Euripedes Clementino Ribeiro Junior*
Segundo um provérbio Ioguslavo, “[…] se quiser saber como uma pessoa é, coloque-a numa posição de poder.” O referido provérbio vem a calhar em estudos consolidados da psicologia, direcionados ao que se denomina de síndrome do pequeno poder, que reflete uma atitude de autoritarismo, por meio de um sujeito que sendo detentor de um determinado poder, usa-o de maneira contundente e imperativa, não se preocupando com as consequências e problemas periféricos, pois seus atos devem ser somatizados a qualquer custo, afinal de contas, para que seguir determinações legais se eu posso fazer o que quiser, ao meu modo?!
A despeito disso, recentemente foi deflagrada pelo Detran-GO uma operação denominada de “Randandan”, visando fiscalizar e coibir o uso de escapamentos irregulares. Pois bem, a iniciativa é louvável, contudo, o ato fiscalizatório tem se mostrado absolutamente abusivo, refletindo em muitos casos em flagrante abuso de autoridade por parte dos agentes públicos, todos alinhados às determinações do presidente do Detran-GO, isso porque não estão em consonância com as normativas delineadas pela ABNT NBR 10151:2019.
A normativa em questão estabelece os procedimentos técnicos que devem ser adotados na execução de medições de níveis de pressão sonora em ambientes internos e externos às edificações. Tecnicamente, para se chegar à conclusão de que referido veículo está em desacordo com as normas vigentes é necessário a utilização de um instrumento chamado “Sonômetro”, que nada mais é do que um medidor integrador de nível de pressão sonora, que por sua vez, deve atender aos critérios da IEC61672, e mais, deve estar aprovado e calibrado conforme as IEC 60651 e IEC 60804.
Vamos além, destaca a norma técnica, dentre outras exigências, que em medições em ambientes externos, ou seja, ao ar livre, como tem ocorrido, é obrigatório o uso do protetor de vento acoplado ao microfone. Não basta o agente ligar o veículo e acelerar ao seu modo para produzir o barulho que ele busca a fim de apreender o bem, como temos visto. O microfone de medição deve ser especificado para atender à IEC61672-1 ou à IEC61094-4.
Vamos mais além, visando evitar excesso de subjetivismo por parte dos agentes públicos, o que inevitavelmente tem ocorrido, além da utilização do chamado Sonômetro, este deve estar calibrado por laboratório acreditado, membro da Rede Brasileira de Calibração – RBC ou pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia – Inmetro, ou por laboratório de calibração em outros países, acreditado por organismos signatários de acordos oficiais de reconhecimento mútuo.
Causa espanto ver que o presidente do Detran-GO, autarquia de grande importância fiscalizatória, não se preocupa em atuar tecnicamente na operação por ele deflagrada, preocupando-se mais em polemizar em suas redes sociais declarações infelizes do tipo: “Não é necessário teste de decibéis para comprovar adulteração! Aqui a gente aplica a lei, não a teoria de boteco! Escapamento adulterado é infração, e fiscalização se faz na prática! Chora menos e regulariza!”.
Ora, a não ser que se comprove que os agentes de fiscalização, bem como o próprio presidente do Detran-GO, têm a audição aferida nos moldes da ABNT NBR – sarcasmo – a teoria de boteco na qual ele se refere está mais alinhada ao justo do que os atos praticados pelos agentes em blitz, que aceleram motocicletas e veículos ao modo deles para, se acharem conveniente, apreenderem o veículo.
Certamente quando o Judiciário goiano for provocado decidirá que a “teoria de boteco” deverá prevalecer!
*Euripedes Clementino Ribeiro Junior é advogado no escritório FPTA Advocacia; mestre em Direito; docente PUC-GO; diretor do Instituto Goiano de Direito Constitucional; vice-presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-GO.