Ao menos 90 prisões injustas ocorreram por falhas em reconhecimento dos autores dos crimes, aponta pesquisa do Condege

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Levantamento realizado pelo Colégio Nacional dos Defensores Públicos Gerais (Condege), em conjunto com a Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), identificou a ocorrência de ao menos 90 prisões injustas ocasionadas por falhas no reconhecimento fotográfico em delegacias de todo o País. Apresentados em um relatório publicado em fevereiro deste ano, os casos ocorreram entre 2012 e 2020 e envolvem principalmente pessoas negras. Em Goiás, a Defensoria Pública acompanhou e obteve a absolvição de duas pessoas em processos do tipo, em que ambas foram erroneamente identificados como suspeitas de crimes ocorridos no ano passado.

No último mês de novembro, a DPE-GO obteve sentença que absolveu um jovem de 21 anos da acusação de roubo de veículo ocorrido em Aparecida de Goiânia. Ele havia sido apontado como um dos autores do crime, cometido contra um motorista de transporte por aplicativo em abril de 2020. Segundo os registros do processo, o reconhecimento fotográfico foi realizado pela vítima em sede policial, mediante a apresentação de fotografias que não foram juntadas aos autos. Em maio, a prisão preventiva do assistido foi decretada.

O rapaz permaneceu detido por dois meses, até a revogação de sua prisão preventiva, em julho, e foi inocentado em 24 de novembro. Para o defensor público Gabriel Vieira Berla, titular da 2ª Defensoria Pública Especializada Criminal de Aparecida de Goiânia, que acompanhou o caso, os indícios de autoria se mostraram frágeis no decorrer do processo e um fator específico contribuiu para a comprovação da inocência: o jovem é cadeirante, não tendo condições de cometer o crime da forma como sua suposta participação foi descrita.

“O fato de ele ser cadeirante comprovou o erro no reconhecimento feito pela vítima, que diante do promotor afirmou não ser mais capaz de afirmar, com 100% de certeza, que se tratava daquela pessoa. Se ele não fosse cadeirante, certamente teria respondido ao processo preso e, muito provavelmente, seria condenado”, diz Gabriel Berla. “É um problema grave.”

Goiânia

Um registro de falha de reconhecimento ocorreu também na capital goiana, em 2020. Em setembro, a Defensoria Pública obteve a absolvição de um jovem de 23 anos, que permaneceu preso durante quase seis meses após ser apontado como o autor do roubo de um veículo. Ele foi apontado pela autoridade policial como suspeito do crime em razão de ter estado no local do ocorrido na data e no horário investigados e por supostamente possuir as mesmas características físicas descritas pelas duas vítimas. Em audiência, no entanto, o reconhecimento não foi confirmado por elas.

Para o defensor público Leonardo César Luiz Stutz, titular da 1ª Defensoria Pública Especializada Criminal da Capital, o caso é emblemático, pois demonstra que a investigação foi direcionada para a incriminação, uma vez que o assistido possuía condenação anterior por outro fato. “Pode-se ainda perceber que as vítimas possuíam ideias preconcebidas acerca da autoria, possivelmente fomentadas pelos policiais”, diz ele. As fotografias que teriam sido apresentadas às vítimas não foram devidamente juntadas aos autos, destaca ele.

Na sentença, o Poder Judiciário considerou não haver provas conclusivas acerca da autoria do crime, uma vez que as vítimas “foram uníssonas em dizer que não podem apontar o acusado como sendo o autor do roubo”. Fonte: DPE-GO