A Defensoria Pública da União (DPU) solicitou esclarecimentos ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) e ao secretário de Gestão de Pessoas, José Celso Cardoso, sobre possíveis irregularidades na etapa de heteroidentificação do Concurso Nacional Unificado (CNU). O pedido foi formalizado por meio de um ofício enviado na última quinta-feira (30), com prazo de resposta de até dois dias úteis.
A solicitação decorre de denúncias feitas por candidatos que se consideram prejudicados pelo procedimento conduzido pela Fundação Cesgranrio, banca organizadora do concurso. Na manhã do mesmo dia, a DPU reuniu-se com alguns desses candidatos para discutir as queixas.
Relatos dos candidatos
Um dos relatos mais recorrentes dos candidatos diz respeito à negativa de acesso aos pareceres e à ausência de uma fundamentação clara nas decisões da banca de heteroidentificação. De acordo com os depoimentos, alguns candidatos reprovados receberam pareceres que se restringiam à expressão “não enquadrado”, sem explicações detalhadas. A DPU destaca que a lei 9.784/1999 exige que os atos administrativos sejam devidamente motivados.
Outro ponto de preocupação é a dependência exclusiva de gravações para a avaliação de recursos. Nota técnica do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais da DPU publicada em setembro de 2024, alerta que, embora o vídeo não deva ser a única fonte de informação da comissão recursal, as limitações técnicas das gravações podem comprometer a percepção fenotípica dos candidatos, afetando a precisão das decisões.
Além disso, a DPU entende que a antecipação da divulgação do resultado final do concurso para 4 de fevereiro de 2025 gerou preocupações. A data coincide com a publicação dos resultados dos recursos contra a etapa de heteroidentificação, o que pode comprometer a análise criteriosa das contestações.
Outro aspecto questionado pela Defensoria é a falta de transparência sobre a composição das bancas avaliadoras. O edital previa a divulgação dos currículos dos avaliadores. No entanto, segundo relatos dos candidatos, não houve divulgação efetiva das qualificações, formação acadêmica e experiência profissional dos membros da comissão de heteroidentificação. Tampouco foram apresentados registros públicos que garantam a diversidade na composição da banca.
Pedidos da DPU
Diante das denúncias, a DPU solicita ao MGI medidas para garantir maior transparência e isonomia no processo. Entre os principais pedidos, estão:
- informações detalhadas sobre os critérios objetivos adotados para a avaliação fenotípica dos candidatos;
- explicação sobre a ausência de justificativas individualizadas nos pareceres emitidos;
- divulgação da relação nominal dos membros da banca, incluindo qualificações e experiência na área de igualdade racial;
- descrição detalhada da metodologia adotada na heteroidentificação;
- justificativa oficial para as mudanças no calendário do concurso que impactaram o prazo de interposição de recursos;
- explicação sobre o uso exclusivo de filmagens e fotografias para análise recursal, além de medidas para minimizar impactos de fatores externos, como iluminação e qualidade da gravação.
A DPU reforça que a supervisão do certame é responsabilidade do MGI, independentemente de a execução do concurso ter sido delegada à Fundação Cesgranrio. O órgão solicita providências para assegurar que os direitos dos candidatos sejam respeitados e que o processo ocorra com transparência e conformidade com a legislação vigente.
“É imprescindível que o Ministério regulamente prazos mínimos adequados para a interposição de recursos, evitando alterações abruptas no cronograma que possam comprometer a defesa dos candidatos. A previsibilidade e a transparência são requisitos fundamentais para a efetividade da política pública de cotas, e o MGI deve adotar todas as providências necessárias para evitar que falhas procedimentais resultem na exclusão indevida de candidatos negros do serviço público”, afirma o ofício.
O documento foi assinado pela defensora nacional de direitos humanos, Carolina Castelliano; pelo coordenador do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais da DPU, defensor público federal Yuri Costa; pela coordenadora da Câmara de Coordenação e Revisão Cível da DPU, defensora pública federal Maíra Mesquita; e pelos defensores regionais de direitos humanos no Distrito Federal e no Rio de Janeiro, Eduardo Nunes Queiroz e Thales Arcoverde Treiger, respectivamente. (Assessoria de Comunicação Social da DPU)