Em meio às críticas pelas mudanças feitas no projeto das 10 medidas do Ministério Público, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciou a criação de uma comissão para tratar sobre o aborto. O anúncio ocorre no dia seguinte à decisão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que entendeu não haver crime em interrupções de gestação até o terceiro mês de gravidez.
“Sempre que o Supremo legislar, nós vamos deliberar sobre o assunto”, disse Maia. Segundo o site da Câmara dos Deputados, a comissão anunciada discutirá uma proposta sobre licença-maternidade, mas também pode tornar mais rígida a legislação sobre interrupção de gravidez.
Os integrantes da comissão ainda não foram definidos, mas Rodrigo Maia já pediu aos líderes dos partidos que indiquem os parlamentares. Os deputados federais discutirão a Proposta de Emenda à Constituição 58/11, do deputado Dr. Jorge Silva (PHS-ES), que amplia o período de licença-maternidade para compensar a quantidade de dias que o recém-nascido passar internado em razão de nascimento prematuro.
Meu reino
O presidente da Câmara deixou claro que a comissão é uma resposta à decisão do STF, que, segundo ele, legislou sobre o tema, o que seria competência da Casa presidida por ele. “Tenho discutido com muitos líderes que, às vezes, o Supremo legisla. Entendemos que isso aconteceu ontem e minha posição, discutindo com líderes, é que toda vez que entendemos que isso acontece nossa obrigação é responder, por que há uma interferência do Poder Legislativo.”
“A criação da comissão especial é uma resposta dizendo: entendemos que há uma prerrogativa que foi usurpada da Câmara, do Congresso, e vamos cumprir nosso papel. Se entendemos que houve uma interferência no Congresso Nacional nosso papel é legislar, seja ratificando ou retificando a decisão do Supremo”, completou Maia.
O líder do PV, deputado Evandro Gussi (SP), afirmou que a decisão do STF revoga o Código Penal, que só admite a interrupção da gravidez em caso de estupro e para salvar a vida da mãe. “Revogar o Código Penal, como foi feito, é verdade, num caso concreto, trata-se de um grande atentado ao Estado de Direito. O aborto é um crime abominável porque ceifa a vida de um inocente”, disse.
O deputado Edmar Arruda (PSD-PR) usou a religião como argumento para condenar a decisão do STF, apesar de o estado brasileiro ser laico. “Nós, que somos cristãos, nós que defendemos a família, nós que defendemos a vida, nós não concordamos com essa decisão.”
Controle sobre o corpo
Nesta terça-feira (29/11), a 1ª Turma do STF entendeu não ser crime de aborto se a gravidez for interrompida antes de completados três meses de gestação. A decisão foi tomada a partir do voto do ministro Luis Roberto Barroso. No caso, duas pessoas foram presas acusadas de manter uma clínica de aborto no Rio de Janeiro.
Para Barroso, a proibição ao aborto é clara no Código Penal brasileiro, mas deve ser relativizada pelo contexto social e pelas nuances de cada caso. Disse ainda que a criminalização do aborto fere diversos direitos fundamentais, entre eles, os sexuais e reprodutivos da mulher, “que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada”.
A criminalização, destacou Barroso, viola o princípio da proporcionalidade por não proteger devidamente a vida do feto ou impactar o número de abortos praticados no país. “Apenas impedindo que sejam feitos de modo seguro”, disse. “A medida é desproporcional em sentido estrito, por gerar custos sociais (problemas de saúde pública e mortes) superiores aos seus benefícios.”
O ministro também ressaltou que a criminalização penaliza mais as mulheres mais pobres. “É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbitos.” Com informações das agências Câmara e Brasil.