A sustentação oral nos tribunais

Marcelo Bareato* 

Para além do trabalho bem feito de um advogado zeloso para com os seus deveres e clientes, atualmente, não basta ter um recurso bem estruturado e uma ação constitutiva que esteja em conformidade com a lei e a Constituição Federal. É crucial que o advogado também leve em consideração os aspectos sensíveis e internos do tribunal em que vai atuar, se deseja obter sucesso em seu trabalho.

Infelizmente, é comum nos depararmos com magistrados que decidem sobre algo sem terem tido acesso ao recurso ou à ação constitutiva. Muitas vezes, votos elaborados por estagiários ou assessores são assinados digitalmente por seus superiores e apenas lidos durante as sessões de julgamento em todo o país.

Diante desse novo e delicado sistema de julgamento, é cada vez mais importante que o advogado esteja presente e destaque os pontos necessários para chamar a atenção do julgador à seriedade de seu trabalho e para as falhas que foram validadas pela esfera de conhecimento.

Nesse sentido, ao fazer a sustentação oral, o advogado empresta credibilidade ao mostrar que o julgamento do recurso ou da ação constitutiva não é meramente protelatório, mas sim respaldado pela legislação e jurisprudência produzida pelos próprios tribunais. Essa sustentação é o prelúdio para um pedido de vistas, a fim de possibilitar uma reanálise e a provável adesão à tese defensiva.

No entanto, é importante ressaltar que sustentar os argumentos oralmente em um recurso requer preparo e atenção a pontos primordiais. Por exemplo, é necessário compreender que a fala não permite resumir todo o processo, pois essa é a responsabilidade de quem relata. A sustentação deve focar em pontos sensíveis da defesa e demonstrar que o que está sendo discutido está em conformidade com os entendimentos da turma ou câmara em que o recurso será apreciado, assim como com as demais turmas e câmaras do tribunal, além de seguir os entendimentos dos Tribunais Superiores. Além disso, é essencial utilizar apenas o tempo necessário para a fala, que frequentemente é menor do que o tempo disponibilizado para o advogado. Fala bem quem fala pouco e não cansa os ouvintes com ideias inatas.

Trabalhar na esfera recursal exige dedicação e pesquisa sobre o tribunal em que o expediente foi protocolado, além de atenção aos próximos passos caso seja necessário continuar recorrendo, inclusive com possíveis Habeas Corpus ou recursos especiais e extraordinários.

A postura, a fala direta e clara e o conhecimento sobre a matéria são requisitos indispensáveis, pois a sustentação oral não permite o uso de cola ou a leitura de papéis utilizados como rascunhos de última hora.

Não é por menos que a sustentação oral está intimamente ligada aos pilares constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da indispensabilidade do advogado no momento de se fazer justiça e, até por isso, foi objeto de recente alteração no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil que, reconhecendo a importância e necessidade de disciplinar a matéria, passou por alterações em 2022, com a entrada em vigor da Lei n.º 14.365, que atualizou a Lei n.º 8.906/1994. A nova redação do Estatuto da Advocacia deixa claro, em seu artigo 7.º, que o uso da expressão “pela ordem” pode e deve ser manejado em qualquer tribunal judicial ou administrativo, nos órgãos de deliberação coletiva da administração pública ou nas comissões parlamentares de inquérito. Essa expressão (pela ordem) é utilizada para esclarecer equívocos ou dirimir dúvidas em relação a fatos, documentos ou afirmações descabidas que possam influenciar na decisão do julgador; vejamos:

Art. 7º São direitos do advogado:

(…)

X – usar da palavra, pela ordem, em qualquer tribunal judicial ou administrativo, órgão de deliberação coletiva da administração pública ou comissão parlamentar de inquérito, mediante intervenção pontual e sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, a documentos ou a afirmações que influam na decisão;      (Redação dada pela Lei nº 14.365, de 2022);

(…)

  • 2º-B. Poderá o advogado realizar a sustentação oral no recurso interposto contra a decisão monocrática de relator que julgar o mérito ou não conhecer dos seguintes recursos ou ações:      (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

I – recurso de apelação;      (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

II – recurso ordinário;       (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

III – recurso especial;       (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

IV – recurso extraordinário;       (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

V – embargos de divergência;      (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)

VI – ação rescisória, mandado de segurança, reclamação, habeas corpus e outras ações de competência originária.      (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) 

Assim, para além da discussão travada no Supremo Tribunal Federal, que limita nossas prerrogativas, é importante ressaltar que nenhum Regimento Interno, resolução ou repetição de decisões que violem os direitos e garantias estabelecidos pelo Estatuto da Advocacia serão tolerados. Tais manifestações, inconstitucionais em toda a sua amplitude, não têm o poder de anular uma legislação federal, como é o caso do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. Aliás, essa questão já está sendo abordada por uma PEC apresentada pela OAB Nacional junto ao Congresso Nacional, no intuito de acabar de vez com os abusos daqueles que se consideram acima da justiça e tentam silenciar o direito de defesa.

Portanto, meu Caro Leitor, reforçando a importância de se fazer presente nos tribunais para dar voz aqueles que dela necessitam, a sustentação oral nunca foi tão crucial. Esteja preparado para o trabalho que lhe foi confiado. Lembre-se de que somos a última linha de defesa entre os direitos garantidos pela legislação e a injustiça daqueles que tentam ignorá-los. A advocacia merece respeito, mas também precisa estar organizada para enfrentar os desafios, a fim de retomar o lugar de destaque que sempre lhe pertenceu. Em suma, enquanto alguns aplicam a lei (juízes) e outros têm a responsabilidade de fiscalizá-la (promotores), nós somos os guardiões da cidadania, com a responsabilidade de preservar a democracia e facilitar os diálogos.

*Marcelo Bareato é advogado criminalista com ênfase no Direito Penal Econômico, doutorando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá/RJ, ocupa a cadeira de n.º 21 na Academia Goiana de Direito, professor de Direito Penal, Processo Penal, Legislação Penal Especial e Execução Penal na PUC/GO, Conselheiro Nacional da ABRACRIM, Presidente do Conselho de Comunidade na Execução Penal de Goiânia/GO, membro da Coordenação de Política Penitenciária  da OAB/Nacional gestão (2022/2025), Coordenador da subcomissão de Direitos Humanos para o Sistema Prisional  da OAB/Goiás (gestão 2022/2024) e Coordenador da Comissão Interestadual de Acompanhamento da Saúde no Sistema Prisional junto ao Conselho Municipal de Saúde de Aparecida de Goiânia/GO, Membro do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura/GO, Membro do FOCCO – Fórum Permanente de Combate à Corrupção do Estado de Goiás, entre outros (ver currículo lattes http://lattes.cnpq.br/1341521228954735).