Não é de hoje que se discute o termo corrupção dentro do que chamamos de criminalidade endêmica, buscando alternativas para coibir o seu crescimento e, de uma forma mais utópica, aniquilar qualquer forma de sua existência.
Na verdade, a corrupção está no agir, no fator “levar vantagem em tudo”, na perspectiva de poder e domínio, mas nós, cidadãos, podemos e temos o dever de fazer a nossa parte para que possamos ter um lugar melhor, uma distribuição melhor da renda e, porque não dizer, um país que tenha por foco a dignidade da pessoa humana.
É exatamente essa a discussão que propomos em nosso artigo de hoje, ou seja: Existe ética na criminalidade?
Assim, comecemos com os esclarecimentos de costume.
Corrupção, de acordo com o site Mundo Educação, “vem do latim corruptus, que significa quebrado em pedaços. O verbo corromper significa ‘tornar pútrido’. A corrupção pode ser definida como utilização do poder ou autoridade para conseguir obter vantagens e fazer uso do dinheiro público para o seu próprio interesse, de um integrante da família ou amigo”.
Não menos importante, chamamos criminalidade, de acordo com o site jus.com.br, “a ocorrência de condutas contrárias aos preceitos legais inibidores da violência, sendo a desobediência direta ou indireta aos ditames legislativos materializados nas leis penais”.
Por sua vez, criminalidade endêmica, de acordo com o site Tribuna UOL: “endemia é uma doença habitual que atinge grande parcela de uma população. Epidemia é uma doença passageira e transitória. A violência que caracteriza a sociedade brasileira, desde o seu nascimento (há 500 anos, portanto), não é passageira, ao contrário, é permanente, duradoura, diária. Em outras palavras, é endêmica. Faz parte do Estado, da sociedade dominante, assim como da própria população segregada e isolada”.
Nesse diapasão, entender que a corrupção equivale a tomar pútrido, que criminalidade é agir contrário a lei e que endêmico corresponde a tudo aquilo que não é passageiro, mas que está arraigado em nosso contexto social, faz toda a diferença.
Se aliarmos a tudo isso o conceito de ética, obtido junto ao site Significados, veremos que “se trata da área da filosofia dedicada às ações e ao comportamento humano, filosofia moral. O objeto de estudo da ética são os princípios que orientam as ações humanas e a capacidade de avaliar essas ações”.
É através desse conjunto de conhecimentos que podemos entender notícias como aquela oriunda do site Direito News, de 27 de novembro de 2021, dando conta de que “Segunda Turma do STF manda desbloquear bens de Lula retidos pela Lava Jato”. E faz muito sentido, na medida em que todo o processo foi comprometido, vez que não obedeceu aos preceitos legais e houve manipulação dos então, juiz Sergio Moro e procurador Dallagnol, dentre os demais integrantes, aos quais entendemos ser desnecessária a menção.
O problema maior está em fazer com que o cidadão entenda que um erro não justifica a manutenção de outro ou outros, que aquele que errou tem por obrigação responder pelo erro e também pela indenização (se houver) e mais, que somente agindo dessa maneira, estaremos tratando o direito e nossa segurança jurídica com a seriedade que merecem.
O contrário, como muitos fizeram questão de expor em manifestações país a fora, equivale a eleger crimes com ou sem ética, criando exculpantes inexistentes na legislação e abrindo portas para jurisprudências cada vez mais abusivas e destruidoras do direito posto (diga-se, aquele que está previsto nas leis vigentes), como por exemplo aquela decisão proferida pelo Ministro Fux e trazida também pelo site Direito News, na data de 30 de novembro de 2021: “Em resposta a Gilmar, Fux diz que empate não beneficia réu em ação penal”. Ou seja, um civilista, por mero capricho e vaidade, com clara animosidade com outro integrante do STF, Ministro Gilmar Mendes, tripudia sobre o Processo e Direito Penal, transformando princípios básicos, como é caso do in dubio pro reo, em jurisprudência sem fundamento, obrigando, de per si, a longas batalhas jurídicas junto ao mesmo Tribunal (quando os recursos das diversas matérias e no mesmo sentido lá chegarem) até que consigamos restabelecer a ordem e o devido processo legal.
Para o cidadão comum, desacostumado aos trâmites legais, isso talvez não signifique tanto, mas para os operadores do direito, equivale a dizer, no mínimo 5 anos da mais completa desestabilidade nos julgamentos desde a esfera de conhecimento (1.ª instância), até as esferas recursais.
Então, se dissermos que Deltan Dallagnol e Sérgio Moro estavam certos em não respeitar o devido processo penal e “pegar” Lula a qualquer custo, estamos dizendo, basicamente, que o crime ou crimes por eles cometidos, comparados com os que Luiz Inácio praticou, justificam os meios e, via de consequência, declarando que o crime praticado pelo então juiz e então procurador, são éticos; ao passo que os que foram praticados pelo ex-presidente não o são.
Na verdade, crime é crime, precisa de punição nas mesmas proporções em que as consequências devem ser aquelas previstas na legislação para que tenhamos a possibilidade de aplicar a todos e a qualquer um, a mesma lei e solução, respeitadas as peculiaridades de cada caso.
Isso já havia acontecido, como chamamos a atenção do nosso Leitor, no artigo anterior, ao falarmos sobre o CASO DREHER (o jurista Eduard Dreher), o qual relata juízes e promotores alemães, que participaram do holocausto, criando leis que os beneficiavam após o pós guerra e alçando cargos nos tribunais superiores para que não fossem punidos, leis que foram de 1946 até meados de 1995 e que tiveram repercussão por todos os países por onde os nazistas estabeleceram suas residências mundo a fora.
Em Goiás, recentemente fomos forçados a conviver com o CASO LÁZARO, um caso que mobilizou 4 helicópteros, 400 homens das mais diversas forças policiais e um gasto aproximado de 38 milhões de reais, situação oriunda da má atuação do judiciário candango, do local indicado para execução da pena e que dividiu a opinião pública sobre a execução do então “delinquente”. De um lado era possível identificar os que aplaudiram quando Lázaro foi “executado”, de outro os que exigiam a responsabilização do Estado por proporcionar uma cena de tamanha incompetência e desapego com o erário público, além do desrespeito ao que costumamos chamar “direitos humanos”. Aqui, novamente poderíamos deixar a pergunta: o Estado praticando crimes tem mais ética que os crimes praticados por Lázaro e não levados a efeito como manda a lei por parte do judiciário e da segurança pública?
Certamente a resposta tem, obrigatoriamente, que ser NÃO! Não há moral ou respeito ao cidadão quando estabelecemos uma ÉTICA PARA O CRIME, da mesma forma que não há segurança jurídica em determinar que “os fins justificam os meios”. O preço a ser pago com tamanha desídia por parte daqueles que são os destinatários do direito posto, bem como por todos aqueles que deveriam zelar pela dignidade da pessoa humana é, sem dúvida, muito alto e atinge, principalmente, a classe menos privilegiada.
Destarte, meu CARO LEITOR, não é crível que, na atual conjuntura, ainda tenhamos raízes com a CORRUPÇÃO e a CRIMINALIDADE, sejam elas em que escala forem. É mais do que urgente a necessidade de aceitarmos que somos o elo mais importante dessa sociedade e temos que assumir nossa responsabilidade enquanto cidadãos, cobrando a aplicação das leis e do devido processo legal a quem quer que seja, se queremos deixar aos nossos descendentes um lugar melhor do que encontramos.
*Marcelo Bareato é doutorando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá/RJ, ocupa a cadeira de n.º 21 na Academia Goiana de Direito, professor de Direito Penal, Processo Penal, Legislação Penal Especial e Execução Penal na PUC/GO, Advogado Criminalista, membro da Comissão Especial de Segurança Pública da OAB Nacional, Conselheiro Nacional da ABRACRIM, Presidente do Conselho de Comunidade na Execução Penal de Goiânia/GO, Presidente da Comissão Especial de Direito Penitenciário e Sistema Prisional da OAB/GO, entre outros (ver currículo lattes http://lattes.cnpq.br/1341521228954735).