Fazendeiros garantem permanência em terra que era ocupada por indígenas

Potrero Guaçu
A ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público Federal visando à extrusão dos não-indígenas da terra.

Wanessa Rodrigues

O juiz federal Roberto Brandão Federman Saldanha, da Subsecção Judiciária de Ponta Porã (MS), não acatou pedido de liminar do Ministério Público Federal (MPF) para que fazendeiros desocupassem a área de Potrero Guaçu, em Paranhos, no Mato Grosso do Sul. A intenção era a de que a terra fosse reocupada pelos índios. Porém, o magistrado entendeu que estavam ausentes os pressupostos constitucionais para a configuração da terra indígena.

A sentença adota o entendimento do pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do caso Raposa Serra do Sol. A advogada que patrocina os interesses dos maiores proprietários de terras inseridas na pretensão demarcatória da FUNAI é a advogada goiana Maria Tereza Caetano Lima Chaves, que também advoga em diversas outras causas da mesma natureza no Estado do Mato Grosso.

A ação civil pública foi proposta pelo Ministério Público Federal visando à extrusão dos não-indígenas (“brancos”) da terra, permitindo que a União, por meio da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), proceda à reocupação para que os indígenas possam dela usufruir. O embasamento foi a tramitação de processo administrativo de demarcação da terra indígena Potrero Guaçu. Sendo que foi elaborado o estudo antropológico pela FUNAI, no qual conclui-se que a terra caracteriza-se como de posse permanente indígena.

Ao analisar o caso, o magistrado salientou que, entre outros fatores, o marco temporal é requisito indispensável à identificação das terras tradicionalmente ocupadas. Sendo que foi pacificado, no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), 5 outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como referencial insubstituível do marco temporal para verificação da existência da comunidade indígena, bem como da efetiva e formal ocupação fundiária pelos índios.

Conforme explica, admite-se apenas a ressalva do renitente esbulho, situação de efetivo conflito possessório que, mesmo iniciado no passado, ainda persista até o marco demarcatório temporal atual.

Assim, o magistrado o magistrado explica, para fazer jus à demarcação da terra, a comunidade indígena tem que demonstrar, entre outros aspectos, que, em 5 de outubro de 1988, ocupava o determinado espaço geográfico. Ou estava em renitente esbulho – ou seja, situação de efetivo conflito possessório que, mesmo iniciado no passado, ainda persistia até o marco demarcatório temporal, que não se confunde com ocupação passada ou com desocupação forçada ocorrida no passado.

No caso em questão, o juiz federal lembra que, já no final da década de 1960, os índios habitavam a região. Porém, a FUNAI, em auxílio direto à Missão Religiosa Alemã, transferiu os índios para a área de Pirajuy, a cerca de 20 quilômetros de distância de Potrero Guasu. Em1973, ocorreu a mudança da última família indígena do local.
Assim, o magistrado salienta que os indígenas não ocupavam a região no marco temporal (05/10/1988), já que foram removidos em 1973, com a saída da última família. Além disso, não houve renitente esbulho, vez que não há relatos de violência ou resistência, e o empenho de recuperação das áreas pelos indígenas apenas se iniciou em 1990, após o marco temporal.

O magistrado ressalta que, respeitadas as conceituações de outras áreas da ciência (antropologia, sociologia, etc.), conforme apurado nos autos, a área objeto da presente ação não é, aos olhos do ordenamento jurídico e de sua interpretação conforme o STF, terra indígena para fins de proteção constitucional. “Falta-lhe, ao menos um dos requisitos (temporal), para a subsunção do fato à norma pretendida”, diz o juiz federal.