A Câmara dos Deputados aprovou no início da semana um pedido de urgência para acelerar a votação do Projeto de Lei 714/2023, que determina a prisão preventiva durante a audiência de custódia nos casos de crimes hediondos, roubo, associação criminosa qualificada e reincidência criminal.
Para o advogado criminalista Renato Alexandre, especialista em execuções penais, a proposta representa um retrocesso ao sistema acusatório brasileiro.
“A prisão preventiva obrigatória em audiência de custódia é uma grave afronta ao direito ao contraditório”, afirma o advogado.
Segundo o especialista, o projeto desrespeita os princípios fundamentais da Constituição Federal e ignora o direito ao contraditório e à ampla defesa.
“O princípio fundamental do contraditório é que o acusado tenha o direito de ser ouvido e que cada decisão judicial, especialmente sobre liberdade, seja individualizada e fundamentada nos detalhes e especificidades daquele caso concreto. A prisão não pode ser a regra, ela deve ser a última opção”, completa.
O sistema acusatório, implementado pelo Código de Processo Penal, baseia-se no princípio de que todo indivíduo tem o direito de ser ouvido em igualdade de condições e de ter defesa plena antes de qualquer decisão sobre sua liberdade. O objetivo é assegurar que a prisão preventiva seja utilizada somente após rigorosa análise do caso pelo magistrado.
No entanto, o criminalista Renato Alexandre explica que o PL 714/2023 propõe uma decretação quase automática da prisão preventiva, esvaziando o papel do juiz como garantidor dos direitos do indivíduo e eliminando a análise criteriosa de cada caso.
“O juiz de custódia tem a função de avaliar a legalidade da prisão, ouvir argumentos das partes e garantir que os direitos do acusado sejam respeitados. O projeto de lei 714/2023 subverte esse papel, transformando a audiência em um ato protocolar, desprovido de análise e de sensibilidade jurídica”, explica.
Consequências
Manter um indivíduo preso preventivamente sem uma análise adequada dos fatos pode acarretar graves consequências para o acusado, explicam criminalistas.
Além disso, a aplicação da prisão preventiva de forma indiscriminada ameaça sobrecarregar ainda mais o já saturado sistema penitenciário brasileiro.
“Esse projeto ignora que a privação de liberdade deveria ser um último recurso e não um instrumento de punição antecipada. Também desconsidera os impactos psicológicos e sociais da prisão prolongada, especialmente para acusados ainda não condenados, que perdem emprego, vínculos familiares e enfrentam estigmatização social que poderá marcar para sempre suas vidas”, conclui Renato Alexandre.
Se aprovado na Câmara dos Deputados, o projeto seguirá para votação no Senado Federal.