Curtir comentários no Facebook considerados ofensivos à empresa pode gerar demissão por justa causa

Wanessa Rodrigues

Curtir comentários no Facebook considerados ofensivos à empresa em que trabalha pode caracterizar ato lesivo à honra e à boa fama contra o empregador e acabar em demissão por justa causa. Com esse entendimento, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas), manteve decisão da 1ª Vara do Trabalho de Jundiaí (SP) que julgou improcedente o pedido do trabalhador de anular rescisão motivada do contrato de trabalho por “curtida” na rede social.

No caso, o trabalhador curtiu a publicação de um ex-colega no qual havia críticas dirigidos ao local em que ambos trabalhavam e teria participado de conversas públicas na rede social em que uma das proprietárias foi ofendida. Quando a empresa ficou sabendo decidiu demitir o trabalhador por justa causa. Em sua decisão, a relatora da ação, a juíza Patrícia Glugovskis Penna Martins, disse a liberdade de expressão não permite ao empregado travar conversas públicas em rede social ofendendo a sócia proprietária da empresa, o que prejudicou de forma definitiva a continuidade de seu pacto laboral.

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“Um trabalhador que publicamente e por meio das redes sociais corrobora com ato lesivo contra seu empregador responderá por tais atos”, diz Póvoa.

Tabajara Póvoa, especialista em Direito Digital, diz o posicionamento do TRT-15 está correto, tendo em vista a ampla utilização das redes sociais nos dias atuais. Assim o funcionário que publicamente anui ou concorda com comentários maldosos contra seu empregador se enquadra no caso de demissão por justa causa. Ele salienta que, hoje, as redes sociais atingem um número gigantesco de pessoas, e o fato deve ser analisado sob a ótica, neste caso, da relação e emprego. Ou seja, existindo a relação e emprego, não há que se falar em liberdade de expressão, pois é nítida o cometimento da falta transcrita no 482, alínea b da CLT, mal procedimento, pois depõe contra o nome do seu empregador.

Póvoa esclarece que relação de emprego não permanece somente entre muros, ou seja, só no ambiente de trabalho, devendo não só o trabalhador, mas todas as pessoas terem conhecimento de que o mundo virtual é e tem consequências no mundo real. “Assim um trabalhador que publicamente e por meio das redes sociais corrobora com ato lesivo contra seu empregador responderá por tais atos. E, conforme o caso, não só na relação de emprego, mas até mesmo na esfera criminal”, declara o advogado.

O advogado de Direito Digital Rafael Maciel foi o patrono da ação
Tem que haver prudência, reconhecer o potencial danoso de um comentário ofensivo”, ressalta Maciel

O também especialista em Direito Digital, Rafael Maciel, diz que a situação depende muito do caso concreto, mas é importante lembrar que uma curtida torna o conteúdo mais relevante e, pelo algoritmo das redes sociais e buscadores, passa a ser exposto preferencialmente na “timeline” e no resultado das buscas. O resultado é uma exposição daquilo que é ofensivo em detrimento de inúmeros outros fatos positivos. O advogado salienta que, ainda que seja pessoal, o conteúdo postado de forma pública, passa a ser de acesso a todos e, inclusive, indexado por buscadores, os comentários são vinculados à imagem da empresa na Internet, tendo poder de minar sua reputação.

Para Maciel não é questão de monitorar comentários, mas entender que os mesmos são danosos quando públicos. Segundo afirma, a empresa acaba tomando conhecimento, mesmo que não faça gerenciamento da marca nas mídias digitais. “Tem que haver prudência, reconhecer o potencial danoso de um comentário ofensivo, não só para ele como também para e empresa em que trabalha”, ressalta Maciel.

Alcance massificado

O advogado Rafael Lara Martins
Martins diz que, por serem tão comuns e presentes na vida de todos, redes sociais devem ser utilizadas com cuidado.

Rafael Lara Martins, advogado trabalhista, observa as redes sociais representam atos da vida privada com alcance massificado. Segundo ele, todas as pessoas só deveriam postar, curtir ou compartilhar conteúdo que elas também divulgariam abertamente na vida privada. “As redes sociais não representam “filtro de irresponsabilidade” e justamente por serem tão comuns e presentes na vida de todos é que devem ser utilizadas com muito cuidado”, diz.

Martins salienta que o fato de o empregado demonstrar apoio a uma declaração de ofensa ao seu empregador na rede social seria equivalente a esse mesmo empregado “gritar em praça pública” o conteúdo, para conhecidos e estranhos. O que se deve analisar é se esse conteúdo realmente ofendeu ou não a honra da empresa a ponto de se justificar a rescisão do contrato de trabalho por justa causa ou se uma medida menos severa – como, por exemplo, uma suspensão – não seria suficiente. “Liberdade de expressão significa que todos podem postar, curtir e compartilhar o que bem entenderem na rede social, sem qualquer filtro ou censura, mas isso não significa que não há responsabilidade sobre os atos de cada um”, completa.

Abrangência
O advogado Mário Henrique Flabes, também especialista em Direito do Trabalho, declara que, diante do leque de abrangência das redes sociais, não é errado afirmar que tudo que a pessoa posta nesses sites pode, sim, ser usado contra ela. Ele esclarece que publicar ofensas indiretas ou em anonimato contra a empresa ou o empregador também pode incorrer em demissão com base em inquérito administrativo. Conforme diz, isso justifica o crescente número de processos envolvendo redes sociais nos últimos tempos.

advogado Mário Flabes
Para Flabes, na era da comunicação digital, os empregados devem se atentar aos conteúdos que publicam, curtem ou interagem.

Segundo o especialista, na era da comunicação digital, os empregados devem se atentar aos conteúdos que publicam, curtem ou interagem em redes sociais como Facebook, Instagrem, Twitter e tantas outras ferramentas. Ele ressalta que, apesar da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ter sido criada antes da popularização da internet, em 1943, há, sim, como relacionar o mau comportamento na rede com a demissão por justa causa.

É importante ressaltar, conforme Flabes, que o trabalho é uma das formas de dignificação do homem, por meio do qual a pessoa provê suas próprias necessidades enquanto ser humano. Assim, torna-se forçoso reconhecer que a pessoa que caçoa do próprio trabalho, ou mesmo maldiz sobre o seu empregador não é digno da função.

Monitoramento
O monitoramento do uso de redes sociais, tem duas vertentes, se for no ambiente de trabalho, a empresa deve deixar claro no contrato o que pode e o que não pode ser utilizado, por exemplo: se é permitido o uso ou acesso as redes sociais no ambiente de trabalho, fora dele devemos lembrar que as redes sociais é um espaço na maioria das vezes públicos, dependendo da configuração de privacidade de cada usuário.

Neste sentido se for disseminado publicamente o conteúdo, sendo de acesso livre a qualquer um é perfeitamente possível. Aliás, hoje em dia é mais do que comum, mais usual, a utilização ou verificação dos conteúdos das redes sociais pelos departamentos de RH na hora da contratação de um funcionário. Então é melhor ficar atento ao que se publica.

Dicas
A dica não só para os trabalhadores, mais para todos que utilizam as redes sociais, na dúvida não clique, não curta, não publique, pense que se não fosse pela internet, se você faria ou não aquele comentário, espere um pouco reflita primeiro sobre o assunto para depois concordar ou republicar o conteúdo. As publicações nas redes sociais, no mundo virtual, tem consequências no mundo real.