Lei das S/A: projeto de lei pode ampliar mecanismos de defesa a acionistas minoritários

Gustavo Michel Arbach*

Investir em empresas como acionista minoritário sempre foi considerado uma opção estratégica para obter certo lucro sem se envolver na administração direta de uma companhia. Mas, em casos de dano causado por administradores ou controladores de companhias investidas, os possíveis prejuízos sentidos também geravam forte receio nestes investidores, carentes de instrumentos jurídicos adequados no mercado para reaver eventuais prejuízos. Contudo, em uma nova proposta de lei enviada à Câmara, este cenário pode finalmente mudar a favor destes grupos.

De autoria do Poder Executivo, o Projeto de Lei 2925/23 traz um conjunto de alterações na Lei das S/A e, também, na Lei 6.385/76, que criou a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em prol de aperfeiçoar os mecanismos de direito dos acionistas minoritários nos casos mencionados, aumentando sua possibilidade de ressarcimento e, assim, alinhando essa decisão às boas práticas internacionais prezadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Coincidentemente ou não, a proposta foi enviada poucos meses depois do caso das Americanas – onde muitos acionistas minoritários foram extremamente prejudicados devido ao rombo financeiro de mais de R$ 40 bilhões, de acordo com dados da própria empresa. Apesar de ser apenas um de tantos exemplos, infelizmente, usuais no mercado, os pontos mencionados no projeto apresentam grandes chances de trazerem essa maior segurança e poderes aos acionistas minoritários. Claro, desde que seja muito bem pensada.

Dentre as mudanças propostas, um dos mais interessantes diz respeito à ampliação dos poderes da CVM – permitindo, como exemplo, que realize inspeções físicas nas companhias investigadas, e que possa requerer ao Poder Judiciário mandado de busca e apreensão no interesse de inquérito ou processo administrativo. Essa maior autonomia, assim como já ocorre em outros países como nos Estados Unidos, pode ser significativamente vantajosa, apesar de ainda existir um desafio inegável em como se dará esta fiscalização na prática, haja vista que a CVM, hoje em dia, tem uma carência enorme de recursos e pessoas.

Há a proposta, ainda, da criação de maiores poderes aos próprios acionistas minoritários, em ingressarem com ações em nome da companhia nos casos de responsabilização – uma vez que há falha no mecanismo atual – ampliando o rol de matérias passíveis de ressarcimento e da legitimidade em propor ação coletiva de responsabilidade em nome de diversos acionistas minoritários pelos danos sofridos em decorrência de algum ato da administração.

Algo que, na prática, pode representar um maior risco de criar um ambiente litigioso enorme no país, considerando que um acionista inconformado, que seja titular de 5% das ações, em companhias fechadas, ou 2,5% ou R$50 milhões em companhias abertas, poderá ingressar com ação em prol de seus direitos.

O projeto de lei também sugere que, caso tais ações de responsabilização tramitem por arbitragem, tal procedimento deverá ser público, afastando a famígera confidencialidade em procedimentos arbitrais. Por um lado, levar esse conhecimento ao público pode gerar uma maior clareza sobre os temas e, ainda, viabilizar que seja criada um acervo importante de precedentes em matérias empresariais. Mas, ao mesmo tempo, pode evidenciar dados que, idealmente, não deveriam ser de conhecimento geral, quebrando seu sigilo e aumentando a probabilidade de conflitos.

Todos os pontos trazidos pelo projeto de lei poderão gerar alterações positivas e negativas para o mercado – porém, não será uma pauta a ser votada com urgência. Ainda veremos muitas tramitações sobre o tema e, a fim de gerar a melhor proposta possível, é essencial considerar estes desdobramentos para evitar uma insegurança jurídica que traga mais prejuízos do que conquistas para os acionistas e as empresas.

*Gustavo Michel Arbach é sócio fundador do Arbach&Farhat Advogados e líder das áreas societária e M&A.