“Substituição” ou “afastamento” na recuperação judicial?

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    O devedor empresário individual, pessoa física, e o devedor sociedade empresária, pessoa jurídica, esta por seus administradores, durante o procedimento de recuperação judicial, diz a LFRE de número 11.101/05  (artigos 55/69), serão mantidos na condução da respectiva atividade empresarial, sob a fiscalização do Comitê de credores, se existir, e do administrador judicial, conforme dispõe o art. 64, caput. Somente ocorrendo a infringência de uma ou mais das hipóteses previstas nos 6 (seis) incisos do artigo 64, se pela sociedade empresária o juiz destituirá o administrador societário que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos ou do plano de recuperação judicial (parágrafo único o art. 64); se pelo devedor empresário individual, pessoa natural, ele será afastado e o juiz convocará assembleia geral de credores para a escolha do gestor judicial que assumirá as suas atividades econômicas, conforme as disposições do art. 65.

    Consequentemente, a letra “c”, do inciso II do art. 27 da Lei 11.101/05, tem como único destinatário o devedor empresário individual (pessoa física), pois atribui ao Comitê de Credores, dentre outras atribuições, a de “quando ocorrer o afastamento do devedor nas hipóteses previstas nesta Lei” (art. 65), submeter à autorização do juiz, se necessário for para a continuidade da atividade empresarial e somente durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial, a alienação de bens do ativo permanente, a constituição de ônus reais e outras garantias, bem como atos de endividamento. Insistimos em ser repetitivos, uma vez que, enquanto a devedora Sociedade Empresária tem seu administrador destituído e substituído conforme previsto nos atos constitutivos ou no plano de recuperação judicial – parágrafo único do art. 64 –, o devedor Empresário Individual, pessoa física, é afastado das mesmas atividades empresariais, o que significa temporariedade, pois é individual, único proprietário da sua atividade, não tem substituto e não pode ser destituído, e conforme as previsões do caput do art. 65, o gestor judicial escolhido pela assembleia-geral de credores assumirá (não o substituirá) as suas atividades.

    Assim, o devedor empresário individual, pessoa natural, é “afastado” (art. 65) e o  devedor administrador de sociedade empresária é “destituído” e substituído (parágrafo único do art. 64). O art. 65 não tem a mínima aplicabilidade sobre a Sociedade Empresária, por seu administrador, porque este não é afastado. Ele é destituído/demitido e substituído conforme a previsão dos atos constitutivos (contrato social ou estatuto) ou conforme previsto no plano de recuperação judicial. Daí, sequer ter o legislador previsto para o Comitê de Credores qualquer atribuição quando da destituição do devedor Sociedade Empresária, pessoa jurídica, por seu administrador, porque o seu substituto é investido nos poderes da administração, nas funções do administrador conforme manda a lei, fazendo com que a mesma não sofra solução de continuidade. Ora, se a sociedade empresária tem substituídos os seus destituídos, àqueles são a quem caberão de pronto a administração e todos os atos respectivos, até mesmo o de submeter ao juiz do feito a necessidade, se for o caso, “não só durante o período que antecede a aprovação do plano de recuperação judicial”, mas também no curso desta, de vender bens do ativo permanente, constituição de dívidas, ônus, etc. Fica por demais claro que a Sociedade Empresária, em qualquer das hipóteses de destituição com a consequente substituição (as hipóteses previstas na Lei – todos os seis inciso do art. 64), jamais ficará acéfala, daí não necessitando de qualquer ato atribuído ao Comitê de Credores, especialmente os previstos na letra “c” do inciso II do art. 27,  conforme entendimento de alguns doutrinadores, já que ela terá na pessoa do respectivo administrador o órgão competente para gerir seus negócios (a ingerência do Comitê de Credores seria invasão de competência/atribuições às funções dos diretores societários, com o que não compactuou o legislador). Obviamente, com as limitações que a Lei impõe, e, quando for a hipótese legal, como no art. 66, com a oitiva do Comitê de Credores, apenas. Mas os seus administradores continuam no comando das atividades, mesmo os substitutos com os mesmos poderes dos destituídos/demitidos. Ao contrário, “quando do afastamento do devedor” (art. 65, empresário individual, pessoa física), que não é destituído e nem substituído, a administração da sua atividade empresarial será assumida pelo gestor judicial, que passará por um longo processo desde a convocação pelo juiz para a deliberação de seu nome na assembleia-geral de credores, cujas atribuições, dentre outras, na recuperação judicial, é deliberar sobre o nome do gestor judicial quando do afastamento do devedor, conforme dispõe o art 35, inciso I, “e”. Aqui, sim, há a necessidade imediata da escolha do gestor judicial para que a atividade do empresário individual não fique acéfala, pois ele é só, não tem quem o substitua. Tem apenas o Registro de Empresário Individual junto ao Registro do Comércio. Nesse documento, a exigência prevista no Art. 968 do Código Civil é que deve conter: I – o seu nome, nacionalidade, domicílio, estado civil e, se casado, o regime de bens; II – a firma, com a respectiva assinatura autógrafa; III – o capital; e IV – o objeto e a sede da empresa.

    Nos parece, assim, que tantas dúvidas existentes na doutrina brasileira sobre o afastamento  e a destituição do empresário individual e dos administradores societários, respectivamente, não se justificam à luz de um estudo mais aprofundado sobre a legislação de regência.