Muitas disposições da Lei 11.101/05 -LFRE, muito embora com quase 14 anos de vigência, ainda geram dúvidas em seus aplicadores. Por exemplo, quando ela trata do administrador judicial, especialmente de sua remuneração e a forma de pagamento, assim expressa em seu Art. 24 e §§ 1º e 2º: “O juiz fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial, observados a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes. § 1o Em qualquer hipótese, o total pago ao administrador judicial não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência. § 2o Será reservado 40% do montante devido ao administrador judicial para pagamento após atendimento do previsto nos arts. 154 e 155 desta Lei”. (grifamos).
Ao fazer referências explícitas aos artigos 154 e 155 da mesma Lei, creem alguns que esta reserva de 40% (quarenta por cento) tem destinação específica para o processo de Falência, vez que os citados artigos cuidam “do encerramento da falência e da extinção das obrigações do falido”. Porém, muitos outros intérpretes e até mesmo julgadores entendem que a mencionada reserva de 40% tem aplicação também aos processos de recuperação judicial. E nós somos um destes intérpretes, vez que ao escrevermos A Recuperação Judicial Comentada Artigo por Artigo, Editora Delrey, assim nos posicionamos.
O Superior Tribunal de Justiça, entretanto, ainda não havia se pronunciado especificamente sobre a questão. Agora, porém, no REsp 1700700/SP, em que é Relatora a eminente Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 05/02/2019, DJe 08/02/2019, houve a provocação expressa, exatamente para se saber o alcance da norma expressa no parágrafo segundo do artigo 24, cuja ementa transcrevemos na íntegra, abaixo:
“RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HONORÁRIOS DO ADMINISTRADOR JUDICIAL. RESERVA DE 40%. ARTS. 24, § 2º, DA LFRE. INAPLICABILIDADE NO ÂMBITO DOS PROCESSOS DE SOERGUIMENTO. 1. Recuperação judicial requerida em 15/12/2015. Recurso especial interposto em 24/3/2017 e concluso ao Gabinete em 11/12/2017. 2. O propósito recursal é definir se a regra do art. 24, § 2º, da Lei 11.101/05 – que trata da reserva de honorários do administrador judicial – aplica-se também aos processos de recuperação ou apenas às ações de falência. 3. O art. 24, § 2º, da LFRE faculta a reserva de 40% dos honorários do administrador judicial para pagamento posterior, providência que se condiciona, segundo a mesma norma, à verificação e à realização de procedimentos relativos estritamente a processos de falência – (i) prestação de contas (após a realização do ativo e a distribuição do produto entre os credores); e (ii) apresentação do relatório final da falência, indicando valores patrimoniais e pagamentos feitos, bem como as responsabilidades com que continuará o falido. 4. Diante disso, uma vez que as condições a que se sujeita o pagamento diferido guardam relação com procedimentos específicos de processos falimentares, não se pode considerar tal providência aplicável às ações de recuperação judicial. RECURSO ESPECIAL PROVIDO”. (grifamos).
As afirmações pontuais da eminente Ministra Nancy Andrighi, na sua inconfundível explicação sobre a aplicabilidade da citada norma, não nos deixa nenhuma dúvida a respeito da questão, só nos restando curvarmo-nos aos seus ensinamentos, e com ela repetir que a reserva dos 40% para pagamento ao final do processo ao respectivo administrador judicial, só tem aplicabilidade na falência.