Recentemente, vagando pelo instagram, deparei-me com um vídeo, em uma página de cães fofinhos, de uma mulher esclarecendo aos quatro ventos que os condomínios não podem impedir os condôminos de terem bichinhos de estimação, de limitarem o seu acesso a elevadores e de proibirem a posse de raças grandes.
Claro que o respectivo vídeo já contava com inúmeras visualizações e apoios de seguidores que amam os seus pets e almejam se informar quanto aos seus direitos.
De uma forma bem simples, a pessoa do vídeo pautou tais afirmações no direito de propriedade, o qual é assegurado pelo Código Civil (artigo 1.228) e pela Constituição Federal (artigo 5º), mas deixou de fazer menção aos direitos de vizinhança (artigo 1.277 e seguintes do Código Civil), bem como às regras básicas dos condomínios edilícios (artigo 1.331 e seguintes do Código Civil).
Antes de tudo, é interessante elucidar o que é um condomínio.
Condomínio é o exercício do direito de propriedade de um bem indivisível, ou de parte dele, por mais de uma pessoa. Pode existir condomínio de casas, carros, tudo aquilo que não se puder dividir e possuir mais de um dono.
O condomínio edilício diz respeito tanto aos prédios (condomínios verticais) quanto aos condomínios residenciais (condomínios horizontais). Em ambos os casos há partes de áreas comuns e partes que são propriedades exclusivas dos respectivos condôminos.
Como a ideia central é que várias pessoas sejam donas de parte de um bem só, é necessário que haja regras para a coisa funcionar e a essas regras dá-se o nome de Convenção.
Essa Convenção pode ser resumida em um compilado de vontades da maioria dos moradores, editada pensando no direito de vizinhança e, acima de tudo, no direito da coletividade.
Lembrando que a Convenção é uma espécie de contrato, de acordo de vontades, e, como tal, faz lei entre os envolvidos.
Então, se em uma Convenção condominial está previsto que bichinhos de estimação não são permitidos, em tese, você não pode ter um pet, pois estaria violando os interesses da maioria.
No ano passado (2020), o Superior Tribunal de Justiça julgou um caso (AgInt no Recurso Especial nº 1631586 – DF, Rel.: Min. Marco Aurélio Bellizze) em que, excepcionalmente, o teor da Convenção de condomínio havia sido flexibilizado, para permitir que uma moradora criasse dois gatos em seu apartamento.
No bojo da referida decisão, ficou claro que os dois gatinhos não eram motivos de queixas pelos demais vizinhos, também não apresentavam riscos à incolumidade das áreas comuns, ao sossego dos moradores e dos eventuais visitantes. Em outras palavras, a criação dos bichanos não traria nenhum prejuízo ao Condomínio e às demais pessoas, preservando-se o interesse coletivo.
“Mas, afinal, o Condomínio pode me impedir de ter um bichinho de estimação ou limitar o seu acesso a certos ambientes?”
Em tempos de famílias multiespécies, essas indagações têm sido cada vez mais comuns e pertinentes, uma vez que os pets são membros da família.
Gostaria muito que a resposta para tais indagações fosse simples, mas, infelizmente, não é. A saída é: depende.
Ainda que o direito de propriedade seja algo certo e constitucionalmente amparado, é inquestionável o dever de observar o interesse do coletivo expresso pela maioria.
Se, no caso concreto, restar comprovado que o animal de estimação não traz nenhum dano aos vizinhos, ao próprio condomínio e aos visitantes, a cláusula de vedação poderá, sim, ser flexibilizada.
Mas, se existirem provas de incômodos, danos patrimoniais causados, queixas de outros condôminos, muito provavelmente o morador terá que respeitar o conteúdo da Convenção ou entrar em um acordo de convivência quanto a ter o animal, deixando de frequentar certas áreas.
Além disso, não pode o condomínio na Convenção colocar cláusula de vedação genérica, há a necessidade de explicar o porquê que não pode, quais tipos de animais que não podem, é necessário justificar o interesse coletivo.
Quem opta por ter um animalzinho, o melhor a fazer é procurar saber o conteúdo da Convenção do condomínio em que reside e/ou, se possível, dar preferência por locais que aceitem bichinhos.
Lembrem-se que nenhum direito é absoluto, sempre devemos ponderar as situações e resolvê-las pelo caminho da razoabilidade.
Afinal, você tem o direito à propriedade, seu vizinho tem o direito ao sossego e todos temos o direito à felicidade!
*Marina Borges Augusto é advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, sócia do escritório Borges, Oliveira, Ribeiro Sociedade de Advogados.