Medidas emergenciais em meio à pandemia

*Filipe Denki

As empresas brasileiras, em especial as micro, médias e pequenas empresas, já sentiram o impacto econômico causado pelo novo coronavírus. Segundo o Sebrae, em menos de dois meses, 600 mil pequenas e microempresas fecharam suas portas ao redor do Brasil, gerando 9 milhões de desempregados.

Segundo estimativa da consultoria Alvares & Marsal, uma queda de 3 a 5% do PIB pode gerar entre 2,2 mil a 2,5 pedidos de recuperação judicial em todo o país. O boletim Focus, divulgado pelo Banco Central, previu retração de 2,96% do PIB para este ano, já o Fundo Monetário Internacional projetou recuo de 5,3%.

A crise econômico-financeira causada trouxe uma preocupação especial com as empresas, com o sistema de insolvência empresarial e com a judicialização dos conflitos deles decorrentes.

Pensando nisso, foram apresentados diversos projetos de leis com medidas emergenciais transitórias para o regime de recuperação das empresas e falência em razão da crise do coronavírus. Aqui, destaco o PL 1.397/20, apresentado pelo deputado Hugo Leal (PSD/RJ), e o PL 2.373/2020, apresentado pelo senador Rodrigo Cunha (PSDB/AL).

Os dois projetos, em seu caráter extraordinário, instituem medidas destinadas a prevenir a crise econômico-financeira. No caso do primeiro, do agente econômico e, no segundo, do empresário ou sociedade empresária. Tratam-se de propostas que estabelecem um regime jurídico emergencial e transitório da Lei nº 11.101/05, decorrentes do período excepcional de calamidade pública causada pela pandemia.

Ambos apresentam disposições que preveem a suspensão por 120 dias de todas as obrigações estabelecidas em planos de recuperação judicial ou extrajudicial já homologados; a possibilidade das empresas em recuperação judicial apresentarem aditivo ao plano já homologado, inclusive para sujeitar créditos constituídos após o pedido de recuperação judicial ou extrajudicial, que deverá ser aprovado em assembleia de credores.

O PL 1.397/20 prevê uma suspensão legal de 60 dias e um procedimento de jurisdição voluntária denominada negociação preventiva para aquele agente econômico que comprovar redução igual ou superior a 30% de seu faturamento comparado a média do último trimestre correspondente de atividade no exercício anterior.

Na negociação preventiva, o agente econômico terá o prazo de 60 dias para renegociar suas dívidas, período em que quaisquer atos de constrição, rescisão unilateral de contratos bilaterais, decretação de falência, despejo por falta de pagamento, entre outros atos decorrentes de cobrança extrajudicial e judicial de dívidas, ficam suspensas.

Já o PL 2.373/2020 prevê a criação para microempresas e empresas de pequeno porte de um regime especial de recuperação extrajudicial, por meio de registro de Declaração de Impacto Econômico da Pandemia, para que tais devedores consigam repactuar suas dívidas.

O procedimento consiste no registro de uma declaração na junta comercial, por parte do micro e pequeno empresário, contendo a indicação de todas as dívidas cíveis ou comerciais vencidas no período da crise e que o devedor não tem condições de pagar. Com o registro dessa declaração na junta comercial, as dívidas ali indicadas terão seus vencimentos automaticamente prorrogados por 150 dias.

O micro e pequeno empresário fará jus a descontos caso pague antecipadamente as dívidas objeto da declaração. Quanto mais cedo pagar, maior será́ o desconto. Caso o devedor não pague a dívida, seu valor será́ acrescido de multa de 20%. Para fazer jus a esse benefício, o micro e pequeno empresário renuncia ao direito de discutir judicialmente a exigibilidade das dívidas inseridas na declaração.

Por fim destaco que esse último projeto de lei cria um procedimento especial temporário para a recuperação extrajudicial, no qual o devedor, havendo impasse com os credores na aprovação do plano de recuperação extrajudicial, poderá́ ajuizar pedido de recuperação extrajudicial.

Para isso, basta aditar, à petição inicial, a minuta de sua proposta a ser apresentada aos credores e a comprovação da anuência de credores que representem pelo menos 1/4 de todos os créditos, de cada espécie ou classe, por ele abrangidos, estando homologados o plano que obtiver anuência da maioria simples dos credores, de mesma classe ou espécie de créditos, que participarem da assembleia.

Se o quórum de anuência não for obtido, poderá o devedor aditar o pedido com objetivo de requerer recuperação judicial, observadas, no caso, as exigências do art. 51 da Lei nº 11.101, de 2005, sob pena de extinção do processo.

Os referidos projetos de leis terão vigência até́ o dia 31 de dezembro deste ano ou enquanto estiver vigente o Decreto Legislativo nº 6, de março deste ano, que reconheceu o estado de calamidade pública em razão da pandemia causada pela Covid-19.

Os projetos de lei foram uma das maneiras encontradas para tentar minimizar os impactos do coronavírus nos agentes econômicos, empresários e sociedades empresárias, dando uma atenção ao micro e pequeno empresário. Eles fomentam a mediação, a renegociação preventiva e a recuperação extrajudicial, desafogando o Judiciário. Além disso, são uma ferramenta jurídica salutar para o aquecimento e recomposição da economia, que contribuirá para a manutenção dos empregos e das atividades comerciais em tempos de calamidade pública.

Permanece, ainda, a urgência na apreciação do texto substitutivo ao PL 6.229/2005, que altera atual lei de falência e recuperação de empresas, a qual continuará trazendo a atualização legislativa necessária para o tratamento da crise da empresa e do empresário.

*Filipe Denki é advogado especialista em Direito Empresarial