Em 10 anos, Goiás já registrou mais de 600 escrituras de união estável entre pessoas do mesmo sexo

Um dos mais emblemáticos dias para a garantia dos direitos LGBT no Brasil completa 10 anos. Há uma década, no dia 5 de maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecia por meio Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Desde então já foram mais de 600 uniões homoafetivas realizadas em Goiás, que agora também permite que o ato seja feito on-line, pela plataforma oficial e-Notariado.

Num voto histórico, o então ministro Ayres Britto, relator das ações, argumentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor. E que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual e que, portanto, seria necessário excluir qualquer significado do artigo 1.723 do Código Civil que impedisse o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

“O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica”, observou o magistrado. Concluindo que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colidia com o inciso IV do artigo 3º da CF. A decisão abriu, anos depois, a possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Uniões em Goiás

De acordo com os dados Colégio Notarial do Brasil – Seção Goiás (CNB/GO), desde a decisão do STF 609 escrituras de uniões estáveis entre casais do mesmo sexo já foram realizadas por Cartórios de Notas de Goiás, sendo 63 em 2020, ano da pandemia. O ano de 2011, quando a união estável entre pessoas do mesmo sexo foi reconhecida, marca o recorde da década, com 83 atos realizados. Entre 2010 e 2020 houve um crescimento de 91% nos atos praticados no Estado.

A decisão é considerada também um marco para o Direito de Família. O pleito abriu um debate importante na sociedade, que resultou, em 2013, na Resolução nº 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que permitiu aos cartórios registarem casamentos homoafetivos. O presidente do CNB/GO, Alex Valadares Braga ressalta que o Tabelionato de Notas preza pelo direito igualitário a todos os cidadãos. “Os atos feitos no cartório representam uma importante ferramenta de segurança jurídica aos casais, assegurando diversos direitos à população homossexual”, explica o presidente.

União estável on-line

Desde junho do ano passado, o ato pode ser realizado de forma online, pela plataforma e-Notariado. Para realizá-la, o cidadão precisa de um Certificado Digital Notariado, emitido gratuitamente pelos Cartórios de Notas cadastrados, ou possuir um certificado padrão ICP-Brasil, o mesmo utilizado para envio do Imposto de Renda de Pessoa Física.

Com o certificado digital, o cidadão deve entrar em contato com o Cartório de Notas de sua preferência e solicitar o ato. Um link para a videoconferência será enviado para o e-mail indicado pelo usuário. Após a vídeo-chamada, na qual é realizada a identificação das pessoas e a coleta de sua vontade, o cidadão pode assinar seu documento pelo computador ou celular com um simples clique.

No Brasil, desde a decisão do STF mais de 21,6 mil escrituras de uniões estáveis entre casais do mesmo sexo já foram realizadas por Cartórios de Notas de todo o País, sendo 2.125 em 2020, ano da pandemia. Dezembro foi o mês mais escolhido para a realização do ato, com uma média de 198 uniões realizadas no período a cada ano, tendo seu pico em 2018, quando 325 uniões homossexuais foram realizadas. O ano de 2018, véspera do início do mandato do atual presidente da República, marca também o recorde da década, com 2.595 atos realizados.

Evolução dos direitos LGBT

Apesar do número expressivo, o País ainda não tem uma lei que regulamente a situação dessas pessoas. Tramita no Congresso o projeto de lei nº 612/2011, de autoria da senadora Marta Suplicy (sem partido), que altera o Código Civil para retirar menções de gênero em relação ao casamento e à união estável – hoje, a lei fala em “homem e mulher”.

A proposta já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e poderia ter sido enviada diretamente à Câmara, mas foi barrada após um recurso do senador Magno Malta (PR-ES), da bancada evangélica, que solicitou que a matéria fosse votada em plenário. O projeto foi colocado na pauta para votação em dezembro do ano passado, mas não houve quórum. Para que vire lei, o PL precisa ser aprovado nas duas Casas do Legislativo e passar por sanção presidencial.