Sogra que chamou nora de “preta fedida” e a estapeou é condenada por injúria racial e tem de indenizar a vítima

Publicidade

Uma mulher de 84 anos foi condenada pela Justiça goiana pela prática do crime de injúria racial. O crime aconteceu no município de Heitoraí, distrito judiciário da comarca de Itapuranga, e a sentença é da juíza Erika Barbosa Gomes Cavalcante, da 2ª Vara das Fazendas Públicas, Criminal, Execução Penal e Juizado Especial Criminal.

A idosa foi condenada a um ano e quatro meses de reclusão e a 13 dias-multa; um mês de detenção; e 25 dias de prisão simples. O regime inicial de cumprimento de pena será aberto. Ela também deverá pagar o montante de R$ 10.000,00 a cada uma das vítimas, a título de reparação pelos danos morais causados.

De acordo com a magistrada, a idosa, com a nítida intenção de injuriar pessoa certa e determinada, utilizou elementos atinentes à cor da pele da vítima ao proferir os seguintes dizeres: “Sua preta fedida, preta ladrona!”. Além da injúria racial, no mesmo ato, a ré praticou contravenção penal de vias de fato ao desferir tapas, por duas vezes, contra vítimas diferentes, e ainda cometeu o delito de ameaça. A vítima, tanto das vias de fato quanto da injúria racial e da ameaça, é nora da idosa há mais de 26 anos. Segundo consta nos autos, a nora da idosa sempre sofreu agressões verbais calcadas em características fenotípicas ditas pejorativamente como forma de desprezo e discriminação. Já a outra vítima agredida com um tapa no rosto é neto da idosa.

Os depoimentos e os atos praticados pela ré demonstram que a idosa nunca aceitou o casamento do filho com uma mulher negra e sempre desrespeitou, agrediu verbalmente e injuriou a nora, bem como o neto, recorrendo-se a características fenotípicas das vítimas. A magistrada reforça que apesar dos informantes de acusação alegarem que a ré nunca foi adepta ou compactou com condutas racistas, “o conjunto de provas inserido nos autos assenta que as falas da idosa almejavam, ao menos na ocasião, ofender a honra subjetiva da nora, mulher negra que, conforme destaca a filósofa Djamila Ribeiro (2019), já ocupa, infelizmente, lugar subalternizado em uma sociedade visivelmente racista e machista, pois é a antítese da masculinidade e da branquitude.”

Estereótipos e preconceitos

Para a juíza Erika Barbosa Gomes Cavalcante, o discurso da ré, ao proferir a frase mencionada, “ressalta que a parte se valeu de estereótipos e preconceitos concebidos no seio de uma sociedade colonial, ainda marcada pela desumanização de todos que destoam do padrão eurocêntrico e que, incansavelmente, busca invocar e reavivar a ideia de inferiorização e opressão de povos historicamente atacados, discriminados, silenciados e coisificados.”

Na decisão, a magistrada também pontua que “não se mostra factível amparar, justificar ou amenizar a prática de tamanha atrocidade no quesito velhice ou na criação familiar a que a acusada foi submetida, uma vez que verificada a higidez mental, o envelhecimento e os costumes particulares de cada indivíduo não chancelam a execução de qualquer crime, inclusive os de cunho racial, até porque, em decorrência da latente mazela do racismo, esses últimos devem, ainda mais, serem veementemente repudiados e censurados.” Fonte: TJGO