformizado quanto à seleção de recrutas, respeitada a livre manifestação do pensamento político e religioso. Em caso de descumprimento, fica prevista multa no valor de R$ 10 mil para cada violação comprovada.

MPF investiga novos casos de tortura
No último dia 29 de abril, o MPF instaurou Inquérito Civil (IC) para investigar práticas reiteradas de tortura contra recrutas do mesmo Batalhão. Segundo o Serviço Social do Hospital das Clínicas de Jataí (GO), 11 jovens, entre 18 e 19 anos, deram entrada naquela unidade de saúde alegando fraqueza e tontura, alguns deles já com sintomas de hipotermia. Os recrutas teriam passado mal após serem submetidos a intenso treinamento físico e, em alguns casos, a agressões.

O episódio, amplamente divulgado pela mídia, segue sob investigação. O procurador da República Jorge Luiz Ribeiro de Medeiros voltou a afirmar que nenhum treinamento, por mais rígido que seja, justifica a prática de tortura. “Esperamos que o EB encerre de vez em suas dependências qualquer prática de discriminação, maus tratos ou tortura. Tais práticas são ainda mais indevidas quando pautadas sob viés político ou ideológico e, tendo por base, uma suposta ‘análise’ de informações previamente exigidas nas fichas de inscrição dos recrutas”, conclui o procurador. Com informações da Assessoria de Imprensa do MPF.