Condomínio só pode restringir uso de área comum durante pandemia após estudo técnico e deliberação da assembleia de moradores

Marília Costa e Silva

Os condomínios horizontais podem restringir o uso de áreas comuns durante a pandemia do novo coronavírus? As discussões internas entre os moradores chegou na Justiça. Um morador do Jardins Atenas, em Goiânia, por exemplo acionou o Judiciário alegando que a administração do condomínio, de forma desrazoada, determinou o fechamento de todas as áreas comuns do condomínio, incluindo, entre elas, as quadras de tênis após receber uma notificação/orientação da fiscalização do Município de Goiânia.

Inconformado com a medida, o morador requereu, em sede de tutela de urgência, que fosse determinado à administração que proceda a recolocação das redes e a liberação das quadras de tênis, observada apenas a proibição de aglomeração e as quadras serem limitadas a jogos de simples (um contra um) e as aulas individuais de tênis. Ao analisar o caso, o juiz da 11ª Vara Cível de Goiânia, Jeronymo Pedro Villas Boas, deu prazo de 20 dias para que a associação do condomínio apresente estudo feito por especialista na área epidemiológica e submeta a proposta de interdição da quadra de tênis à deliberação dos proprietários de imóveis por meio virtual sob pena de multa diária de R$ 2,5 mil.

Direito de uso

Para o magistrado, as normas civis garantem ao proprietário o direito de usar, gozar, dispor do bem, observadas as finalidades sociais e econômicas da propriedade e sem prejudicar indevidamente terceiros, direito que se estende ao uso de áreas destinadas ao lazer ou prática de esportes. “Ora, a plena utilização pelo condômino de área comum e seus pertences decorre do texto da lei, bastando conferir o inciso II do artigo 1.335, do Código Civil, disposição essa regularmente repetida nas convenções de condomínio. Assim, eventuais proibições do uso de tais áreas e equipamentos que não decorra de abuso do usuário implicam em restrição excepcional ao direito de propriedade”, frisou.

Além disso, o juiz ponderou que como o condômino, através de suas contribuições, mantém tais áreas comuns, ao ser impedido de utilizá-las, mesmo pela administração do ente comunitário, essa proibição fere o direito constitucional de propriedade, com potencialidade de lesão ao direito fundamental. Apesar disso, para Villas Boas, quando tal proibição decorre de ato que abrange todos os condôminos, por razões sanitárias, tal restrição deve observar a razoabilidade da medida, e não pura e simplesmente se basear em normas sanitárias expedidas pelo Poder Público, que somente pode interferir no direito de propriedade em casos extremos e mediante justa e prévia indenização.

Nessa linha, segundo o juiz, mesmo com amparo em decreto municipal que disciplina as medidas sanitárias para prevenção do contágio da Covid-19, os condomínios horizontais, em regra, não podem proibir o uso das áreas esportivas sem que se averigue previamente e de forma concreta a potencialidade do risco à saúde, que tal atividade possa expor os proprietários e terceiros. “A interdição, pura e simples, de quadra esportiva, em cuja prática não há contato direto e próximo dos participantes do esporte, sem que se demonstre que a atividade esportiva coloque em risco a saúde, não guarda base legal e suficiente para se limitar o uso da propriedade”, aponta na decisão.

Villas Boas também afirma que somente se justifica a proibição de atividades físicas e prática de esportes, sem contato físico, em áreas comuns do condomínio, no caso de demonstração científica da potencialidade de risco à saúde dos participantes e de terceiros. “Tal proibição de uso da propriedade comum deve ser antecedida de estudo técnico específico e deliberação da assembleia condominial, considerando que a propriedade de cada um dos condôminos será afetada com a medida”, frisou.

Processo 5269603.14.2020.8.09.0051