É legítimo utilizar meios moderados para proteção do patrimônio, entende juíza

Juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal

É legítima a reação da vítima que, na defesa de seu patrimônio, usa moderadamente dos meios que dispõe, para evitar a subtração de objetos de sua propriedade. Com esse entendimento, a juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, desacolheu tese apresentada pela Defensoria Pública de Goiás em sentença que condenou um réu por furto a residência. A alegação foi a de que o acusado foi torturado pela vítima de furto e por populares. A magistrada, porém, observou que não há nos autos nenhuma prova nesse sentido.

O acusado foi condenado a pena de 2 anos e 9 meses de reclusão, no regime semiaberto, pois é reincidente. A Defensoria Pública recorreu da sentença. O recurso foi recebido e a questão será objeto de apreciação pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO). O réu confessou a autoria do furto, mas, de modo um pouco diferente, alegou que a vítima chegou de carro e o atropelou, fazendo com que ele caísse e fosse agredido por populares.

A vítima relata que, na ocasião do delito, o acusado estava saindo da residência, quando chegou de carro e o viu, levando consigo uma televisão de 32 polegadas e outros objetos de sua propriedade – como ferro de passar roupa, aparelho de som, dois celulares, e máquina fotográfica. O proprietário da casa, que já foi vítima de furto três vezes, disse que desceu do veículo correndo e que apenas deu “um calço” no réu, e fez com que ele caísse no chão, quebrando a televisão. Posteriormente, populares agrediram o acusado, porque ele já havia praticado outros furtos em casas da região.

A Defensoria Pública de Goiás sustentou que o réu foi torturado pelo ofendido e requereu a nulidade do processo e a absolvição, sustentando que o crime praticado pela vítima foi mais grave que o cometido pelo réu. Ao analisar o caso, porém, a magistrada observou que não há nos autos nenhuma prova da alegada “tortura”, muito embora o Defensor Público, presente na audiência, tenha tentado extrair essa informação durante a oitiva do ofendido.

“Tendo este sido categórico em declarar que apenas “calçou” o réu quando o flagrou saindo de sua residência na posse de parte da res furtiva, ocasião em que o imputado caiu jogando a televisão na rua, quebrando-a, e foi agredido por populares (que se aglomeraram no local)”, disse a magistrada.

A declaração do ofendido, segundo ressalta a magistrada, encontra respaldo em todos os elementos de prova, inclusive nos depoimentos dos policiais militares que foram inquiridos. O réu, de modo diverso, declarou apenas que o ofendido o atropelou com seu veículo e após foi agredido por populares.  As lesões não foram graves, apenas algumas escoriações e equimoses. A única prova existente nos autos é de que populares agrediram o réu, contudo estes não foram identificados.

A magistrada enfatizou que a alegação da Defensoria Pública de que o acusado foi agredido, ainda que fosse comprovada, não seria capaz de isentá-lo de responsabilidade pela prática do crime de furto relatado na denúncia. Ainda mais, segundo diz, que foi legítima a ação do ofendido, vez que, conforme se infere, se utilizou dos meios moderados que tinha a sua disposição para proteger direito próprio, no caso, seu patrimônio. Placidina Pires pontuou que, “somente a tortura praticada com a finalidade de obter a confissão do agente por crime por ele não cometido é que compromete a validade da prova produzida”.

“Assim, não havendo provas de que o acusado tenha sido torturado a fim de confessar crime que não praticou, ao contrário, havendo provas robustas, inclusive sua confissão em juízo, de que perpetrou a infração penal, rechaço a tese defensiva de nulidade do processo, sob alegação de tortura do acusado, consequentemente o pleito absolutório formulado pela defesa técnica”, completa.