Amanhã será julgada a ADI das visitas íntimas: o que esperar?

A confirmação do voto apresentado pelo desembargador Paganucci Jr. para conceder medida cautelar e determinar a suspensão da lei estadual que proibia as visitas íntimas no sistema penitenciário de Goiás [1] poderá legar ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) a autoria de uma das mais importantes passagens da história da justiça goiana.

Na ocasião, ao deferir a medida cautelar na ADI proposta pela valorosa Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO), o desembargador Paganucci Jr. indicou que a apontada Lei Estadual “revela-se desproporcional, desarrazoada e fere, principalmente, o princípio da dignidade da pessoa humana”, conclusão que alerta para a necessidade de superação do sentido de dignidade que vigia muito antes da Declaração de 1948 [3], caracterizado pela atribuição de marcadores de distinção ou de notabilidade a indivíduos ou grupos a partir de predicados de riqueza, poder ou colocação social.

De maneira simples e pedagógica, o voto lançou luz sobre a tentativa de desumanização da pessoa privada de liberdade e de todas aquelas que estruturam imprescindível tecitura familiar, como cônjuges, companheiras e namorados. Para tanto, o desembargador Paganucci Jr. reafirmou que “às pessoas privadas de liberdade são assegurados todos os outros direitos não alcançados pela sentença”, como o de receber “a visita do cônjuge, companheira, parente e amigos em dias determinados”.

Em suma, o Órgão Especial do TJGO, ao acolher as reflexões iniciais propostas pelo desembargador Paganucci Jr., registrando que a visita íntima “garante direitos da personalidade, dignidade, intimidade, privacidade, possuindo caráter ressocializador, em consonância com as normas constitucionais, não podendo sofrer vedação de caráter geral”, consignou que a visita íntima é elemento constitutivo da humanidade das pessoas privadas de liberdade e de seus familiares, e que a proibição indiscriminada equivaleria à imposição de tratamento desumano a essa parcela da população, situação expressamente vedada pelo art. 5º, inciso III da CF/88 e pelo art. 126, I da CE/88 [4] [5].

O mérito da ação direta de inconstitucionalidade será julgado pelo Órgão Especial do TJGO no dia 28/06, amanhã, quarta-feira. Será o momento de o Tribunal confirmar as lúcidas e elogiosas reflexões já propostas pelo desembargador Paganucci Jr., declarando a inconstitucionalidade da Lei n. 21.784/23 e afirmando que no estado democrático de direito a punição e a garantia de direitos devem andar juntas, legitimando-se uma a outra, em relação de estreita simbiose e sob o auspício e inafastável reverência à Constituição.

[1] Lei n. 21.784/23, que dispunha: “Art. 1° É vedada a visita íntima nos estabelecimentos penitenciários administrados pelo Estado de Goiás. §1º Visita íntima é aquela realizada fora do alcance de monitoramento e vigilância dos servidores da unidade prisional.”

[2] ADI n. 5087913-06.

[3] Declaração dos Direitos Humanos.

[4] Que estabelece que a “Política Penitenciária no Estado de Goiás tem como objetivo a humanização do sentenciado, fundada no trabalho manual, técnico, científico, cultural e artístico, subordinando-se à dignidade e à integridade física e moral dos presos, assegurando-lhes o pleno exercício dos direitos não atingidos pela condenação”.

[5] O respeito à dignidade das pessoas privadas de liberdade no Estado de Goiás também constou no art. 1º, inciso V da Lei n. 19.962/18, que reorganizou a política penitenciária no Estado de Goiás, ao alçar como um de seus princípios fundantes “a garantia e respeito à dignidade da vida das pessoas em privação de liberdade”.