Empresas precisam ficar atentas às fiscalizações das alterações no vale alimentação/refeição

Na coluna desta quarta-feira (11), a colega Thanilla Oliveira escreve sobre as alterações nas regras do vale alimentação/refeição. Ela alerta que as empresas precisam ficar atentas às fiscalizações. Ela é advogada trabalhista e empresarial e conselheira seccional da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goias (OAB/GO).

Thanilla Oliveira

Leia a íntegra do texto:

No final do mês de março, a Medida Provisória nº 1.108 de 2022, ganhou publicidade pelas alterações polêmicas na modalidade de teletrabalho, mas pouco se tratou sobre outro tema, não menos importante, apresentado na mesma MP: as alterações quanto à fiscalização da concessão de vales alimentação e/ou refeição.

A legislação não obriga o empregador a fornecer vale-refeição ou vale-alimentação aos seus empregados, tampouco há obrigatoriedade de se inscrever no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). No entanto, as Convenções Coletivas do Trabalho (CCTs) e os acordos individuais podem exigir a concessão desses benefícios. Além disso, a adesão pode acontecer por mera liberalidade visto que esses auxílios trazem benefícios às empresas como descontos no imposto de renda e isenções de contribuições sociais.

Promulgada em 1976, a Lei 6.321, tinha por objetivo preeminente a disponibilização de uma alimentação de nível, minimamente razoável, moderando as dificuldades nutricionais aos empregados do país. Referida lei ficou conhecida como Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) e é direcionada aos trabalhadores com renda mensal de até cinco salários mínimos.

O benefício é custeado tanto pela empresa quanto pelos empregados, mas seu êxito depende da iniciativa privada em conjunto com iniciativas governamentais, através dos citados incentivos fiscais. 

O Brasil é um país que, infelizmente, sempre possuiu um elevado índice de pessoas que sofrem com a fome e/ou desnutrição. Hodiernamente, mais de cinquenta por cento da população de nosso país sobrevive com algum grau de insegurança alimentar. O referido dado provém da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan). Mesmo assim, infelizmente, o vale-alimentação e refeição sofrem constante desvirtuação e os cartões/tíquetes disponibilizados pelas empresas, por mais óbvio que pareça, que deveriam custear apenas refeições e/ou alimentação dos empregados, acabaram se tornando uma moeda paralela no mercado, de modo que seus titulares conseguem utilizar-se dos créditos ali depositados para outras finalidades completamente diferentes das quais foi idealizada.

Como dito, a Medida Provisória nº 1.108, publicada em 28/03/2022 alterou a regra do auxílio alimentação/refeição e trouxe alterações também sobre o teletrabalho (que poderemos abordar em outro momento).

As alterações referentes à concessão do auxílio alimentação e/ou refeição ocorreram justamente no intuito de brecar essas descaracterizações de uso, evitar que esses benefícios sejam utilizados como uma forma disfarçada de remuneração e determinar sua utilização, específica e exclusivamente, para a finalidade a qual foi criada. Além disso, ainda estipula a proibição de cobrança de taxas negativas ou descontos na contratação de empresas fornecedoras de auxílio-alimentação.

Dentre as principais mudanças apresentadas pela Medida Provisória temos: multa para quem usar vales para outras finalidades e proibição de descontos na contratação de empresas fornecedoras de vales alimentação e/ou refeição.

Numa breve síntese, vamos abordar cada item destacado acima.

  1. DA MULTA PELA UTILIZAÇÃO DOS VALES PARA OUTRAS FINALIDADES

Retomando a intenção do legislador, a norma de pagamento aos empregados sofreu modificações, exigindo que os valores sejam utilizados para a compra exclusiva de produtos do gênero alimentício.

De acordo com dados do Ministério do Trabalho e Previdência Social, os benefícios de vale alimentação e/ou refeição tem sido utilizado para o pagamento de produtos diversos como eletroeletrônicos, aplicativos de músicas, TV’s a cabo e até academia de ginástica.

No intuito de impedir esse desvirtuamento, tanto as empresas que comercializam e aceitam como pagamento recursos financeiros provenientes desses benefícios quanto as empresas que concedem os benefícios podem ser descredenciadas do PAT e multadas.

O valor da multa varia entre R$ 5.000,00 a R$ 50.000,00. Em caso de dificuldade para a realização de fiscalização e/ou reincidência no ato, os valores podem ser dobrados.

A Medida não apresenta com clareza os critérios de cálculo e parâmetros de gradação da multa, mas estabelece que tais atos serão estabelecidos pelo Ministro de Estado do Trabalho e Previdência.

É importante evidenciar, ainda, que, mesmo que a empresa seja multada, ela ainda pode sofrer aplicação de outras penalidades cabíveis, pelos órgãos competentes.

  1. DOS DESCONTOS NA CONTRATAÇÃO DE EMPRESAS FORNECEDORAS DE AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO/REFEIÇÃO – PROIBIÇÃO EXPRESSA DESSA PRÁTICA.

Ao contratar uma empresa fornecedora de tíquetes alimentação/refeição, as empregadoras contavam com um desconto concedido por essas empresas, que para compensar cobrava taxas elevadas de lanchonetes, restaurantes e supermercados.

Por exemplo, se a empregadora contratasse R$ 30.000,00 em vales para seus funcionários, as empresa fornecedoras de tíquetes cobravam da empresa apenas R$ 27.000,00 e ao transferir as taxas para as empresas que comercializam produtos alimentícios, automaticamente, estariam transferindo esse custo extra ao empregado, o que tem tornado sua alimentação mais cara.

Portanto, de acordo com o Ministério do Trabalho, o maior beneficiário, eram os empregadores e não os trabalhadores, como era o objetivo do programa.

Àquelas empresas que insistirem na prática supracitada, sofrerão todas as sanções e multas expostas alhures, quais sejam: multa entre R$ 5.000,00  a R$ 50.000,00. Em caso de dificuldade para a realização de fiscalização e/ou reincidência no ato, os valores podem ser dobrados e ainda poderão sofrer o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica beneficiária ou do registro das empresas vinculadas aos programas de alimentação do trabalhador cadastradas no Ministério do Trabalho e Previdência, além da perda do incentivo fiscal.

Aquelas empresas que possuem contrato vigente e que já receberam algum tipo de desconto, deságio e/ou outras verbas e benefícios diretos ou indiretos de qualquer natureza não vinculados diretamente à promoção de saúde e segurança alimentar do trabalhador não sofrerão as sanções explícitas na Medida Provisória, até o encerramento do contrato vigente, ou até que tenha decorrido o prazo de 14 meses, contado da data de publicação desta Medida Provisória, o que ocorrer primeiro.

No entanto, a prorrogação do contrato vigente, em termos que estejam em desacordo com a Medida Provisória, ficam vedados.

As Medidas provisórias têm força de lei assim que publicadas, porém, precisam ser aprovadas pelo Congresso Nacional para se tornar leis em definitivo.

As consequências expostas possuem o condão disciplinar para que haja conscientização quanto ao uso adequando dos benefícios, acrescendo maior rigidez ao controle sobre o benefício.

No entanto, a minha maior crítica ao ato normativo refere-se ao fato de haver aparente dificuldade na fiscalização dos atos irregulares, tanto das empresas concessionárias dos tíquetes, quanto das empregadoras. O que não significa dizer que se trata de uma norma ineficaz e requer uma atenção especial das empresas que precisarão monitorar o uso desses recursos, para evitarem de perder os benefícios governamentais pela sua concessão e ainda serem penalizadas com multas e outras penalidades.