O direito de greve do servidor público

advogado Sergio Antonio Merola MartinsA atual Constituição foi a primeira da nossa história a prever o direito de greve ao servidor público, em seu art. 37, VII:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;

Perceba que o final do dispositivo limita o exercício deste direito através de lei específica.

Ocorre que, até o momento, tal lei não foi elaborada, o que gerou várias discussões jurídicas sobre a legitimidade das greves dos servidores públicos.

Muitos sindicatos, representantes de classes de servidores públicos, entraram com Mandados de Injunção pleiteando esse direito face a omissão legislativa, conforme previsão constitucional.

Diante de tantas ações, em 2007, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou, no julgamento dos MIs 670, 708 e 712, por unanimidade, a omissão legislativa quanto ao dever constitucional em editar lei que regulamente o exercício do direito de greve no setor público e, por maioria, aplicar ao setor, no que couber, a lei de greve vigente no setor privado (Lei nº 7.783/89).

À época, o ministro Celso de Mello salientou que “não mais se pode tolerar, sob pena de fraudar-se a vontade da Constituição, esse estado de continuada, inaceitável, irrazoável e abusiva inércia do Congresso Nacional, cuja omissão, além de lesiva ao direito dos servidores públicos civis – a quem se vem negando, arbitrariamente, o exercício do direito de greve, já assegurado pelo texto constitucional -, traduz um incompreensível sentimento de desapreço pela autoridade, pelo valor e pelo alto significado de que se reveste a Constituição da República”.

Assim, os servidores públicos, hoje, exercem o direito de greve com base na Lei nº 7.783/89, naquilo que couber. Vale ressaltar que, também com previsão constitucional, ao militar é vedado o exercício do direito de greve, apesar de já termos visto situações em que estes, explicitamente, aderiram a greves, o que é ilegal e inconstitucional.

A situação dos Bancários

Até alguns dias atrás, como ocorre tradicionalmente nos meses de setembro e/ou outubro, os bancários estavam em greve. Aqui, existe uma situação peculiar: funcionários da iniciativa privada e empregados públicos (servidores públicos latu sensu) exercem o direito de greve defendendo os direitos de uma única classe.

Isso ocorre pois, como sabido, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil são empresas estatais. Esta, Sociedade de Economia Mista com capital público e privado; aquela, Empresa Pública com capital 100% público.

Em ambos os casos, os empregados públicos são regidos pela CLT, apesar da obrigatoriedade do concurso público para ingressar nos quadros dessas empresas. Essa situação ajuda, e muito, os empregados dos bancos privados a terem um movimento grevista forte, que lhes garantem aumentos acima da inflação todos os anos.

Isso porque, em 2013 (RE 589998), o STF decidiu que é obrigatória a justificativa para demissão de empregado público, seja de Empresa Pública ou Sociedade de Economia Mista, o que, consequentemente, aumenta a força dos empregados públicos bancários em aderir à greve, pois uma demissão por esse motivo, seria, por óbvio, ilegal.

Mesmo antes do julgado acima, a adesão em massa dos empregados da Caixa e do Banco do Brasil fortaleceram a classe dos bancários, já que, tradicionalmente, essas empresas não demitem funcionários senão por justa causa, garantindo uma grande e demorada paralisação, como a que vimos até alguns dias atrás. Nos bancos privados a adesão é menor, pois os funcionários têm medo de serem demitidos ou perderem suas gratificações em caso de paralisação.

Portanto, a greve exercida pelos servidores públicos, atualmente, é legítima e respaldada pelo STF, mesmo diante da ausência da previsão legal expressa na Constituição.

É bem verdade que existem vários movimentos grevistas políticos e abusivos, mas esses temas serão tratados em outra oportunidade.

*Sérgio Merola é especialista em  Direito Público e advogado da banca Tibúrcio Advogados.