A Lei de Recuperação Judicial e as reformas (Parte IV)

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    Dado a conhecer, finalmente, o texto do projeto de lei de reforma da Lei 11.101/05 – LFRE -, que encontrava-se na Casa Civil da Presidência da República para ajustes técnicos, mostra-nos que as reformas não serão poucas, mas serão de profunda intensidade. Ao contrário do que se tinha publicado pelo grupo de juristas constituídos pelo Ministério da Fazenda do Governo Temer, os genéricos termos “agentes econômicos” não farão parte das reformas, e prevalecem somente como legitimados o empresário individual e a sociedade empresária, obviamente com o respectivo registro nas Juntas Comerciais dos respectivos Estados. Porém, no artigo 1º do mencionado projeto de lei, diz que a ementa da Lei 11.101/05 passa a vigorar com a seguinte redação: “regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, e adota o regime de cooperação internacional e insolvência transnacional de que trata a Lei modelo da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional” (grifamos), sendo esta uma das grandes novidades.

    Como sempre vimos ressaltando sobre as grandes reformas, a que merece os nosso comentários seguintes em nada, mas absolutamente nada, traz qualquer benefício para os impetrantes da recuperação judicial; e, ao contrário, os prejudica em benefício dos créditos das Fazendas Públicas. Pior, vai de encontro à jurisprudência construída ao longo destes mais de 12 (doze) anos de vigência sobre a Lei nº 11.101/05 pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Este, em diversos julgados, firmou o seguinte entendimento sobre os executivos fiscais, os quais se sabe, não são suspensos em decorrência do atual deferimento do processamento da recuperação judicial. Todavia, quanto aos atos de expropriação sobre os bens do recuperando, firmou o STJ que a competência é do juízo da recuperação judicial, cabendo a este a direção sobre todos os bens do impetrante.

    Desde a Jurisprudênica em Teses – Edição nº 35, Recuperação Judicial I, em seu enunciado de nº 11, é firme a posição do STJ, pois,: “11) A competência para promover os atos de execução do patrimônio da empresa recuperanda é do juízo em que se processa a recuperação judicial, evitando-se, assim, que medidas expropriatórias prejudiquem o cumprimento do plano de soerguimento”. Este entendimento, segundo publicação do próprio STJ, foi extraído dos seguintes julgados do próprio Tribunal da Cidadania: AgRg no CC 129079/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 11/03/2015, DJE 19/03/2015 AgRg no CC 133509/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 25/03/2015,DJE 06/04/2015; AgRg no CC 125205/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 25/02/2015,DJE 03/03/2015; AgRg no CC 136978/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 10/12/2014, DJE 17/12/2014;  AgRg no CC 124052/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 22/10/2014,DJE 18/11/2014;  EDcl no AgRg no AgRg no CC 118424/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 10/04/2013,DJE 14/03/2014; AgRg no CC 130433/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 26/02/2014, DJE 14/03/2014; CC 118819/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 26/09/2012,DJE 28/09/2012; CC 116696/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 24/08/2011, DJE 31/08/2011;  AgRg no CC 105215/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, Julgado em 28/04/2010,DJE 24/06/2010.

    Como no presente momento, o STJ, a cada dia mais, vem consolidando o seu pensamento. No AgInt no CC 150.650/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado agora em 22/11/2017, DJe 24/11/2017, citamos e transcrevemos parte deste julgado, comprovando as nossas assertivas:  “…2. Compete à SEGUNDA SEÇÃO processar e julgar conflito de competência entre o juízo da recuperação e o da execução fiscal, seja pelo critério da especialidade, seja pela necessidade de evitar julgamentos díspares e a consequente insegurança jurídica (AgRg no CC 120.432/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Segunda Seção, j. 14/12/2016, DJe 19/12/2016). 3. A Segunda Seção desta Corte pacificou o entendimento de que apesar da execução fiscal não se suspender em face do deferimento do pedido de recuperação judicial (art. 6º, § 7º, da Lei nº 11.105/2005, art. 187 do CTN e art. 29 da Lei n. 6.830/1980), submetem-se ao crivo do juízo universal os atos de alienação voltados contra o patrimônio social das sociedades empresárias em recuperação, em homenagem ao princípio da preservação da empresa”.

    De outro lado, vem agora o malsinado projeto de Lei, que, literalmente diz em seu parágrafo 7º do artigo 6º, que, “O ajuizamento da recuperação judicial, ressalvada a suspensão da exigibilidade nos termos da legislação de regência, não suspende o curso das execuções fiscais, inclusive do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS -, as quais prosseguirão normalmente, permitida a constrição e a alienação de bens e direitos no juízo que as processa, hipótese em que não competirá ao juízo da recuperação judicial avaliá-las (grifamos).

    Seria, propositadamente, uma desconstrução do pensamento unânime do STJ que, a nosso ver, se mantém em obediênca ao maior princípio da recuperação judicial – a manutenção da empresa ou a continuidade da atividade -, que o legislador estaria cometendo, numa verdadeira inversão de todos os fatores? E, teria ele – o legislador -, esse poder? Esta e muitas outras veem por aí.

    Renaldo Limiro é advogado especialista em recuperação judicial no escritório Limiro Advogados Associados S/S. Autor das obras A Recuperação Judicial Comentada Artigo por Artigo, Ed. Delrey; Recuperação Judicial, a Nova Lei…, AB Editora; e, Manual do Supersimples, com Alexandre Limiro, Editora Juruá. É membro da ACAD – Academia Goiana de Direito e atual vice-presidente da Acieg. Mantém o site www.recuperacaojudiciallimiro.com.br