Por falta de previsão em lei, juiz anula oitivas de testemunhas por meio eletrônico em PAD

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O juiz da 8ª Vara Federal de Goiânia, Urbano Leal Berquó Neto, confirmou liminar em mandado de segurança e anulou o ato que determinou oitivas de testemunhas via Google Meet em um Processo Administrativo Disciplinar.

De acordo com a decisão, permitir as oitivas de testemunhas por meio de videoconferência no procedimento administrativo seria uma afronta ao princípio constitucional da legalidade e à vontade do Estado, já que não há lei que preveja o uso desse meio eletrônico.

Conforme consta no processo, o servidor público está sendo investigado nos autos de um processo administrativo disciplinar (PAD), em trâmite no IFG – Instituto Federal de Goiás. Em 31 de julho passado, a Comissão do PAD se reuniu e determinou a oitiva de testemunha por meio de videoconferência, através do sistema Google Meet, para o dia 14 de agosto, com base nas IN’s 09/2020 e 05/2020, que alteraram a IN 12/2011, que trata da regulamentação da adoção de videoconferência nos procedimentos disciplinares no âmbito do Executivo Federal.

No pedido liminar, considerando a proximidade da data que seria ouvida a testemunha, o juiz determinou a suspensão de todos os atos do PAD até o conhecimento do pedido de segurança provisória, abrindo espaço para o Instituto Federal e o Ministério Público Federal se manifestarem sobre a situação.

Em seus argumentos, o presidente do Processo Administrativo Disciplinar alegou que “a legalidade para a execução da coleta de provas testemunhais via videoconferência, a exemplo dos Código de Processo Penal e de Processo Civil e dos princípios constitucionais da legalidade, art. 5º, II, da CF; da eficiência, art. 37 da CF; da razoabilidade, art. 2º, parágrafo único, VI, da Lei nº 9784/99; e do formalismo moderado, art. 2º, parágrafo único, VIII e IX, da Lei nº 9784/99, valendo-se, ainda, do Manual de Processo Disciplinar expedido pela Controladoria Geral da União (2019)”.

Já o Ministério Público Federal defendeu a denegação do writ sob os argumentos de que, no âmbito penal, a Lei n. 11.900/09 alterou dispositivos do Código de Processo Penal para prever a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência; já na área cível, em 2015, o Código de Processo Civil elencou diversas hipóteses de utilização do referido recurso tecnológico (artigos 236, 385, 453, 461 e 937), incluindo depoimentos das partes, oitivas e acareações de testemunhas e sustentação oral de advogados.

Também foi alegado pelo parquet que, na esfera administrativa federal, a Controladoria-Geral da União expediu a Instrução Normativa CGU n.º 12, de 1º de novembro de 2011, regulamentando a adoção de videoconferência na instrução de processos e procedimentos disciplinares no âmbito do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, visando assegurar os direitos ao contraditório e à ampla defesa, e que CGU detém atribuição para expedir instruções relativas a processos administrativos, por força do Decreto n, 5.480/05, art. 4º.

Por sua vez, os advogados do servidor, Felipe Bambirra, Sérgio Merola, José Andrade e Nária Carvalho, da Bambirra, Merola & Andrade Advogados, alegaram que a ausência de previsão legal autorizando a oitiva de testemunhas no PAD por meio de videoconferência seria um ato inconstitucional, por ferir o princípio da legalidade, ainda que exista norma infralegal sobre o tema, argumento que foi acolhido pelo juiz.

O magistrado também destacou, em sua decisão, que “nesse sentido, quadra notar que as videoconferências realizadas sob a égide de leis adjetivas penal e civil se dá em processo judicial sob a presidência de um Juiz imparcial e equidistante das partes, o que não se verifica no processo administrativo, que, além da natureza inquisitória, é presidido por colega do servidor acusado, não pelo Poder Judiciário, tampouco com a miríade de garantias daí decorrentes”.