Deputados apoiam PEC 80 durante audiência pública na Câmara

A primeira audiência pública realizada pela Comissão Especial criada pela Câmara dos Deputados para emitir parecer à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 80, realizada nesta quarta-feira (14), em Brasília, foi marcada pelas declarações de apoio de parlamentares à matéria, que organiza as carreiras dos advogados públicos e procuradores autárquicos que atuam na administração indireta de entidades dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Os parlamentares questionaram o principal argumento dos opositores da PEC, de que ela criaria novas despesas para os entes federados e, com isso, feriria o Pacto Federativo.

“Já fui prefeito, gestor público, e sinceramente não consigo enxergar onde essa proposta cria despesa. Não está escrito em lugar nenhum que tem de contratar. Entendo que ela tenta criar um sistema orgânico de funcionamento da coisa jurídica pública com advogados que já está trabalhando nessas funções”, opinou o deputado federal Toninho Wandscheer (PT-PR). Já o Delegado Éder Mauro (PSD-PA), ressaltando ser defensor da PEC 80, disse que não gostaria de ver os advogados públicos divididos – em referência aos procuradores dos Estados, que são contrários à proposta – e também questionou onde o Pacto Federativo poderia ser atingido pela emenda. “Essa movimentação contrária não seria uma questão de egos feridos?”, questionou Éder.

O deputado federal Beto Salame (PROS-PA) disse acreditar que a proposta não está tendo a devida compreensão. “Os advogados públicos vêm sendo discriminados, apesar de exercerem sua função de forma legítima e reconhecida pelos tribunais, inclusive os superiores”, afirmou o parlamentar, que é procurador municipal. “A PEC 80 faz isso de maneira clara. Não enxergo nada que vá prejudicar os procuradores, mas às vezes o ser humano não consegue enxergar o que beneficia o outro. Independentemente, os procuradores autárquicos merecem ser reconhecidos pela Constituição Federal”, enfatizou.

Um dos autores da PEC 80 e autor do substitutivo que está sendo avaliado pela comissão, o deputado federal Valtenir Pereira (PROS-MT) contou que desde o primeiro momento foram convidados para a discussão os representantes da Associação Brasileira dos Advogados Públicos (Abrap) e da Associação Nacional dos Procuradores de Estado (Anape). “Deixamos claro que temos de sistematizar a advocacia pública no Brasil. Esta casa tem a responsabilidade de resolver esta questão”, alertou, lembrando que os advogados públicos que representam a administração indireta não tiveram sua carreira definida na Constituição Federal de 1988 por omissão do constituinte originário. “Sistematizar a advocacia pública é defender a sociedade e manter seguro o patrimônio público”, afirmou, lembrando que as carreiras já existem na prática, “ao vivo e em cores”. “O que queremos é tão somente sistematizá-las”, disse.

Valtenir deixou claro que não se está criando novos cargos nem remuneração e que todos os Estados estão tendo sua autonomia respeitada. “Quando uma Emenda Constitucional fixou em 90,25% do subsídio de ministro do STF a remuneração dos desembargadores dos Estados ninguém falou que fere o Pacto Federativo”, afirmou, em analogia aos argumentos que agora estão sendo usados pelos opositores da PEC 80. “Não mexemos com os procuradores de Estado. O artigo 132 da Constituição Federal está intacto. O que queremos é fortalecer as carreiras como um todo. Nosso único intuito é resolver essa questão”, declarou, acrescentando que a aprovação da PEC 80 evitará a enxurrada de ações que já existem no STF. Valtenir também esclareceu que a proposta não fala em transposição de cargos. “Transposição acontece quando se alteram as atribuições de um cargo, mas aqui estamos apenas organizando, sem mudar atribuições. Logo, falar em transposição de cargos é menosprezar a inteligência dos deputados”, concluiu.

Segundo vice-presidente da Comissão Especial, o deputado Sérgio Souza (PMDB-PR) destacou que a comissão está iniciando agora seus trabalhos e que se aprofundará sobre o tema principal. “Não há nenhum interesse em atingir os direitos de outra categoria”, enfatizou. “Se fere o Pacto Federativo e aumenta salário, eu não vi onde. Por que esse confronto? São todos advogados públicos, todos inscritos na OAB”, avaliou o deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA). Outro que se manifestou na audiência pública foi Eduardo Bolsonaro (PSC-SP). “Não cabe a esta Casa tolher direitos dizendo que no futuro isso vai aumentar salários. Se os advogados públicos, organizados em carreira, vão conseguir melhores salários, isso será em negociação em seus Estados, será mérito deles”, afirmou Bolsonaro. “Neste momento, Marcelo (dirigindo-se ao presidente da Anape, Marcelo Terto, um dos convidados para a audiência pública), eu sou favorável a votar pela aprovação da PEC 80”, declarou.

Cronograma
A Comissão Especial também aprovou a proposta de cronograma apresentada por seu relator, o deputado Odorico Monteiro (PT-CE). A ideia é que sejam realizadas novas audiências públicas, nos dias 21 (já marcada) e 27 de outubro, em Brasília, e um conjunto de seminários nos Estados, que deverão ser concluídos até o final deste mês. No final de novembro Odorico pretende apresentar seu relatório para votação. A próxima audiência pública será no dia 21 de outubro, às 14h30, com a presença dos convidados José Lagana, da Associação dos Advogados Públicos do Estado do Paraná, da constitucionalista Maria Garcia, professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e da presidente da Associação Nacional de Procuradores Municipais, Georgia Campelo.

Convidados
Os convidados para a audiência pública desta quarta-feira foram o presidente da Abrap, Marcos Vitório Stamm, o presidente da Anape, Marcelo Terto, o presidente do Colégio de Procuradores Gerais dos Estados, Francisco Wilkie Rebouças Júnior e o ex-deputado federal e representante da seccional paraense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Carlos Jeva Kayath. Mais de 100 advogados públicos e procuradores autárquicos, reunidos pela Abrap, lotaram o plenário 13 da Câmara dos Deputados para acompanhar as discussões.

Marcos Stamm destacou que a PEC 80 não mexe em atribuições dos cargos, apenas uniformiza as denominações que os advogados públicos recebem. “Ela não traz novas despesas porque os cargos já existem e sempre existiram, foram providos por concurso público. O que buscamos é o estabelecimento de nossa dignidade e que os preconceitos sejam postos abaixo”, afirmou Stamm, ressaltando que em vários Estados há dezenas de comissionados e terceirizados contratados por meio de vínculos precários, sem concurso público, para exercer essas atribuições. “Essa matéria que estamos discutindo aqui é de interesse público”, destacou, acrescentando que os advogados públicos e procuradores autárquicos estão há 27 anos trabalhando para os Estados e esperando pela correção de uma distorção que deixou a carreira deles fora das previstas no texto constitucional.

Para Stamm, agir contra a PEC é afrontar o artigo 3º da Constituição Federal, que trata dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, entre eles, o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. “Temos várias decisões jurídicas reconhecendo a atuação dos procuradores autárquicos, inclusive fundamentadas com pareceres de procuradores de Estado. Aqui estamos tentando resolver uma questão que está presente em todos os Estados do Brasil”, disse. “O Congresso Nacional é independente, aqui são feitas as leis e esta Casa é soberana para decidir o que é melhor para o povo brasileiro”, observou.

O representante da OAB-PA lembrou que as discussões estão sendo travadas no foro legítimo, o Congresso Nacional, e que a posição da OAB-PA, que ele levou para a audiência pública, é institucional. Ele ponderou que a Constituição Federal previu leis complementares para organizar o funcionamento da Advocacia Geral da União (AGU), com suas carreiras. Os Estados, no entanto, adotaram, cada um, um modelo diferente, com cargos com nomenclaturas diferentes, providos por concurso público. “A PEC 80 objetiva eliminar distorções provocadas pelo constituinte originário. Inicialmente, não a apoiaríamos, mas, com a Emenda Substitutiva nº 1, apresentada pelo deputado Valtenir Pereira, vimos que ela organizará e unificará as nomenclaturas das carreiras”, disse, ressaltando que todos os cargos serão, como já são, ocupados por advogados públicos contratados, regularmente inscritos na OAB. “Não existirá nenhum trem da alegria, ao contrário da situação atual, em que vários Estados criaram cargos em comissão de assessoramento jurídico e até mesmo de chefia”, enfatizou Carlos Kayath.