Até onde vai a soberania da Assembleia Geral de Credores na recuperação judicial?

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    Durante um período considerável discutiu-se muito na doutrina e na jurisprudência sobre a denominada soberania da assembleia geral de credores na recuperação judicial. Para alguns, tal soberania é ilimitada; para outros, a sua soberania tem por limites exclusivamente a aprovação do plano de recuperação judicial; e, para outras ainda, tal soberania tem limites, especialmente se na aprovação do plano de recuperação judicial a assembleia geral de credores infringir qualquer dispositivo legal.

    Assim, se durante a votação do plano de recuperação judicial, a assembleia geral de credores o aprovou com, por exemplo, deságio de 90% sobre o valor do principal, sem juros, com carência de 18 meses e prazo de pagamento em 10, 12 anos ou mais, para os últimos pensadores e julgadores, não houve qualquer infringência à Lei 11.101/05, vez que esta não limita nem tempo e nem deságio, deixando a critério dos credores (que compõem a AGC), se aprovam ou não dessa forma proposta, já que estes são, na essência, os maiores interessados quanto ao recebimento dos seus créditos e de que forma.

    O Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, no Agravo de Instrumento  5462323-35.2018.8.09.0000, em que é  Relator o eminente desembargador Amaral Wilson de Oliveira, 2ª Câmara Cível, julgado em 13/03/2019, DJe  de 13/03/2019, cuja ementa transcrevemos na íntegra a seguir, se posicionou no sentido de respeito à votação da Assembleia Geral de Credores, que concedeu grandes benesses ao credores, não permitindo a intromissão do Poder Judiciário na questão:

    AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO PELA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES. SOBERANIA. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. VIABILIDADE ECONÔMICA. QUESTÕES ATINENTES AO MÉRITO DO PLANO. 1- A legislação de regência (Lei 11.101/2005) prestigia a recuperação judicial da empresa em face de eventual falência, razão por que devem ser empreendidos esforços para se alcançar o objetivo da recuperação. 2 – Descabe ao Poder Judiciário imiscuir-se na análise da viabilidade econômica do plano de recuperação, de modo que a ele não cabe analisar a desproporcionalidade dos deságios e prazos de carência, por versarem sobre questões atinentes ao mérito do plano, de apreciação exclusiva da assembleia geral de credores. 3 – Observada a regularidade procedimental, deve ser preservado o plano de recuperação aprovado pela assembleia geral de credores, com a consequente confirmação da decisão homologatória respectiva, em atenção aos postulados constitucionais da economia e celeridade processuais, ainda, da razoabilidade e segurança jurídica e, sobremodo, em consonância a ratio iures da legislação de regência, notadamente à soberania da assembleia geral de credores. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO”. (grifamos).

    Com acerto, a nosso ver, a V. decisão liderada pelo eminente desembargador Amaral Wilson de Oliveira, da 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás, pois, não importa para o Poder Judiciário a longevidade para cumprimento e nem os deságios concedidos pela AGC no plano de recuperação judicial apresentado. É claro, desde que este não infrinja qualquer dispositivo legal, sendo esta a única possibilidade de intervenção do Judiciário na votação de uma assembleia geral de credores numa  recuperação judicial. Ela (a AGC) é, nestes termos, absolutamente soberana.