Conquistas jurídicas das mulheres no Brasil

No dia 08 de março, foi comemorado o Dia Internacional da Mulher. Por isso, convidei, esta semana, a advogada baiana Joana Rodrigues para escrever sobre o Direito do Trabalho e os eventuais avanços e retrocessos em relação às conquistas jurídicas já alcançadas pelas mulheres ao longo das últimas décadas no Brasil.

Joana  é mestre em Políticas Sociais e Cidadania pela Universidade Católica do Salvador, na linha Trabalho e Questão Social. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pelo JusPodivm/Faculdade Baiana de Direito (2012). Pós Graduanda em Direito do Trabalho e Compliance pelo IEPREV. Professora de Direito Material e Processual do Trabalho na Universidade Católica de Salvador. Professora convidada da ESA, Escola Superior da Advocacia. Conselheira e presidente da Comissão Especial de Apoio aos Professores da Seccional da OAB/Ba. Conselheira da ABAT (Associação Baiana de Advogados Trabalhistas) Advogada trabalhista.

Leia a íntegra do texto:

Joana Rodrigues

No dia 08 de março, foi celebrado em todo o mundo o Dia Internacional da Mulher. A origem desta data está repleta de controvérsias. Alguns associam o surgimento do Dia Internacional da Mulher com a greve das mulheres que trabalhavam em Nova York na Triangle Shirtwaist Company e, consequentemente, ao incêndio que ocorreu em 1911 que vitimou 130 mulheres que morreram carbonizados.

Já outros, indicam que ela surgiu na Revolução Russa de 1917, a qual esteve marcada por diversas manifestações e reivindicações por parte das mulheres operárias. No dia 08 de março de 1917 cerca de 90 mil operárias russas percorreram as ruas reivindicando melhores condições de trabalho e de vida, ao mesmo tempo que se manifestavam contra as ações do Czar Nicolau II.

Porém, embora existam diferentes versões sobre a origem da data, ambos os movimentos tinham o objetivo de alertar sobre o estado insalubre de trabalho que as mulheres estavam sujeitas e se caracterizavam como movimentos políticos de defesa de seus direitos humanos e trabalhistas. Sendo assim, refletir sobre essa data histórica, a partir do campo teórico do Direito do Trabalho e dos eventuais avanços e retrocessos em relação às conquistas jurídicas já alcançadas pelas mulheres ao longo das últimas décadas no Brasil passa a ser essencial.

Tratando-se de uma abordagem sucinta, este artigo discorrerá sobre apenas alguns desses direitos e tomará como referencial dois marcadores importantes; a Constitucionalização do direitos fundamentais sociais do trabalho, no que toca o direito das mulheres e bem assim os direitos das mulheres gestantes conforme a norma Consolidada e o Atos das Disposições Transitórias e alguns direitos infraconstitucionais regulamentados por lei que visam a proteção da mulher no mercado de trabalho.

A Constituição Federal de 1988, em consonância com o princípio fundamental da Isonomia, dispôs em seu artigo 5, inciso I, que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Entretanto, muito embora se estabeleça que todos são iguais perante a lei numa perspectiva formal, infere-se da própria Magna Carta que os direitos e deveres das mulheres tem sido destacados de forma distinta frente aos dos homens, sendo indubitavelmente esse o viés material do princípio da igualdade, ao tratar desigualmente os desiguais nas medida das suas desigualdades.

Já no rol dos direitos sociais trabalhistas, no seu artigo 7, inciso XX, regulamentado pela lei 9.799, se estabeleceu a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante inventivos específicos. No seu inciso XXX, regulamentado pela lei 9.029, restou consignado a proibição da diferença de salários, de exercício de funções e de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

A despeito dessa densidade normativa constitucional e de ter a Constituição de 1988 mudou todo o tratamento jurídico dispensado às mulheres, visto que buscou-se a superação de um paradigma jurídico que legitimava declaradamente a organização patriarcal e a consequente preferência do homem ante a mulher. Christiane Lope (2006 p. 407) afirma que essa ruptura acaba possibilitando o engendramento de um novo aparto jurídico de valores, de uma nova estrutura que dê coerência ao ordenamento jurídico.

A consolidação das Leis do trabalho também apresenta direitos, em forma de proteção, de forma especial, à condição da maternidade: Licença maternidade, direito à amamentação, direito de mudar de função ou setor de acordo com estado de saúde bem assim, a proibição da mulher gestante de laborar em local insalubre.

Em relação ao direito das gestantes, cumpre notas também as importantes garantias previstas no Ato das Disposições Transitórias (ADCT), onde se normatiza a garantia provisória de emprego, que veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto (artigo 10,II, b).

Ainda do ponto de vista infraconstitucional, a proteção aos direitos trabalhistas das mulheres encontra abrigo em diversas disposições legais. Não podendo deixar de referenciar aqui, às disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho.

Nesse contexto cumpre observa as ressalvas feitas através do art. 373-A da CLT, é vedado: I – publica ou fazer publicar anúncio de emprego no qual haja referência ao sexo, à idade, à cor ou situação familiar, salvo quando a natureza da atividade a ser exercida, pública e notoriamente, assim o exigir; II – recusar emprego, promoção ou motivar a dispensa do trabalho em razão do sexo, idade, cor situação familiar ou estado de gravidez, salvo quando a natureza da atividade seja notória e publicamente incompatível, III – considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como varável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidade de ascensão profissional; IV – exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego; V – impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez; VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.

Entretanto, a despeito de todo aparato normativo constitucional, imbuído de realizar o processo de adaptação das regras jurídicas aos novos princípios então vigente, e bem do bem assim da relativamente extensa legislação especificamente direcionada à mulheres através de diversos instrumentos jurídicos infraconstitucionais sabe-se que na prática, a mulheres ainda hoje sofrem com a falta de efetividade de seus direitos.

Embora no nosso ordenamento jurídico, o Direito do trabalho se ocupe da regulação das relações privadas de trabalho na busca de Justiça – de equilibrar as relações, de produzir justiça e igualdade, a concretização desse escopo fica prejudicada frente a uma abordagem legal, em especial pelos operadores do direto, distanciada da perspectiva de gênero e desarticulada da realidade concreta à qual estão sujeitas essas mulheres no país.

Sabe-se que esses são caminhos longos e que as disputas ainda estão em curso, mas todo começo demanda esforço e as novas bases de sociabilidade estão sendo construídas, começando pelo questionamento de que era tido como posto, pelas novas vozes que surgem das diversidades femininas, pela exteriorização de um direito pautado no reconhecimento à diferença, pela expressão do desejo e lutas por efetivação e sobretudo pelo fortalecimento da relação dialética entre as condições materiais de produção e as ideologias, atitudes, valores e políticas que permitam às mulheres o exercício de suas atividades laborativas em condições mais equitativas com os homens.